Este texto integra uma ampla matéria jornalística sobre a história da praia e bairro da Redinha Velha, que será dividida em 10 partes. A reportagem foi premiada no edital Auxílio à Publicação de Livros, Revistas e Reportagens Culturais, na categoria Reportagens Culturais. Tem recursos da Lei Aldir Blanc, e patrocínio do Governo do Estado do Rio Grande do Norte através da Fundação José Augusto, e Governo Federal através da Secretaria Especial da Cultura e do Ministério do Turismo.
“A verdade fica mais verdadeira quando exposta com uma razoável dose de fantasia”. A frase foi usada pelo diretor de redação da extinta revista O Cruzeiro, Accioly Neto, para resumir a preocupação com a veracidade do que era retratado em suas matérias. E serve também ao enfoque dado a esta reportagem. Não para desmerecer a veracidade da pesquisa, mas de dar ao texto um floreio poético. É que a Redinha é mistura de uma dura realidade com a poesia de sua gente e de suas paisagens.
Os segredos que revestem os chãos seculares da Redinha e pintam de um azul cinzento seu mar – palco de memoráveis embates navais no Brasil Colônia – parecem se resumir no cotidiano de seus pescadores artesãos ou na áurea pacata da praia, como se uma população ribeirinha fosse. Os olhares cansados de seus nativos denunciam o provincianismo característico da praia. Os veranistas, embora sazonais, fazem parte de uma tradição quase secular, quando nos idos de 1920 algumas famílias aportaram na praia e iniciaram novo ciclo na história do lugar.
Os documentos oficiais e não-oficiais procuram explicar, à luz da história, os fatos que aconteceram naquela praia: registros em jornais antigos, crônicas, documentos traslados, fotografias, livros… Mas, salvo os olhares poéticos do jornalista e cronista Vicente Serejo e do escritor e artista plástico Newton Navarro em suas crônicas sobre a Redinha, e de documentos coletados por João Alfredo, pouco se encontra, em insistente trabalho de pesquisa, que retratasse as belezas da Redinha lírica de outrora.
Muito dessa história foi baseada na sabedoria e conhecimento do historiador Luís da Câmara Cascudo. Porém, uma das características do bairro da velha Redinha, assim como nos sertões de Cascudo, são as histórias de seus moradores. Lá, a oficialidade dos registros documentais cede espaço à existência de outras vozes e lados. O não-documentado, o contido no contado, o encontro entre o cotidiano e a história não permite que os caminhos do passado sejam talhados pelo que os documentos oficiais registram. A memória coletiva dos nativos da Redinha é demasiado rica. E, mesmo que seus relatos distribuam ao universo histórias desencontradas, prejudicadas pelo tempo manso daquelas vielas ou pela memória defasada pelos anos, elas possuem muito do folclore do lugar.
A maioria dos registros escritos encontrados sobre a Redinha antiga são parágrafos curtos, espremidos dentro de uma contextualização outra, mais abrangente, como a história de Natal. Para montar o quebra-cabeça dos acontecimentos que fizeram da Redinha o que ela se mostra hoje, foi preciso um mergulho na história dos primeiros capitães-mores da Capitania do nosso Rio Grande.
À dificuldade de coleta de registros completos sobre a praia se somou outro obstáculo: os primeiros veranistas aportam na Redinha no início da década de 1920. As fontes testemunhais estavam, portanto, descartadas, uma vez que seriam pelo menos centenários e, se vivos, provavelmente estariam com memória ou condições de saúde precárias para desenterrar detalhes sobre aquele início de progresso no então porto de pescaria.
Dos registros de Cascudo e das pesquisas em jornais emergiu o relato do procurador carioca radicado em Natal, Gil Soares, sobre os primeiros veranistas que atravessaram o Rio Doce e chegaram, sob a luz de candeeiros, na Redinha. O desenrolar dessa história foram os descendentes dos primeiros veranistas quem contaram. Causos, personagens folclóricos, manias e tradições apareceram de súbito na história da praia. Tudo guardado na memória coletiva dos moradores e veranistas, sem que nada fosse registrado em papel e caneta. Acontecências que retratam muito da magia do lugar; costumes simples, mas não simplórios; valores perpetrados entre décadas, valiosos sob qualquer égide moral ou jurídica; “manias” do povo da Redinha.
Dos pescadores da Redinha – personagens principais e tão anônimos – emanou a aura do lugar. Os depoimentos relatados foram espontâneos, ditos em meio ao trabalho, com certa pressa. Pela quantidade das reclamações e desesperanças contadas, pôde-se estabelecer um perfil da atividade pesqueira e de seu artesão. E não foi baseado apenas no contado por estes conquistadores de peixe o retrato dos pescadores da Redinha. Suas esposas, filhos, veranistas, comerciantes e pescadores aposentados ou em fins de atividade, como Santino e Chiquinho, ajudaram a emoldurar a principal atividade da praia e a retratar a própria Redinha.
Descobrir o enigma da praia da Redinha é voltar no tempo e viver o presente; é renegar o futuro. É ser um pouco antropólogo e perceber o significado do tempo e do homem. Para entender a Redinha, é preciso ter algum tino de pescador; entender a relação homem e peixe; é gostar de mar e detestar modismos, mesmo sendo chamado de careta. Para ser um “redinheiro” precisa ser “boa praça” e ter respeito para com os mais simples. É gostar de futebol e, de preferência, de uma cerveja com paçoca ou ginga-com-tapioca. Para quem já conhece a Redinha, em seus mistérios de funduras abissais, sabe reconhecer o limite tênue que existe entre o mar e a poesia.
Sou natalense do Tirol, nascido em 1953.
Olhos para o mundo e para o centro de Natal, tenho-os em memória já a partir de 1957/58 e lembro passagens da tenra infância nem sempre nítidas nem sempre completas do lugar.
Apesar de ser o centro nervoso e comercial de Natal, cresci tendo o Grande Ponto como o lugar mais citado em notícias de jornais, rádios, depois TVs, conversas, e; nunca soube de fato o porquê daquele topônimo.
Para mim, Grande Ponto era porque se tratava do lugar mais importante da cidade e pronto. Jamais me passou pela cabeça saber a razão real da denominação do lugar.
Só pelos anos 2000, vim a saber desse porquê.
Era por conta do nome do estabelecimento comercial da esquina da Avenida Visconde do Rio Branco com a Rua João Pessoa: Café Grande Ponto.
E só Cascudo para me fazer saber disso. Afinal, cresci ouvindo a máxima de que se alguém queria saber sobre algo, bastava perguntar ao mestre da Junqueira Ayres.
Não deu outra: instigado a escrever sobre este cantão, lá estava Cascudo a nos dizer sobre a razão de ser do topônimo. E com qual elegância de estilo, com qual riqueza de informações e prazer na leitura ele nos ensinava sobre o lugar!
O Grande Ponto tem uma história bem diversa da que suponhamos existir. É, incontestavelmente, a situação geográfica mais popular da cidade. Localiza, fixa, delimita.
Todo natalense conhece o Grande Ponto. Nada recorda o nome. Entretanto, é inegável para toda população – “Você se encontra comigo no Grande Ponto”, “Vamos chegar no Grande Ponto”. Contudo, o que era denominado de Grande Ponto desapareceu há mais de meio século.
Era uma casa comercial, de duas portas para a Rio Branco e três para a Pedro Soares, que, depois de 30, tomou o nome de João Pessoa. Essa mercearia era de propriedade do português Custódio de Almeida, mercearia afreguesada, com algumas mesas para se tomar cerveja; no salão ao lado, dois bilhares utilizados pelos devotos dos divertimentos.
Não era o lugar freqüentado por meu grupo, que, nessa época, década de 20/30, preferia o Bar Majestique, antes chamado de Potiguarânia, o grande bar da minha geração, situado na rua Ulisses Caldas, e freqüentado por jornalistas, professores, literatos. Também freqüentamos o Bar Delícia, na Praça Augusto Severo. Estes eram os dois pontos mais freqüentados em Natal, na época. A minha geração toda passou por lá: Othoniel Meneses, Jorge Fernandes, etc.; era o bar – o Majestique – da bebida, da classe média, da intelectualidade.
O Grande Ponto, ao contrário, era um lugar de passagem, uma fixação puramente topográfica. Era, na geografia da cidade, ponto fixo. Grande Ponto foi denominação daquela esquina e aquela esquina se tornou imóvel e catalisadora nas memórias.
Havia, porém, uma outra esquina – para quem estuda trânsito, a posição das esquinas tem uma grande função delimitadora de bairro e fixadora de local – a qual Djalma Maranhão denominou-a de “esquina do mundo”, a esquina da Tavares de Lira com a rua Dr. Barata. Ele a chamou de “esquina do mundo”, pois era a Ribeira o bairro socialmente mais conhecido, e a esquina o ponto, além de um dos mais conhecidos também, o de mais fácil indicação. Dizia-se: “Você se encontra comigo na esquina do mundo.” Era a esquina da Tavares de Lyra.
Quanto ao Grande Ponto, eu, muito acidentalmente, passava por lá; e quando isto ocorria, bebia-se cerveja assistindo ao jogo de bilhar – aí por volta de 23, 24, 25. O português Custódio de Almeida, dono da mercearia e casado com uma filha do Capitão, mais tarde Coronel Toscano de Brito, era exatamente relacionado, simpático, grande conservador, conversava muito, sempre vestido de branco, baixo, grosso; depois de 30, mudou-se para o Recife, onde abriu uma mercearia diante do mercado São José.
Mas o nome Grande Ponto permanecia na fachada de seu edifício, que dava para a Rio Branco. E era também um grande ponto. Por ali cruzavam-se os bondes elétricos. Pela rua Pedro Soares, então João Pessoa, vinham os bondes de Tirol e Petrópolis. Pela Rio Branco, chegavam os da Ribeira e Alecrim. Cruzavam-se todos no Grande Ponto. Era o ponto de encontro.
