Neste mês marcado pela luta de mulheres, foi apresentado, na Câmara Municipal de Natal, o Projeto de Lei nº 34/2020, que garante isonomia na concessão de premiações em competições financiadas pela administração pública. Se aprovada, a legislação se aplicará a eventos esportivos, culturais e artísticos, organizados direta ou indiretamente por órgãos públicos do município, e que disponham de categorias iguais ou análogas entre homens e mulheres.
A iniciativa, da vereadora Júlia Arruda, foi motivada por diversos relatos, sobretudo no âmbito esportivo, de desigualdades em premiações e nas condições de trabalho entre homens e mulheres. Pesquisa da BBC apontou que em 30% das principais competições esportivas mundiais, as vencedoras de modalidades femininas recebem menos dinheiro do que os atletas homens.
“O sexismo segue sendo o maior adversário das mulheres, seja nos campos, nas quadras ou fora deles. Porque a desigualdade de gênero é algo que transpassa todas as esferas da sociedade, inclusive no meio artístico e cultural. E o nosso papel na Câmara é criar legislações que revertam essa situação e garantam igualdade de condições”, comenta a vereadora.
O PL nº 34/2020 está tramitando nas comissões técnicas da Câmara Municipal de Natal e deve ir a plenário ainda neste mês de março.
Passando o carnaval é hora de respirar homenagens. E o Sarau Insurgências Poéticas retoma suas atividades a todo vapor no mês onde se celebra três dias importantes: o da mulher (que também é todos os dias), o da poesia e do teatro.
O Sarau preparou uma programação extensa para celebrar seustrês anos e, para começar nessa sexta-feira, em parceria com a Sociedade dos Amigos do Beco da Lama e Adjacências (Samba), tem o Insurgências Poéticas – especial Mulheres, no Beco da Lama.
A edição, além de ser um juntêro celebrativo de importantes mulheres do RN é, também, um espaço de reflexão sobre representatividade.
A edição com poesia, dança, música, diálogos e feira criativa começa às 15 horas dessa sexta, 08 de março, seguindo até às 22 horas.
#Poesia – Gessyka Santos, Luara Carvalho, Marina Rabelo e Renata Marques;
#Dança – Rozeane Oliveira;
#Música – Discotecagem de Carla Nogueira e show da banda Luaz;
#FeiraCriativa/Bazar – Insurgências Poéticas, Estúdio Carlota, Brena Marinho;
#Diálogo “Representatividade” na política: Divaneide Basílio. Na poesia: Priscilla Rosa. No jornalismo: Luiza Mendes. No empreendedorismo: Carla Nogueira. Na produção cultural: Renata Marques. Na SAMBA: Hortência Carvalho.
Sarau Insurgências Poéticas – Especial Mulheres, sexta 08 de março de 2019, 15 às 22 horas, no Beco da Lama, evento colaborativo.
Por muito tempo, e ainda hoje em alguns contextos, as mulheres estiveram condicionadas ao espaço privado, enquanto os homens sempre dominaram o espaço público. Mesmo com os avanços, ainda é mais difícil para nós o acesso aos meios de produção cultural e aos espaços para exibição de nossas manifestações artísticas. Apesar das dificuldades, sempre existiram mulheres que buscaram romper com essa tradição machista, ocupando todos os espaços possíveis e fomentando cultura, seja nos palcos ou na técnica dos bastidores. No RN não nos faltam exemplos de grandes mulheres que fazem acontecer na cena cultural potiguar.
Jammily Mendonça, produtora e cantora, nos falou sobre os desafios e tabus que precisou enfrentar por ser mulher no mundo das artes. Formada em produção cultural afirma: “Até hoje sofro muito preconceito quando chego e opino sobre som. Quando chego em um local e perguntam ‘oi moça, cadê o rapaz do som?’ respondo ‘pode ser a moça do som?’. As vezes chego em lojas de som e os vendedores ficam surpresos quando eu falo com eles de igual para igual sobre os termos técnicos dos aparelhos. O mais importante é a gente estudar, se qualificar e desistir jamais. Nós mulheres devemos nos fortalecer. Incentivar umas às outras! E ganhar cada dia mais espaço”.
A cantora Khrystal complementa: “tirando o posto de cantoras, é difícil encontrar mulheres como técnicas de som, musicistas, produtoras. Eu sinto falta. Acho que espaço para mulheres tem de ser conquistado por elas mesmas”. Coloca a importância de políticas culturais por entender que um povo sem cultura se enfraquece, mas esclarece que é o movimento das próprias mulheres que alimenta sua participação na vida cultural, chegando uma hora em que a sociedade assimila. Lembra, ainda, que há muitas mulheres já reconhecidas nos palcos potiguares, desde Glorinha Oliveira à Carol Benigno.
Para Marina Rabelo, poeta e escritora, o espaço para mulheres ainda é um pouco restrito. “Sinto falta de mais espaços para nossa cena artística, mais valorização e mais apoio. Não só para as mulheres, às vezes acho a cena cultural muito desanimadora. Teatros fechados há anos, projetos que não ampliam seus contatos, não procuram saber quem mais está produzindo na cidade, etc. Por outro lado, na literatura estamos vivenciando um bom momento de Saraus alternativos pela cidade. No entanto, nossa sociedade ainda é bastante machista e atrasada. Somos alvos de preconceitos, de acharem que somos menos capazes, etc. No meio literário também há esse tipo de fala que não é nada empática e poética (rs).”
Assim, para além da empatia necessária, é fundamental apoio dos órgãos públicos e das pessoas que trabalham com cultura e, em especial, mais articulação entre as mulheres. É preciso que as mulheres se coloquem e que os curadores de mostras de arte as procurem. Há mulheres incríveis em todas as áreas da cultura e, como nos disse a poeta Marina: “Nós estamos na luta, o caminho às vezes é árduo, mas a vida sem a arte se torna vazia, por isso vamos seguindo para que as mulheres sejam cada vez mais reconhecidas e valorizadas”.
O livro ‘O Espelho de Eloísa: e outras histórias de mulheres sábias’, como o próprio nome diz, reúne histórias de mulheres em situações diversas, narradas pela autora paulista e radicada em Natal, Araceli Sobreira. A noite de lançamento do livro, editado pela CJA Edições, acontece às 18h30 desta quinta-feira, no Temis Clube – Balcão Bar, na sede do América, em Tirol.
‘O Espelho de Eloísa…’ está dividido em duas partes (“Histórias de mulheres sábias” e “Olhares e Paisagens”). Algumas se passam em ambiente mítico, misterioso, a sugerir certa dissonância em relação ao mundo racional. Neste caso, as mulheres (Eloísa, Nuara, e a menina da serra) lembram feiticeiras e demonstram serenidade.
Outros enredos se passam em ambiente doméstico, onde é criado um clima que sugere a recordação de um passado idealizado e perdido, em um presente sofrido, cujo desdobramento é a vida em função do sonho (Zélia; em parte, Joana de “A cura”; em parte Dora, que intitula um dos contos).
Por outro lado, algumas mulheres das narrativas se envolvem com homens sedutores, irresistíveis (Elza e a cigana morena, ambas enredadas no universo fabular do Boto paraense), em encontros fatais.
Diante dessa peculiaridade estrutural e temática, o leitor poderá concluir que tem em mãos dois livros em um só volume, talvez a indicar tendências diversas da escrita de Araceli Sobreira, a cuja biografia recorro para melhor apreender uma bifurcação percebida na leitura dos dois segmentos referidos.
A autora parece ter herdado das famílias cearenses o hábito de ter “ouvidos