Depois de 30, ficou famoso pelos políticos, partidários, eleitorado, que se reuniam no Grande Ponto. Era o chamariz. Os comunistas tentaram pôr o nome de Praça Vermelha, em 35. Djalma Maranhão chegou a chamar-lhe Praça da Imprensa. Mas o povo defendeu sua preferência, que era Grande Ponto. E o Grande Ponto marcava a situação topográfica da cidade.
Todo mundo sabia as tabelas de táxis e o pagamento de bonde da Ribeira ao Grande Ponto, do Alecrim ao Grande Ponto, de Petrópolis ao Grande Ponto, do Tirol ao Grande Ponto. Não tinha outra localização. Não se falava na casa de Ângelo Roselli, onde está, hoje, o Hotel Ducal, que era um palacete, habitado por um parente dele, deputado e um dos primeiros advogados da cidade.
Também existia, nessa época, o Natal Clube, maior centro social da cidade, situado na outra esquina. À tarde e à noite, jogo de pôquer, copas. Porém o nome que de fato subsistia era o da mercearia de Custódio de Almeida, o Grande Ponto, que ficou.
Grande Ponto. Há 50 anos não se escutava a sua história. Mas o próprio Aldo Pereira aludia à situação topográfica dizendo, “Grande Ponto”, e não existe, em Natal, topônimo mais conhecido que ele, mesmo nas gerações posteriores, e que não alcançaram aquele edifício de Custódio de Almeida – cujo caixeiro, Amaro Mesquita, trouxe outro episódio emocional: caixeirinho moreno, pobre, humilde, varrendo a calçada, parava o movimento da vassoura e dizia: “Nesse lugar vai ser o meu sobrado” ou “eu farei aqui o meu sobrado”. E fez. Construiu um edifício de vários andares, botando abaixo a mercearia da esquina na época, o maior sobrado de Natal, e que ainda hoje está aí. O caixeirinho Amaro Mesquita chegou a ser um grande comerciante de Natal. Mesmo o sobrado, ninguém dizia: “Você se encontra comigo em Amaro Mesquita”.
Os cafés, os bares já existiam na rua João Pessoa. Também ninguém se referia a eles. Só se falava: “Você se encontra comigo no Grande Ponto”. E o Grande Ponto não existia mais. Contudo, era uma presença e continuação. Este é o meu depoimento.
Natal, 11 de junho de 1981
In Grande Ponto – Antologia do Laboratório de Criatividade/UFRN – 1981
A musa maior da música potiguar se foi aos bravos 95 anos de idade. Maria da Glória Mendes Oliveira, nossa Glorinha deixou legado, simpatia e uma voz inconfundível de rouxinol que percorreu rádios, vinis, palcos e o coração do natalense.
Glorinha estava internada no Hospital Rio Grande para tratar de enfisema pulmonar. Há muito dores de artrite, sobretudo nos joelhos, já lhe castigavam mais que a falta de prestígio do potiguar com sua história.
Tive alguns divertidos encontros com Glorinha, seja na casa da rua João Carlos de Sousa, em Santos Reis, seja na casa por trás do colégio Marista, na Cidade Alta, ou nos palcos, com o da Assembleia Cultural.
Infelizmente consegui resgatar apenas esta curta entrevista realizada em 2009 para o Diário de Natal, que segue abaixo.
Meu último papo com ela foi no camarim da edição do Troféu Cultura, em 2019, ela acompanhada de admiradora e também cantora Valéria Oliveira, do inseparável filho Aécio e também de Eliete Regina, que também se apresentaria logo mais. Talvez tenha sido seu último show. E se foi, que bom que um suntuoso palco a recebeu.
Gravei nosso papo, mas ainda estou à procura do áudio. Foi algo breve, mas bacana. Ela falava de sonhos e memórias.
Mas quem quiser conhecer sua história não faltam documentos. Há, inclusive, a biografia “A Estrela Conta”, livro escritor pelo também saudoso Nelson Patriota, além de documentários e registros em vídeo. Também uma entrevista muito boa na edição nº 12 da Revista Brouhaha.
Em resumo, Glorinha foi mais do que essa cidade reconhece. Uma pessoa simples nascida nas Rocas, mas uma estrela maior cujo sonho era ter uma casa própria. Na entrevista a seguir ou nesses outros meios que sugeri, o leitor pode e deve saber mais da nossa rouxinol potiguar.
Diário de Natal (2009)
A relação de Glorinha Oliveira com os palcos merecia crônica de Nelson Rodrigues. É quase um caso de obsessão. O palco, o amante insaciável. Glorinha, a moça carente de amores. Uma paixão de mais de 70 anos. Em dezembro de 2007, o palco amante ouviu a despedida da voz de Rouxinol. Na noite de hoje, ela retorna aos braços daquele que sempre lhe acolheu. Será no Mercado de Petrópolis, dentro da última edição anual do projeto Quarta Cultural do Mercado de Petrópolis.
A voz jovial e potente de Glorinha jorrou romantismo pelos quatro cantos do Norte e Nordeste durante décadas. Aos 84 anos, Maria da Glória Mendes Oliveira diz pela primeira vez que sente a sua voz “fugir” e já perdeu a disposição para shows. Prefere, então, “parar no auge”, sem desafinar ou sair do tom. Na despedida há dois anos, Glorinha cantou ao palco amado: “Eu sei que vou te amar. Por toda minha vida, eu vou te amar. Em cada despedida eu vou te amar…”. E eis a volta.
O palco já não é mais aquele de outrora – o velho amante da mocidade. Glorinha gosta mesmo é de chegar e cantar, sem formalidades, parafernalhas eletrônicas e querelas burocráticas na montagem do… palco. Se vale mesmo é do “gogó”. Mesmo nas rádios de outrora, como a pioneira Rádio Educadora de Natal havia espaço para grandes orquestras, como a de Waldemar Ernesto, e tudo ao vivo, na “bucha”. E foi em consideração ao maestro Waldemar a volta de Glorinha aos braços do público. Ela explica o porquê.
Porque é uma coisa mais informal. Palco mesmo eu não tenho mais disposição. Esse ano eu penduro as chuteiras. A barra ta pesando, já. Quero deixar o palco no auge, sem desafinar. Cantar mesmo só em casa, numa brincadeira entre amigos, sem ser como profissional. É o jeito. Já são 84 anos nas costas, meu filho.
Graças a Deus caí no gosto do povo e sempre pedem para eu voltar. Mas cada qual sabe das suas possibilidades. Minha voz está fugindo. Em casa eu testo e tenho auto-crítica suficiente para perceber isso. É de fazer pena ver Ângela Maria desafinar, sair do tom. Nem sei se ela é mais velha do que eu, nem quero saber. Ademilde Fonseca, por exemplo, disse textualmente para mim que desistiu de cantar pelo mesmo motivo.
Tocarei com Paulo Tito (violonista e compositor), um grande nome da nossa música. O Paulo me falou que não abre a boca ou leva seu material para tocar de graça em canto nenhum porque não é besta. Ele está certo. Mas preferi dizer sim a quem teve consideração comigo. Então, o cachê que seria me dado, de R$ 50 para cobrir custos, dei pra ele. Vou cantar de graça, mesmo sendo uma pessoa humilde, sem nem casa própria para morar.
A Bruninha (Bruna Hetzel, produtora do evento) é neta do maestro Waldemar Ernesto. E tenho grande consideração por Waldermar desde muito tempo. Se ele me pedisse para cantar de graça no meio da feira eu ainda iria.
Enquanto ainda tiver dinheiro para pagar… Infelizmente não deu para fazer um “pé-de-meia” enquanto cantei. O artista era mal visto naquela época. Quando chegava para cantar parecia que estava contaminado. Hoje em dia é diferente e todo mundo sabe cantar depois da tecnologia que ajeita a voz. Na minha época era no gogó. Veja que hoje recebo um salário mínimo mais uma pensão dada por Garibaldi (Filho). Só o aluguel da casa (no bairro de Santos Reis) é 300 reais.
Se aparecesse um louco e dissesse: ‘Você fará um show e depois vai para sua casa’ eu faria das tripas, coração, subiria no palco para meu último show porque depois iria para uma casa que eu pudesse chamar de minha. Meu segundo sonho é gravar um DVD. Mas isso, antes de eu pegar minha passagem só de ida eu ainda faço; é segredo profissional. Sairá pela UFRN. Enfim, apesar dos pesares sou feliz. Só reclamo das dores da artrose. Mas vejo tanta gente em situação pior. Ora, estou viva, inteira. Não estou velha, estou usada; estrada é que fica velha. Gostaria que muitos tivessem a alegria que tenho hoje.
Nesta quarta (10) estreia no blog Natal das Antigas mais uma série sobre a História do Rio Grande do Norte, intitulada ‘Alecrim: História & Amor’.
Em meio as comemorações dos 110 anos do bairro do Alecrim, o blog prepara 24 postagens sobre sua História que vão caminhar por dois eixos: Cultura e Arte, que falaremos sobre as igrejas e escolas do bairro, além da famosa feira e o precioso cemitério.
Também será discutida a Expansão Urbana e Modernidade, os projetos de modernização da cidade que foram implantados no Alecrim que deixaram suas marcas na vida dos moradores.
Será uma série quinzenal promovida pelo Natal das Antigas, que vai trazer fotos, discutir com os grandes clássicos de nossa História e dar voz às pesquisas mais recentes sobre o Rio Grande do Norte.
Tudo produzido por gente que ama a nossa terra. Convidados de peso também estarão presentes como Luciano Capistrano, Juliana Rocha e Bartholomeu Carneiro, além da equipe premiada que já trabalha no blog.
Foi lançada essa semana a página virtual que apresenta o acervo da Exposição “Rádio Rural: comunicação, educação e cultura no Seridó”. Para acessar basta clicar AQUI. O projeto traz registros da história da Rádio Rural nesse mais de meio século.
Entre os destaques da exposição estão os registros da fundação da Emissora de Educação Rural de Caicó, do MEB – Movimento de Educação de Base, de radialistas e profissionais que fizeram a comunicação da Rural ao longo das décadas e depoimentos de cantores que participaram da Mais Bela Voz da Rural, entre eles Chico César.
“A Rural contribuiu para a educação, a cultura, a comunicação e a evangelização do Seridó nos últimos 57 anos. Por isso, a Rádio é comumente visitada por pesquisadores, ouvintes, artistas e fãs da programação”, destaca Joelma de Souza, diretora de programação da rádio..
Além da exposição física que está montada no prédio da Rádio Rural de Caicó, agora também está disponível o site com todo o acervo virtual e gratuito.
O projeto da exposição foi desenvolvido pela CF Consultoria Projetos e Negócios Digitais, com apoio do Sistema Rural de Comunicação, da agência Referência, de pesquisadores do curso de História do CERES-UFRN e patrocínio do Sebrae-RN.
Uma iniciativa do Coletivo de Artes Casa de Pedra com consentimento do próprio homenageado, está sendo iniciada a organização do Arquivo Pessoal de monsenhor Ausônio Tércio de Araújo.
O projeto foi aprovado em edital da Lei Aldir Blanc da Fundação José Augusto e será coordenado pela arquivista Shara Rachel e pelo artista plástico Custódio Jacinto.
“O desafio profissional de organização de um Arquivo Pessoal pode ser transformado em diversas frentes de pesquisa sobre a vida do produtor do acervo, muitas vezes convergindo em histórias da sociedade da qual ele faz parte”, destaca Shara.
Ela ressalta ainda a relevância da documentação na constituição de um Memorial que se apresentará como guardião e disseminador dos resultados da organização e do acervo que o constitui.
Como o acervo de padre Tércio conta com extensa biblioteca, bibliotecários também se integrarão ao projeto, e a agência Referência contribuirá com produção de conteúdos audiovisuais e desenvolvimento de plataformas digitais para o arquivo.
Segundo Goretti Silva, que auxiliou o sacerdote por muitos anos, o projeto, antes de ser inscrito no edital, chegou a ser aprovado pelo próprio padre Tércio que apontou objetos e documentos que achava relevantes.
O passo a passo da organização do arquivo inclui: elaboração de biografia cronológica do produtor; higienização documental; identificação dos documentos de acordo com a sua espécie (ata, carta, decreto, disco, filme, folheto, fotografia, memorando, ofício, planta, relatório, etc).
E ainda elaboração do quadro de arranjo; notação da localização de todos os documentos; elaboração de instrumentos de pesquisa (inventário ou catálogo por série documental).
“Após a organização do Arquivo Pessoal de Padre Tércio, trataremos sobre a instalação de um Memorial. Será uma oportunidade para preservar sua memória, que se confunde com a trajetória da Diocese de Caicó, a educação e a comunicação no Seridó”, explica Goretti Silva.
Monsenhor Ausônio Tércio de Araújo faleceu no último dia 09 de janeiro, aos 85 anos, em decorrência da COVID-19.
Natural de Currais Novos, o sacerdote dedicou-se à Igreja do Seridó por 60 anos, a maioria deles na Paróquia de São José, em Caicó, sendo também o diretor mais longínquo do Colégio Diocesano Seridoense e do Sistema Rural de Comunicação.
O grupo de pesquisa Os espaços na Modernidade (UFRN), com apoio da TVU e do IFRN campus Zona Leste, está realizando uma série de 10 documentários de curta duração intitulada “Episódios da história do Rio Grande do Norte”. Já foram lançados os episódios 1 e 2.
O primeiro, com o título “Afirmações e perguntas sobre a História”, apresenta alguns fundamentos do trabalho do historiador, como o uso dos documentos, a maneira como ele lida com as vozes do passado, o papel da observação e da imaginação na construção da História. A linguagem do documentário é incisiva, ágil, indagadora.
O segundo, trata do início dos primeiros tempos da colonização, focalizando, em linhas gerais, a presença antiga dos Potiguara, a chegada dos europeus, a passagem de “terra dos Potiguara” para “Capitania do Rio Grande”, e os processos relacionados a essa passagem: a expansão europeia, a produção orientada para os mercados mundiais, a interiorização da ocupação, com a fome de terras que a caracterizou, e a violência fundadora que está na base da história do Rio Grande do Norte.
Trata-se de material que pode auxiliar o trabalho dos professores e ao mesmo tempo pode interessar ao grande público.
Estão à frente do projeto os professores Raimundo Arrais (UFRN) e Artemilson Lima (IFRN) e os textos foram construídos por professores e pesquisadores especializados em temas do Rio Grande do Norte.
Os dois próximos episódios, que devem sair neste primeiro semestre de 2021, enfocarão, sucessivamente, a “Guerra dos Bárbaros” e a Escravidão no Rio Grande do Norte.
O acesso aos filmes e outras informações de interesse podem ser obtidas na página do Grupo de Pesquisa, clicando AQUI.
O Texto abaixo é deste editor, publicado em 2006 na edição nº 16 da saudosa Revista Preá. Após 14 anos minhas recordações são poucas, mas lembro de uma cidade urbanisticamente organizada como poucas que conheci à época. Ruas largas, quarteirões simétricos e uma tranquilidade noturna atípica mesmo para uma cidade interiorana.
A figura de Felipe Gomes é outra lembrança gostosa. Sujeito brabo, típico cabra macho de interior. Seu relato das lembranças de Lampião, frequentador assíduo em sua fazenda em Pernambuco, como herói que a criançada se inspirava, além dos elogios encabulados à beleza de Maria Bonita, perto de sua esposa, pagaram a viagem.
Umarizal me vêm à lembrança de forma simpática. De receptividade sertaneja farta por onde visitávamos, da mega fábrica Vicunha, da tranquilidade apesar do jeito aparentemente ríspido dos moradores. Mas tudo são recordações. Mais abaixo, um pouco da história e de outras impressões mais vivas, de 14 anos atrás.
Umarizal, a 405 km de Natal, ainda é uma jovem cidade. Há exatos 62 anos, em 27 de novembro, se desmembrava de Martins para ganhar o status de novo município potiguar.
Muitos moradores, sobretudo os mais antigos, deixaram sítios e fazenda de criar e de plantar para morar na cidade, que prosperava amparada no ciclo algodoeiro.
Talvez por isso, a receptividade sertaneja ainda resista tão latente em Umarizal. O município, que chegou à condição de terceiro em arrecadação do Estado, hoje vive em função dos empregos gerados por uma grande empresa fabricante de carrocerias.
O ciclo do algodão ou a feira livre da cidade, que aglomeravam visitantes de todas as regiões, são hoje apenas retratos de um passado rico.
O nome Umarizal pode ter surgido em referência à grande quantidade de árvores chamadas umarizeiras. Mas hoje o que se encontra em cada quarteirão da cidade são as árvores sempre-verdes. São elas que emprestam alguma sombra às ruas.
Mas Umarizal já colecionou outros nomes. Antes de se constituir Vila Divinópolis, em 1938, a região tinha o nome de Gavião. A originava da povoação formada às margens do riacho homônimo.
Como escreveu Manoel Onofre Jr, a ocupação daquelas terras se deu no início do século 18, quando foi concedido ao padre Manoel Pinheiro Teixeira e a Joseph Ferreira, terras situadas entre as serras de Mãe D’água e Catolé, às margens do riacho Umari.
Parte dessas terras pertenciam ao padre João de Paiva e ficava na nascente do riacho Gavião.
Em 1902, escreveu Câmara Cascudo no livro Nomes da Terra, o povoado de Gavião já contava com cemitério, capela e algumas casas de taipa e palha.
E foi em volta do cemitério, puxada pela movimentação de uma feira livre repleta de cantadores, violeiros, folhetos de cordel, comidas típicas e artesanatos variados em cerâmica lúdica, utilitária ou decorativa, que a cidade cresceu.
A capela do Sagrado Coração de Jesus, hoje igreja matriz, também foi construída em 1902, por iniciativa do padre Abdon Melibeu. Mas, como tantas outras, está distante da arquitetura original. O seu oratório tem pouca semelhança com os de estilos antigos.
No entanto, muito da história do município está preservada na memória de moradores ilustres, como dona Telva Menezes, de 98 anos. A irreverência em conjunto com a valentia de seu povo pode ser retratada pelos depoimentos, recordações e trejeitos de Felipe Gomes de Souza, de 80 anos, e suas lembranças de Lampião.
O escritor Mário de Andrade, considerado o papa do modernismo brasileiro, quando de passagem pelos interiores do Nordeste, em 1929, caracterizou os moradores do povoado de Gavião como “gente brigona, acangaceirada”.
Mas a julgar pela simplicidade do empresário mais bem sucedido da região, Joaquim Suassuna Filho, 70 anos, ou mesmo pelo silêncio das ruas nas notes de Umarizal, a verdade é outra.
O estilo pacato ou a riqueza também se encontram naqueles onde a simplicidade foi oferecida como sina do destino. O violeiro e cantador Raimundo Praxedes é um destes. Considerado dos nomes mais representativos da cultura popular de Umarizal, vive sem apoio ou estímulo para espalhar sua poesia pelos recantos nordestinos, como a maioria dos poetas, cordelistas e cantadores populares de outrora.
A Umarizal de ruas largas, do senador Zezito, ainda abriga outras expressões culturais. Mas, a decadência da antiga feira livre, vitrine para mostra e venda de produtos artesanais e das artes plásticas da cidade, contribui para o anonimato desses personagens.
A Casa de Cultura Popular instalada no município ainda serve de espaço para algumas exposições ou apresentações de grupos como o “Relendo Araruna” e a companhia teatral “Arte & Riso”, sobretudo durante os eventos da cidade. Umarizal ainda é riqueza na tradição e na cultura de sua gente.
No próximo mês de dezembro será reinaugurado – em data a confirmar – o Museu Histórico de Martins, importante melhoramento cultural para aquela cidade serrana, de interesse não apenas histórico, mas também turístico.
Fundado em 1955, por iniciativa particular, o museu sobreviveu precariamente ao longo das décadas, graças aos esforços de alguns abnegados martinenses.
Seu acervo composto de imagens e objetos de arte sacra, louças, móveis antigos, galeria de vultos ilustres, etc. – sempre deixou a desejar, tanto assim que a maior atração, para quem o visitava, era a própria sede, uma belíssima construção de 1871, verdadeiro monumento arquitetônico.
Agora, o velho sobrado, primorosamente restaurado, passa a abrigar um bom museu histórico, digno de figurar entre os melhores do Estado.
Conforme consta no projeto curadorial e museográfico, elaborado pelo professor Jairo José Campos da Costa, “após o restauro que durou, aproximadamente, 4 anos, através de emenda do ex-senador José Agripino Maia, a partir de uma articulação da prefeita Olga Chaves Fernandes de Queiroz Figueiredo, começou-se o planejamento e a execução da curadoria e da museografia.
“O projeto curadorial e museográfico foi elaborado a partir do acervo de mobiliários tradicionais, peças de arte, antiguidades, fotografias preto e branco, livros antigos existentes no acervo permanente, como também algumas doações e empréstimos feitos pelas famílias martinenses, e ainda, algumas aquisições feitas pela prefeitura em galerias e antiquários de Natal”.
Após descrever a disposição das peças em cada um dos três pavimentos do prédio do museu, informa o projeto que, nestes ambientes, bem como nos corredores serão afixados textos curatoriais, em técnicas plotagem de recorte em adesivo “contendo explicações de cada espaço, como também destacando fatos importantes da História do Município de Martins. Ainda serão afixadas nos ambientes e nos corredores telas de renomados artistas potiguares, dentro da proposta de cada espaço, doadas /emprestadas pelo filhos martineneses Onofre Neto e Zé Augusto”.
E acrescenta:
“O material mais importante e antigo ficará sobre bases de vidro e cobertos com redoma protetora para impedir toques e avarias”
No final, destacam-se aspectos técnicos relativos ao restauro do prédio-sede, funcionamento do museu, etc.
O autor do projeto e curador professor Jairo José Campos da Costa é mestre e doutor em Letras. Atualmente, faz Mestrado em Museologia na Universidade Federal da Bahia. Natural de Francisco Dantas (RN), mantém naquela cidade oestana o Museu de Cultura Popular.
O artista plástico Carlos José Marques retratou o sobrado em um belo álbum de serigrafias – “Roteiro Histórico e Cultural do Rio Grande do Norte”, vol II (Natal, Secretaria de Educação e Cultura, sem data) – texto de minha autoria.
Consta do referido álbum a seguinte nota, com base nas informações de que eu, então, dispunha.
“O Sobrado de Martins foi construído em 1871, para ser residência de um ricaço local.
Boa parte do material de construção veio de fora. As pedras para a sacada da varanda, vieram de Souza (PB), em lombo de burro, por ser, então, impossível acesso à serra por carro-de-boi.
Pertenceu o Sobrado ao Senador Almino Afonso – informa-nos Manuel Onofre de Andrade em seu livro “A Abolição Antes da Lei Áurea”, biografia do abolicionista e republicano histórico:
“E assim, no auge de sua fortuna, adquirira o mais imponente edifício da então, próspera cidade do Martins, cidade climática, ao tempo citada na Alemanha para cura da tuberculose, antes do pneumotórax (em 1923 ainda vi cariocas, atacados do mal, irem fazer, ali, estação de cura).”
Adianta-nos o historiador:
“Tivera o amplo prédio o destino de sede do Colégio 7 de Setembro, transferindo-se de Mossoró para a cidade serrana, em agosto de 1904. Ainda depois de doado, nele funcionara o Orfanato Abigail Afonso, nome de sua consorte, e foi sendo, sucessivamente, museu, escola de comércio, jardim de infância, banda de música e Cosern (Cia. de Serviços Elétricos do Rio Grande do Norte) ” ( pág.99).
Ao correr dos anos abrigou o anexo do Ginásio, Secretaria Municipal de Educação e Cultura e Biblioteca Pública Municipal.
Muito alto e majestoso, o sobrado impressiona. É o maior do Estado. Inspirado em sua fachada Dorian Gray fez o desenho de capa do livro “Martins – Sua Terra, sua Gente”, de minha autoria, (1966).
Diz-se que o Sobrado pertenceu unicamente, ao Senador Almino Afonso. Será verdade?
Compulsando os autos do inventário dos bens deixados por falecimento do Tenente-Coronel José de Souza Martins Pereira e sua mulher, Emília Cândida de Souza, constatei que o Sobrado, de propriedade do casal, transmitiu-se por herança, em parte, à sua filha Abigail Cândida Alvares Affonso, mulher do deputado federal Almino Afonso, depois Senador.
Abigail e seu irmão João Emiliano tiveram partes maiores, no Sobrado, mas, vários outros herdeiros também foram aquinhoados.
É provável que o Dr. Almino Afonso, homem de posses, tenha comprado as partes dos cunhados, tornando-se único proprietário.
Em 1940, dentro dos festejos comemorativos do centenário da Paróquia de Martins, instalou-se no prédio um Orfanato, que recebeu o nome de Abigail Affonso.
Mas, ao que tudo indica, o ilustre parlamentar não residiu no Sobrado. Talvez ocupasse em períodos de férias.
Não tenho dúvidas em dizer que o verdadeiro Senhor do Sobrado não foi Almino Afonso, como se propala, mas sim, José de Souza Martins Pereira, que o construiu e nele residiu por muitos anos, com sua família.
A cidade de Martins, antiga Imperatriz, de muitas tradições culturais, conta com outro museu, este, pequeno porém muito interessante – Museu “Coronel Demétrio Lemos”, instalado em dependências do antigo Grupo Escolar “Almino Afonso” (atualmente Escola Estadual).
Compõe o acervo, além de alguns móveis e objetos antigos, uma coleção de estatuetas neoclássicas e art-nouveau, em bronze e gesso, doações do Coronel Demétrio, um benemérito da terra.
São dezenas de peças, a maior parte de indiscutível valor histórico e artístico. Pelo menos, umas cinco – figuras de Miguel Ângelo, Guttemberg, Galileu, Júlio Cesar e Milton – em maiores proporções, cerca de meio metro de altura, causam especial impressão. Sem dúvidas, um raro conjunto.
Na biblioteca do antigo Grupo Escolar, algumas raridades bibliográficas, também doadas pelo Coronel Demétrio, entre as quais edições de luxo, em formato gigante, de “Os Lusíadas”, “O Inferno”, de Dante, e “Orlando Furioso”, de Ariosto, com ilustrações de Gustave Doré.
O Rio Grande do Norte tem uma dívida de gratidão para com uma de suas mais ilustres filhas, a cantora Ademilde Fonseca. Decorridos cerca de sete anos do seu falecimento, não se registrou nenhuma homenagem significativa à sua memória, nem sequer um nome de rua lhe foi dado. Lamentável omissão.
Ainda bem que o seu nome não ficou totalmente esquecido. Em 2015, a pesquisadora Leide Câmara publicou, pela 8 editora, em parceria com o Selo Cultural Caravela, “Ademilde Fonseca – A potiguar no choro brasileiro”, livro bem documentado, em que aborda aspectos da vida e da obra dessa que é considerada, por muitos, a maior das cantoras que o Rio Grande do Norte já doou ao Brasil.
Ademilde Ferreira Fonseca nasceu na localidade Pirituba, município de Macaíba, a 4 de março de 1921. Ainda criança veio para Natal, onde sua família fixou residência; aqui se casou e daqui se lançou no mundo musical. Uma de suas primeiras apresentações ao público deu-se através da famosa rede de amplificadoras de Luiz Romão, com sede no bairro da Ribeira.
Mudando-se, com a família, para o Rio de Janeiro, então capital da República, Ademilde tornou-se, ao longo das décadas de 40 e 50, uma das mais prestigiosas cantoras brasileiras. É verdade que não chegou a ter a fama de uma Emilinha Borba ou de uma Dalva de Oliveira, tampouco mereceu o prestigio junto à crítica, que desfrutava Elizeth Cardoso, por exemplo.
No entanto, nada ficava a dever a estas, como cantora dotada de extraordinários dotes vocais. Seu repertório, sempre de alta qualidade, contribuiu, sem dúvidas, para o sucesso que obteve. Ademilde quando cantava, deixava-se possuir pela música. Era da estirpe de Carmem Miranda: natural, espontânea, vibrante.
Dona de estilo especialíssimo, foi uma das primeiras senão a primeira intérprete do choro cantado. A seu respeito, Herminio Bello de Carvalho, autoridade em matéria de MPB, afirma:
“Rainha inconteste de um gênero predominantemente instrumental, ela se impôs através dos anos como intérprete, única e inigualável. Afinação irrepreensível, articulação precisa, senso rítmico incomum e timbre inconfundível” (Nota na contracapa do Lp “A Rainha Ademilde e seus Chorões Maravilhosos”).
Note-se que as interpretações de Ademilde eram valorizadas, quase sempre, por excelente acompanhamento orquestral, do qual faziam parte verdadeiros ases do choro.
Dentre os sucessos da Rainha do Choro destacam-se “Tico-tico no Fubá” (Zequinha de Abreu\ Eurico Barreiros), “Apanhei-te Cavaquinho” ( Ernesto Nazareth\ Darci de Oliveira\ Benedito Lacerda), “Brasileirinho” ( Waldir Azevedo\ Pereira da Costa), “Delicado” ( Waldir Azevedo\ Ari Vieira), “Galo Garnizé” ( Miguel Lima\ Antonio Almeida\ Luiz Gonzaga), “Pinicadinho” (Jararaca e Ratinho\ Severino Rangel), “Meu Cariri” (Rosil Cavalcanti\ Dilu Melo).
Embora tenha se notabilizado com chorinhos, polcas e baiões, como estes, também soube afirmar-se em composições nada trepidantes, tipo “Doce Melodia” (Abel Ferreira\ Luiz Antonio), “Sonoroso” (K-Chimbinho\ Del Loro) e outras de viés romântico ou sentimental.
Entre parêntesis, diga-se que o autor da melodia do choro citado por último, K-Chimbinho (pseudônimo de Sebastião Barros) é norte-rio-grandense, natural de Taipu, figura de primeira plana na história do choro, não só compositor, mas também instrumentista.
Referindo-se ao itinerário artístico da Rainha do Choro, Leide Câmara observa, com justeza:
“O fato de ser respeitada como mestra do chorinho, por um lado ajudou, e por outro, prejudicou a carreira da cantora, pois com ‘a decadência’ do choro, ela passou alguns anos no esquecimento” (Dicionário da Música no Rio Grande do Norte, 2001).
Em meado da década de 70, Ademilde voltou à crista da onda com a ressurgência do chorinho. E em plena forma. Recebeu várias homenagens, entre as quais destaque-se o chorinho ‘Títulos de Nobreza’ (João Bosco\ Aldir Blanc), cuja letra, citando os nomes de choros famosos, termina por declinar, como que em apoteose, “Ademilde no Choro”.
A convite do Governador Cortez Pereira, Admilde, já com 53 anos de idade, mas ainda no fio, apresentou-se em Natal, 1975, dentro do evento “Reencontro”, que reuniu vários artistas norte-rio-grandenses, de projeção nacional: cantores, músicos e compositores. Brilhou, como sempre.
Em 1977, lançou o Lp “A Rainha Ademilde e Seus Chorões Maravilhosos”, pela gravadora Copacabana, em parceria com o Museu da Imagem e do Som (RJ). Ótimo disco, esse. Foi o seu canto de cisne. Daí em diante somente apareceu em coletâneas musicais, e fez alguns shows, Brasil afora.
Ademilde faleceu no Rio de Janeiro, a 27 de março de 2012, com 91 anos de idade. Um dia antes apresentara-se num programa televisivo, no Rio, ao lado de sua filha Eymar Fonseca, também cantora.
Feminismo, resgate histórico, educação, luta, esquecimento, busca, encontro. Esses são alguns dos pontos de partida da obra “#NísiaFlorestaPresente, uma brasileira ilustre”, de autoria da escritora e pesquisadora Constância Lima Duarte. O livro será lançado em Natal no dia 4 de novembro, no foyer do Teatro Riachuelo, às 19h.
O lançamento da obra é a culminância do projeto “Nísia Floresta: uma mulher à frente do seu tempo”, produzido por Mariana Hardi e viabilizado por meio da Lei Municipal de Incentivo à Cultura Djalma Maranhão da Prefeitura do Natal, com patrocínio do cemitério e crematório Morada da Paz.
O projeto contempla não só a produção do livro como também a distribuição gratuita e consciente dos exemplares, que serão entregues gratuitamente nos eventos de lançamento e para escolas públicas, bibliotecas e outras entidades.
Outro detalhe é que a iniciativa conta com uma equipe composta quase que totalmente por mulheres: coordenação de produção por Mariana Hardi; escritora Constância Lima Duarte, revisora Andreia Braz; projeto gráfico e diagramação por Amanda Duarte e Milla Azevedo; assistente de produção Luiza Oest; assessoria de imprensa por Marina Lino e Mariana Pinto; fotografia por Larissa Marinho; vídeo por Luana Tayse; assistente administrativa Jeane Ataíde; entre muitas outras.
Além do lançamento em Natal, haverá um lançamento dentro da programação do II Festival Literário de Nísia Floresta no dia 31 de outubro, às 14h, onde Constância fará uma fala.
Constância Lima Duarte morou em Natal por 20 anos, período em que foi professora na UFRN. É ainda pós-doutora pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
“Acredito que encontrei Nísia Floresta aqui, mas acho que ela está no inconsciente de toda feminista. Tenho a sensação de que todo mundo a reconhece quando falamos o nome dela. Com Nísia, me senti familiar, percebia que as pessoas também a conheciam, mas ninguém sabia explicar quem de fato ela foi. E eu fiquei com essa necessidade de contar quem ela é, a sua história e seus feitos”, conta.
À medida em que ia buscando e localizando referências, notícias, recortes e artigos, Constância foi montando um grande quebra-cabeça sobre Nísia Floresta. Quando esteve em São Paulo e no Rio de Janeiro, a autora também buscava essas referências sobre Nísia, mesmo assim ainda havia pouquíssimo material.
“No doutorado, decidi fazer a pesquisa seguindo os passos de Nísia por Recife, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Portugal, Itália, Alemanha, França e Inglaterra. Essas viagens duraram dois anos. Depois desse período, parei para poder organizar o que tinha coletado, para ler os livros que havia localizado, montar o mosaico e finalmente contar a história”, detalha.
“#NísiaFlorestaPresente: uma brasileira ilustre” é uma obra biográfica que segue a cronologia dos passos da personagem principal e começa falando da importância de se conhecer Nísia Floresta.
“Ela já estava entrando no processo de memoricídio, corríamos o risco de em breve mal sabermos o básico sobre ela. Aqui destaco que um dos agravantes é que especialmente a história das mulheres foi apagada, foi delegada ao esquecimento. Não sabemos quem foram as mulheres pioneiras no Brasil. A história das mulheres ficou no limbo”, alerta Constância.
Há mais de 200 anos, nascia uma menina no interior do Rio Grande do Norte que se tornaria uma exceção dentre a maioria esmagadora das mulheres de seu tempo, com espírito contestador e libertário quando defende a educação feminina, o direito dos índios e dos negros à liberdade.
No conjunto da obra de Nísia – 15 livros, entre ensaios, romances, poemas e crônicas, publicados em português, francês, inglês e italiano – existe uma espécie de diálogo cujo propósito era formar e modificar consciências, e assim contribuir para mudar o quadro ideológico social de seu tempo. Direitos das mulheres e injustiça dos homens foi apenas o primeiro passo dado nesta trajetória, a semente que logo germinaria nos demais escritos.
E por que #NísiaFlorestaPresente? A referência à socióloga e política Marielle Franco, que foi assassinada a tiros no dia 14 de março de 2018, em um atentado ao carro onde estava, busca resgatar a importância de não deixar a história de Nísia desaparecer.
Lançamento do livro #NísiaFlorestaPresente: uma brasileira ilustre
Data: 4 de novembro de 2019 – segunda-feira
Horário: 19h
Local: Foyer do Teatro Riachuelo, em Natal
O carnaval chegou mais cedo para o Mais Querido. E nada de uma quarta-feira de cinzas e amarguras. O alvinegro ensinou o ABC do futebol ao Bragantino na noite de ontem e assegurou uma vaga na segunda divisão do Brasileirão 2008, após seis anos, com um gol do zagueiro Allan e outro do craque Wallyson. Os torcedores acreditaram no time, creditaram confiança e ditaram o ritmo do jogo nos dois tempos de uma partida movimentada no primeiro ano do Frasqueirão.
Este jornalista foi incumbido da cobertura do lado de fora do Frasqueirão. Escrever sobre o choro ou a festa da torcida. E acredite, as batidas do coração do torcedor que ficou de fora eram ritmadas pelo barulho da torcida no Estádio com mais de 13 mil pagantes. Lampejos menos estridentes significavam a combinação de resultados desejada para a ascensão do ABC.
Mas eis que uma multidão solta o grito preso e o torcedor fanático e liso do lado de fora vibra como criança. Era o segundo gol. E liso porque os ingressos estavam sendo vendidos por R$ 2. O cambista “Ventola” pediu pra eu escrever: “Bota aí: cambista tão tudo com cara de choro por causa do prejuízo”. “Japonês”, cambista experiente, disse ter prejuízo de R$ 2 mil.
Aos 45 minutos do segundo tempo ninguém tinha arredado pé do Estádio. Um único torcedor saiu, apressado e com rádio no ouvido. Disse que o juiz daria pelo menos mais cinco minutos de acréscimo. É o sofrimento dos cambistas espalhado em milhares. Mais um grito em uníssono e os fogos de artifício anunciavam o ABC na Segundona. Ainda demorou para a torcida largar o Estádio e ganhar as ruas. Pelo menos uns dez minutos. Pareciam esperar a bandinha de frevo, do carnaval alvinegro e o som da marchinha: “ABC clube do povo, campeão das multidões…”.
Atrás da bandinha estavam Marinho Chagas – eterno lateral da Seleção da Copa de 1974 – e seu copo de uísque. Após pegar um depoimento do ex-craque, inventei de emprestar a caneta pra ele dar um autógrafo. Só recuperei minha bic depois de uns 60 torcedores ganharem a assinatura do rapaz. Perdi uns 15 minutos na conversa. É isso. Marinho ainda mandou recado pra Véscio, companheiro da Redinha Velha e ex-jogador e torcedor fanático do América: “Diga ao nêgo Véscio que o dele desceu e o meu subiu”. Minha mente poluída pensou em outra coisa que não a caída e a subida do América e do ABC. Mas deixa pra lá.
E se os torcedores estavam histéricos, os ambulantes com sorriso escancarado e a lojinha do ABC lotada, alguém estava contrariado. Preso no trânsito que tomou a Rota do Sol, o engenheiro Marcos Silvino foi pego de surpresa: “Nem gosto muito de futebol e se fosse torcer por alguém seria pelo América”. Fodeu-se. E se mais adiante o trânsito acalmava, um automóvel com porta traseira aberta, chassi arrastando no asfalto e lotado de torcedores e bandeiras passava: “Becê, becê!”.
O ABC espalhou-se em torcedores, bandeiras e buzinas pelas ruas, paradas de ônibus, janelas de casas e apartamento e nos ouvidos de muita gente. Quando a festa, que continua hoje, terminar, ainda se ouvirá o eco: “Becê, becê!”. E ontem, lá do alto, a lua, imponente, assistia a tudo e refletia múltiplas luzes brancas na noite da cidade. E qualquer semelhança com as cores que pintaram a paisagem de Natal na noite de ontem, acredite, não é mera coincidência.
ABC: Raniere, Nêgo (Fábio Silva), Fabiano, Ben-Hur, Alan, Rogerinho, Adelmo, Jean (Joassis), Juninho Petrolina (Peu), Ivan, Wallyson. Técnico: Ferdinando Teixeira
OBS: Três anos depois, em 2010, o ABC voltaria à Série B, desta vez como campeão da série C.
Sem a menor originalidade, mas falando do fundo da alma, posso dizer que tenho no coração quatro cidades: Santana do Matos, Martins, Mossoró e Natal.
Afora Santana, minha terra-berço, de onde saí para não mais voltar, com apenas 1 ano e poucos meses de idade, as demais formam o meu itinerário de Pasárgada…
Em Martins, no alto de uma serra paradisíaca (vá lá o clichê), vivi a infância, uma década cujos encantos a memória sentimental vai ampliando à medida em que passam os anos e a gente vai ficando cada vez mais nostálgico.
Como Martins não dispunha, então, de uma escola secundária, meus pais me mandaram continuar os estudos em Mossoró, interno no Colégio Diocesano Santo Luzia, que ainda funcionava no velho prédio da Praça Vigário Antonio Joaquim (Anos depois, lamentavelmente, demolido). Era o ano de 1956. Mossoró era uma cidade tranquila e provinciana, mas já cognominada Capital do Oeste. Desenvolvia-se graças ao comércio e indústria do algodão, principalmente.
Para que se avalie a sua crescente importância sócio-econômica, basta dizer que contava com uma instituição bancária local, o Banco de Mossoró, sediado num “arranha-céu” (cinco andares!), linha aérea regular e estrada de ferro – a “Mossoró-Souza”.
Um jornal, “O Mossoroense” velho de guerra, e duas rádios – Rádio Difusora de Mossoró e Rádio Tapuio – constituíam a impressa escrita e falada, como então se dizia.
Dois clubes movimentavam a sociedade com festas animadas: Ipiranga e ACDP (Associação Cultural e Desportiva Potiguar, que, inicialmente, chamava-se apenas ADP), situada à margem do rio Mossoró, logo após a ponte “Jerônimo Rosado”. O povo, gaiatamente, dizia que a sigla ADP significativa “Adepois da ponte”, e ACDP “Adepois da curva da ponte”.
No plano cultural, Vingt-Un Rosado e João Batista Cascudo Rodrigues eram os nomes em evidência, grandes animadores, ou melhor, ativistas, para usar a linguagem de hoje. Vingt-Un à frente da “Coleção Mossoroense”, já a todo vapor; livros e plaquetes editados em profusão; João Batista no ICOP (Instituto Cultural do Oeste Potiguar) e n´outras frentes, ambos cheios de ideias e sempre dispostos a coloca-las em prática.
“O Mossoroense”, fazendo jus à tradição, tinha a eficiência de Lauro da Escóssia, seu diretor, e a pena afiadíssima de Jaime Hipólito Dantas. Outros nomes – Rafael Negreiros, Elder Heronildes – participavam do jornal como colaboradores.
Em 1957 meus pais vieram residir em Mossoró (papai, Juiz de Direito, fora promovido para a terceira entrância, vindo ocupar uma das duas Varas da Comarca de Mossoró), e eu, até então interno no “Santa Luzia”, ganhei harbeas corpus, passei a estudar externo. Foi um alívio, uma felicidade. Vale dizer, entre parêntesis, que o Colégio havia se mudado, no meio do ano anterior, para o prédio novo, construído na periferia da cidade.
Sobre a minha vivência no tradicional educandário, que me deixou tantas marcas, escrevi página de memórias, incluída no meu livro “O Caçador de Jandairas” (3ª. edição, revista e aumentada. Natal: Oito Editora, 2019).
Morávamos em casa alugada, na rua Tibério Burlamaqui um casarão com não sei quantos quartos e salas. A rua sem calçamento tinha um doce ar de subúrbio.
Adolescente, 13 anos em flor, sempre às voltas com os desencontros e alumbramentos próprios da idade, eu começava a descobrir a Vida… Minha maior curtição eram as matinês nos cinemas Pax e Caiçara. Duas a três vezes por semana me largava pela rua Mário Negócio em direção ao centro da cidade, ansioso para assistir à fita em cartaz.
Às vezes, depois do filme, voltava pra casa quase correndo, não podia perder, no rádio, mais um capítulo da novela “Jerônimo, o Herói do Sertão”.
Foi na Mário Negócio que descobri a Biblioteca Pública Municipal, instalada num salão do andar térreo do Clube Ipiranga; ali mantive os primeiros encontros com a Literatura e findei virando leitor inveterado.
Muita coisa ainda teria a dizer sobre Mossoró do meu tempo. Mas, ela tornou-se, como a Itabira de Drummond, apenas “um retrato na parede”… E como dói.
Chega de saudade.
O Conselho de Arquitetura e Urbanismo do RN, o Instituto de Arquitetos do Brasil-RN e o Sindicato de Arquitetos e Urbanistas do RN elaboraram uma Nota Conjunto de Repúdio contra a demolição do Hotel Internacional Reis Magos e sobre o Conselho Estadual de Cultura ignorar um estudo realizado pela UFRN e o desrespeito ao trabalho realizado por arquitetos e urbanistas que atestam e subscrevem pareceres técnicos a respeito do conjunto das características de obras arquitetônicas e/ou urbanísticas.
A Nota Conjunta ainda destaca que as normas que regem a arquitetura e o urbanismo reforçam ser o arquiteto e urbanista detentor da formação técnica com competência à condução desses processos. Ignorar a fundamentação técnica dos arquitetos e urbanistas representa risco à conservação da história da arte e da arquitetura, e coloca o Estado do RN na contramão do que se pratica como turismo nacional e internacional consciente e defensor da preservação e valorização da memória arquitetônica de seu povo.
Confira a nota:
NOTA CONJUNTA SOBRE O EXERCÍCIO PROFISSIONAL NO ÂMBITO DA PRESERVAÇÃO E VALORIZAÇÃO DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO, ARTÍSTICO E CULTURAL DO RIO GRANDE DO NORTE COMO PRERROGATIVA DO ARQUITETO E URBANISTA.
O Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Rio Grande do Norte – CAU/RN, por meio da Comissão de Política Urbana e Ambiental – CEPUA-CAU/RN, juntamente com o Instituto de Arquitetos do Brasil, Departamento do Rio Grande do Norte – IAB/RN, e o Sindicato de Arquitetos e Urbanistas no Estado do Rio Grande do Norte – SINARQ/RN, vêm a público externar seu repúdio, diante do posicionamento do Conselho Estadual de Cultura do Rio Grande do Norte que, na reunião ocorrida em 02.07.2019, ignorou documentação elaborada por arquitetos e urbanistas da Universidade Federal do Rio Grande do Norte –UFRN, professores e pesquisadores com reconhecimento nacional da área de Teoria e História da Arquitetura e do Urbanismo, que, no âmbito de suas atribuições profissionais, produziram parecer técnico fundamentado sobre os elementos característicos da arquitetura modernista, presentes no Hotel Internacional dos Reis Magos (HIRM), que possibilitariam o seu reconhecimento como bem representativo da arquitetura moderna brasileira.
A Lei Federal n° 12.378/2010 que regulamenta o exercício da arquitetura e urbanismo no Brasil e a Resolução n° 21/2012 do CAU/BR, que dispõe sobre as atividades e atribuições profissionais do arquiteto e urbanista, enumeram as atividades e campos de atuação relacionados ao patrimônio como parte das atribuições profissionais do arquiteto e urbanista – tanto no âmbito das práticas de projeto, como em atividades de pesquisa, ensino, extensão, perícias, e a produção de laudos e pareceres técnicos.
As atribuições também estão descritas na Resolução n° 51/2013 do CAU/BR como áreas de atuação privativas dos arquitetos e urbanistas, na seara do patrimônio histórico, cultural e artístico. A Norma ressalta a importância dessa diferenciação, pois várias atividades técnicas delegadas aos arquitetos e urbanistas são indevidamente exercidas por profissionais de outras áreas, sem a devida formação acadêmica que os credencie para tal.
Portanto, no exercício da profissão, cabe ao arquiteto e urbanista reconhecer, respeitar e defender as realizações arquitetônicas e urbanísticas como parte do patrimônio socioambiental e cultural, estando apto, inclusive, a contribuir para o aprimoramento e preservação deste patrimônio. (Resolução n° 52/2013 do CAU/BR)
Os normativos que regem a profissão reforçam ser o arquiteto e urbanista detentor da formação técnica com competência à condução desses processos. Ignorar a fundamentação técnica dos arquitetos e urbanistas representa risco à conservação da história da arte e da arquitetura, e coloca o Estado do RN na contramão do que se pratica como turismo nacional e internacional consciente e defensor da preservação e valorização da memória arquitetônica de seu povo.
Pelo exposto, as Instituições signatárias desta Nota repudiam quaisquer afirmações veiculadas na sociedade que desrespeitem o intenso trabalho realizado por arquitetos e urbanistas que atestam e subscrevem pareceres técnicos a respeito do conjunto das características de obras arquitetônicas e/ou urbanísticas, como no caso do prédio Hotel Internacional dos Reis Magos.
Vêm, ainda, pugnar por mais abrangente reflexão por parte do público e das autoridades competentes a respeito da preservação e valorização das realizações arquitetônicas, que leve em conta a proteção e priorização do patrimônio histórico, artístico e cultural, considerando direitos a serem respeitados pela condição especial que ostentam.
E, tão importante quanto, defender as prerrogativas gerais do arquiteto e urbanista que no exercício da profissão praticam ações com o objetivo de garantir a integridade e perenidade de patrimônio edificado ou natural, por deter,por formação, um conjunto sistematizado de conhecimentos das artes, das ciências e das técnicas, e das teorias e práticas específicas da Arquitetura e Urbanismo, compromisso assumido não apenas perante a sociedade, mas também perante a própria comunidade profissional.
Do editor: Com o respeito merecido às entidades e, principalmente, ao papel fundamental do arquiteto e urbanista na preservação do patrimônio material, mas a Nota me pareceu vazia. Essa questão da manutenção do Hotel Reis Magos vai além da confirmação do valor histórico e arquitetônico. É legítimo o repúdio. Mas qual a solução? Basta não implodir? O proprietário abandonou o prédio por quase 25 anos, inclusive com destruição de obras de arte de artistas potiguares, sem nenhum levante a respeito.
O que pode ser feito dele se o próprio dono luta para impedir, por força judicial, a preservação e requalificação do prédio? E assim o lugar se arrasta como retrato de abandono da nossa orla, do nosso turismo e oferecendo riscos de saúde à comunidade do entorno. E sem mais detalhes, há muitos interesses escusos, de cunho político, nesse imbróglio! Louvo o interesse das entidades da arquitetura locais. Isso mostra um olhar cuidadoso, atento, vigilante. Mas para concluir com uma expressão rasteira, “o buraco é mais embaixo”.
Acreditamos que boa parte dos moradores do bairro Potengi, na Zona Norte de Natal, quando passam pela Avenida Governador Antônio de Melo e Souza não tenham conhecimento da imensa contribuição que esse homem deu para a política e a literatura do Estado. Pensamos dessa maneira, pois é evidente tanto no meio político como no cultural o descaso com que é tratada a memória desse grande brasileiro que foi também sinônimo de honestidade no serviço público, algo raríssimo na conjuntura atual.
Antônio de Souza, como era conhecido, foi um intelectual de primeira linha, possuía uma das maiores bibliotecas do Rio Grande do Norte, lia em francês e outras línguas. Começou sua brilhante carreira ainda moço, como jornalista, usando o pseudônimo Polycarpo Feitosa, que iria marcar toda a sua trajetória literária.
Antônio José de Melo e Souza nasceu em 24 de dezembro de 1867 no Vale do Capió, antiga Vila Imperial de Papari, hoje chamada Nísia Floresta. Estudou em vários colégios recifenses, inclusive o Ginásio Pernambucano, e formou-se em Ciências Jurídicas e Sociais pela Faculdade de Direito do Recife, em 1889.
Foi, por duas vezes, governador do Rio Grande do Norte, senador e procurador do Estado, durante a República Velha. No seu segundo mandato como Governador criou a Escola Normal de Mossoró; a Faculdade de Farmácia de Natal (Lei nº 498, de 02 de dezembro de 1920), a Diretoria Geral de Agricultura e Obras Públicas e o Instituto de Proteção e Assistência à infância, atual Hospital Infantil Varela Santiago.
Houve durante a sua administração, um enorme crescimento do acesso das mulheres à educação, que passaram a frequentar a escola na mesma proporção que os homens. Diversos cursos eram oferecidos, nos quais as mulheres aprendiam, inclusive, bordado, crochê, corte e costura, numa época em que as habilidades domésticas eram valorizadas pela sociedade.
No início de sua carreira, Antônio de Souza era redator do jornal A República e já participava da vida cultural; fundador do Grêmio Polimático, sócio fundador do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte e também fundador da Revista do Instituto. Nomeado Promotor Público da Comarca de Goianinha (RN), e aí permaneceu de 1890 a 1892.
Sempre atuante no meio literário da capital, escrevia para jornais, fazendo resenhas, editando periódicos literários, ao lado de outros grandes nomes da época, como Henrique Castriciano. Todavia só começou a publicar livros, na maturidade. No auge da sua carreira literária, foi incluso na antologia “Panorama do Conto Brasileiro” de R. Magalhães Júnior.
Como intelectual, além de jornalista, foi também poeta, memorialista, contista, e destacou-se sobretudo como romancista. Escreveu, Flor do sertão (1929), Gizinha (1930), Alma bravia (1934), Os Moluscos (1938), e Gente Arrancada (1941), romances; Jornal de Vila (poesia), Encontros do Caminho (contos) e Dois Recifes (memórias).
Seu único romance reeditado, Gizinha, foi relançado ainda na gestão do governador Aluízio Alves, em 1965. Narrativa ficcional que se passa na década de 1920, representou, aqui no Estado, um avanço para as mulheres na sociedade com suas lutas e conquistas: mais acesso ao ensino, através da implantação de novas escolas, conquistas dos diretos políticos e civis. Gizinha, expressa muito dessas mudanças no comportamento feminino para a época.
Adalgiza, nome abreviado de Gizinha, era uma espécie de melindrosa, uma transgressora, com atitudes modernas para seu tempo, seus modos ousados chocavam a sociedade natalense. No entanto, ela acaba seguindo os padrões sociais e abdicando dos seus desejos. Casa-se e percebe que o seu casamento não era o que ela esperava, decepcionando-se com o marido, mas aceitando essa situação.
Gizinha chegou a ter uma terceira edição, em formato de bolso, publicada em 2005, pela AS Editores.
Curiosamente Antonio de Souza, só estreou em livro aos 61 anos, com Flor do Sertão (1928).
Na obra O Tempo e eu (1968) Câmara Cascudo dedicou uma crônica à figura de Antônio de Souza, descrevendo-o como uma pessoa sisuda: “Alto, pálido, carnadura sólida, os cristais dos óculos aguçando o olhar penetrante e míope, quase surdo, arredio, alheado a qualquer vínculo social, amando a solidão, as leituras intermináveis, desconfiando do desinteresse humano, inimigo de cerimônias oficiais…”
Em outro trecho, Cascudo continua a descrever Antônio de Souza, como resistente às mudanças que vinham ocorrendo na cidade do Natal: “Era, naturalmente, cheio de idiossincrasias, restrições, antipatias. Implicava com as danças modernas daquele tempo, ragtime, two-steps, tango argentino”.
Além dos cargos mencionados, que ocupou com honradez e competência, Antônio de Souza, já no período pós-Revolução de 30, atuou como substituto do Interventor, por diversas vezes. Aposentou-se em 1935, nas funções de Consultor Jurídico do Estado. Faleceu, praticamente anônimo e solitário na cidade do Recife no dia 05 de julho de 1955.
Em 2016, o escritor Manoel Onofre Júnior, em edição do Selo Caravela Cultural e a 8 Editora, publicou ensaio, dentro da Coleção Presença, Polycarpo Feitosa – O Excêntrico Dr. Souza, espécie de livro de bolso que resume um tanto da vida e obra desse ilustre potiguar. E pelo que nos parece não foi suficiente ainda, até o momento, para que os potiguares redescubram Antônio de Souza ou Polycarpo Feitosa, um brasileiro esquecido.
O livro “Memórias do Jornalismo no Rio Grande do Norte” acaba de ser publicado em versão digital pela Caravela Selo Cultural, integrando o projeto Natal 420 anos. Organizada pelos pesquisadores Gustavo Sobral e Juliana Bulhões, a obra é a concretização de uma pesquisa iniciada em 2016.
O ebook reúne depoimentos de jornalistas que atuaram nos anos 1960 e 1970 em veículos do estado, a maioria ex-professores do Departamento de Comunicação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
No livro, constam: Fiz do jornalismo o meu sacerdócio, João Batista Machado; Me tornei jornalista por acaso, Cassiano Arruda Câmara; Trabalhar em jornal era uma pedreira, Albimar Furtado; O jornal era minha vida, meu encanto, meu ganha-pão, Vicente Serejo; Agradeço ao jornalismo tudo o que conquistei, Ana Maria Cocentino; e Posfácio de Emanoel Barreto.
O cinema Rex, situado no espaço, à Av. Rio Branco, onde hoje estão as lojas Insinuante e Express, teve uma bonita história na vida cultural de Natal. Idealizado e concretizado por Enéas Reis e Francisco Nogueira do Couto (Xixico, conhecido capitalista nos anos 30), ficou como mais um cinema da empresa Rex, administradora também dos cinemas Rival (na Ribeira), Royal Cinema (na Rua Ulisses Caldas) e cinema São Pedro (no bairro do Alecrim).
Cinema Rex
O Rex seria o primeiro cinema no Grande Ponto, ao lado do prédio da representação da Cruz Vermelha na cidade. Sua planta foi traçada pelo arquiteto Heitor Maia Filho e a construção do prédio esteve sob a direção do engenheiro Omar O`Grady, que já havia sido prefeito de Natal, criando o seu primeiro Plano Geral de Sistematização.
O novo cinema foi inaugurado a 18 de julho de 1936 com o divertimento musical “Melodias da Broadway de 1936”, produção da Metro Goldwyn Mayer, enviada pela referida companhia, por via aérea, especialmente para a inauguração da nova casa de espetáculos cinematográficos de Natal.
Na tela do Rex, depois, foram mostradas muitas obras-primas da Sétima Arte. Vejamos algumas, ou que pelo menos se aproximam desta categoria, e que marcaram a década 60 do espectador natalense no século passado com visuais e timbres qualitativos inesquecíveis, além do humanismo dos enredos.
Lembre-se, por exemplo, Um Rosto na Noite, filme com o qual, em 1957, o diretor italiano Luchino Visconti antecipou-se a Antonioni e sua trilogia famosa (“A Aventura”, “A Noite” e “O Eclipse”), com o enfoque preciso de um fotógrafo sensível (como o Giuseppe Rotunno deste filme), na beleza estética de um preto-e-branco a comunicar o trágico sentimento de seres solitários. O filme estava em cartaz no Rex a 01 de maio de 1960.
Um ano depois, precisamente a 11 de maio de 1961, o velho cinema trintenário dava de presente ao nosso espectador a magia do filme de marionetes Velhas Lendas Tchecas. Realizado em 1953 pelo mestre Jiri Trnka, consegue, com a linguagem de um verdadeiro cine-balé, iluminar de forma bem criativa a história e o folclore de um povo, os filhos da Tchecoslováquia.
Seguiu-se, em 1962, a exibição da grande obra-prima da nouvelle vague, o filme que às vezes lidera listas dos melhores filmes de todos os tempos (como aconteceu na escolha da crítica cinematográfica, que em março/abril de 1980, pôs em primeiro lugar para o suplemento cultural “Contexto”, do jornal “A República”, o referido filme): Hiroshima, Meu Amor, realização de 1959 de Alain Resnais, e que estava em cartaz no Rex a 06 de maio de 1962, trazendo uma revolução de linguagem (planos-sequência, imagens trabalhadas em laboratório, junção de cenas em incríveis visualizações de flashes de ao mesmo tempo memória e esquecimento, documentários crus dos efeitos da bomba atômica sobre o cenário urbano e sobre as pessoas) para formar um novo tipo de espectador.
Quando o Cine Clube Tirol criou as sessões do Cinema de Arte, escolheu o Rex para nele serem exibidos os filmes, começando com o ótimo Glória Feita de Sangue, do diretor Stanley Kubrick, de 1957 e em sessão de 16 de fevereiro de 1963. É uma forte denúncia do carreirismo dos oficiais superiores durante a Primeira Guerra Mundial, que não se pejam de contribuirem para o massacre dos seus soldados, contanto que a honra deles, oficiais, não seja atingida.
Na sequência, o cinema Rex mostrou outro ótimo filme, de autoria não de um norte-americano mas de um brasileiro, um dos criadores do movimento cinema novo. Trata-se de Deus e o Diabo na Terra do Sol, de 1959, de Glauber Rocha, de teor revolucionário (em tema e linguagem), visto em sessão de 04 de outubro de 1964. E a 28 de abril de 1965, sendo exibido El Cid, bem realizado épico histórico, por Anthony Mann, em 1961.
Vieram, em seguida, a ser apresentados no Rex, obras-primas inesquecíveis: Os Reis do Iê-Iê-Iê, de 1964, de Richard Lester, exibido a 26 de janeiro de 1966; Sempre aos Domingos, de 1962, de Serge Bourguignon, exibido a 18 de julho de 1967; O Eclipse, de 1962, de Michelangelo Antonioni, exibido a 03 de março de 1968; e O Fofoqueiro, de 1967, de Jerry Lewis, exibido a 18 de outubro de 1969.
O cinema Rex fechou as portas após a sua última sessão, que foi na noite de 30 de julho de 1984, exibindo o filme A Morte em Minhas Mãos, feito em Hong Kong pela dupla de irmãos Rumne e Run-Run, da Show Brothers Company, sem um mínimo de qualidade, ao contrário do que se pode deslumbrar em outro filme de caratê, O Tigre e o Dragão, do consagrado diretor Ang Lee.
1 – Quando eu era repórter do jornal Tribuna do Norte, de Natal, fui entrevistar Câmara Cascudo por motivo da indicação do seu nome para compor o Conselho Federal de Cultura. Da conversa com o escritor, que se estendeu sobre vários assuntos, resultou ampla reportagem de página inteira. A certa altura, Cascudo disse haver terminado de escrever um livro – “Motivos de Espanha” – sobre a presença espanhola na vida cultural do Brasil. Esse livro não foi publicado. Que fim levou?
2 – Pesquisando coleções de velhos jornais e revistas, o escritor Thiago Gonzaga nos forneceu cópia de uma que encontrou no jornal A Ordem, de Natal, a seguinte nota:
GRAÇAS
Zila Mamede agradece a N.
S. do P. Socorro, uma graça
alcançada, com promessa de publicar.
Natal, 28 de fevereiro de 1945
Eis aí um dado interessante para a biografia da poeta – sua religiosidade. Aspecto este, aliás, que não se acha de modo explícito em sua obra. Zila – vale notar – tinha, então, 17 anos de idade.
No mesmo jornal, edição de 15-03-1956, consta a seguinte notícia:
“Quase Lua” é o título de um novo livro da poetisa Zila Mamede, o qual será lançado pelo Departamento de Cultura do Ministério da Educação.”
Ao que tudo indica, teria sido este o título provisório do livro “Salinas”, editado em 1958.
3 – Quando escrevia o seu trabalho bibliográfico sobre a obra de João Cabral de Melo Neto, Zila disse que o mesmo iria denominar-se “Um Poeta Só João” (alusão ao poema “Uma Faca só Lâmina”, de João Cabral), depois mudou o título para “Civil Geometria”.
4 – Certa vez, perguntei a Zila qual era “o amigo morto” a quem está dedicado o poema “0 Galo (do Convento Santo Antônio)”, no livro “Exercício da Palavra”. Em resposta, ela escreveu do próprio punho à margem de uma página dos originais do meu livro “Guia Poético da Cidade do Natal”:
“Manoel Onofre: este poema é dedicado a Djalma Maranhão, mas quando foi publicado a primeira vez, no jornal, tiraram o nome de Djalma. Não deixei que publicassem. Pelo menos fica isso aqui registrado para a história. E nos livros não incluí mais o nome dele, para não ser retirado novamente. Esta história é meio trágica, não? Assim, você fica sabendo. Não é possível que na próxima edição o nome de Djalma não apareça.
Natal, 20 de Junho de 1983.”
Djalma Maranhão, político de esquerda, Prefeito de Natal, que fora preso pelo sistema repressivo a serviço da ditadura militar, falecera no Uruguai, onde se exilara. Foi Djalma Maranhão quem adotou o galo de bronze da torre de Santo Antônio como símbolo da cidade do Natal, por sugestão de Câmara Cascudo. Dedicando-lhe o poema, Zila Mamede caiu nas malhas da censura política, então vigente. A ditadura afiava suas garras.
5 – Em suas pesquisas, Thiago Gonzaga descobriu, na prestigiosa revista “Careta”, do Rio de Janeiro (1960), a coluna “Contos e Pontos”, do escritor natalense Umberto Peregrino, na qual consta a seguinte nota:
“Quarenta mil livros estão apodrecendo em Natal – denuncia a jornalista Zila Mamede, em reportagem publicada no jornal O Poti, daquela capital”.
Refere-se a nota à biblioteca do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte, cujo Presidente, Nestor Lima, é responsabilizado pelo estado em que a mesma se encontrava.
Na mesma coluna, entre outras pequenas notas, consta que “a poetisa do Arado, Zila Mamede, está escrevendo um romance.”
Esse romance, se realmente existiu, nunca foi publicado. Zila Mamede não deixou obra em prosa, exceto dois trabalhos bibliográficos.
6 – Quando organizou a antologia “Contistas Norte-rio-grandenses” (1966), Nei Leandro de Castro incluiu nela o conto “A Primeira Feira de José “, de minha autoria, mas recomendou-me que acrescentasse, num dos diálogos, a expressão “Bote a saideira, Seu Tonho”. Aceitei a sugestão do antologista, escritor e poeta renomado.
Republicando esse conto, em um volume (1973), sob o mesmo titulo, resolvi suprimir o acréscimo sugerido por Nei Leandro. Algum tempo depois, qual não foi a minha surpresa, quando, ao folhear o Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, deparei-me com o verbete “saideira”, nos seguintes termos:” (8-i) (De sair – deira). S. f. Bras. Gir. 0 Último (13) “conversavam demais, cuspiam no chão e terminavam por solicitar: -Bote a saideira, Seu Tonho” ( M. Onofre Júnior, em Nei Leandro de Castro, Contistas Norte-rio-grandenses, p. 65).”
É claro que fiquei muito ancho, feliz da vida, por abonar para o famoso dicionário brasileiro (graças a Nei Leandro) aquela palavra.
Na terceira edição do meu livro “Chão do Simples” (2014), em que incluí o conto “A Primeira Feira de José”, restabeleci o diálogo, com a palavra “saideira”.
A titulo de curiosidade, registre-se que diversos outros escritores norte-rio-grandenses abonaram palavras, com a citação de trechos de suas obras no Aurélio: portanto, constam na bibliografia do livro. São eles: Câmara Cascudo, Jaime Adour da Câmara, Homero Homem, Hélio Galvão, Polycarpo Feitosa, Oswaldo Lamartine de Faria, Tobias Monteiro, Newton Navarro, Umberto Peregrino, Renard Perez, Peregrino Júnior, Manoel Rodrigues de Melo e o próprio Nei Leandro de Castro.
Dentre os escritores célebres, clássicos lusófonos, os mais citados são Machado de Assis e Camilo Castelo Branco, seguidos de Carlos Drummond de Andrade, Aquilino Ribeiro, Eça de Queiroz, Antonio Feliciano de Castilho, José Lins do Rego, etc.
7- “Crônica da Minha Cidade Natal”, livro de memórias de Umberto Peregrino teve o seu título mudado para “Crônica de Uma Cidade Chamada Natal”, por sugestão do editor Carlos Lima, que o lançou em 1989. A obra de alta qualidade, deveria estar na estante de todo bom natalense.
8- Em 1936, o Jornal do Commércio, do Rio de Janeiro, publicou reportagens sob o titulo “Instalou-se ontem a Academia Norte-rio-grandense de Letras“, na qual relaciona 20 acadêmicos fundadores da instituição, entre estes Câmara Cascudo, cujo patrono figura como sendo Augusto Severo (Cascudo, depois, o substituiu por Luís Fernandes).
Acrescenta a matéria:
“Para as cinco restantes cadeiras os acadêmicos serão eleitos dentre os srs. Adauto Câmara, Eloy de Souza, Januário Cicco, José Augusto, Nestor Lima, Rodolfo Garcia, Matias Maciel Filho, Tobias Monteiro, Valdemar de Almeida e Tavares de Lyra”.
Sabe-se no entanto, que cinco desses nomes, aliás, dos mais ilustres, não foram eleitos: Eloy de Souza, José Augusto, Rodolfo Garcia, Tobias Monteiro e Tavares de Lyra. Por quê? Não se sabe. José Augusto veio a ser eleito, anos depois, quando se aumentou para trinta o número de cadeiras, em 1943. E Eloy de Souza elegeu-se em 1949, sucedendo a Antônio Pinto de Medeiros.
9- Com referência aos acadêmicos fundadores da ANRL, causa estranheza a ausência, entre eles, de Polycarpo Feitosa (pseudônimo de Antonio de Souza), que, à época da fundação da entidade já se tornara escritor consagrado.
10- Quatro membros da ANRL renunciaram à imortalidade em diferentes ocasiões – Antônio Pinto de Medeiros, Othoniel Menezes, Esmeraldo Siqueira e Umberto Peregrino – mas somente o primeiro teve o seu pedido de desligamento aceito pela instituição.
11- Quando toma posse na Academia, o novel acadêmico profere, da tribuna da casa, o elogio de praxe aos acadêmicos que o antecederam na cadeira. Alguns discursos estendem-se, prolixos, outros são lacônicos. Todos se publicam na Revista da Academia. Bateram recordes: o de Ernani Rosado, por ser mais longo (44 páginas), e o de Jarbas Martins, o mais curto (2 páginas).
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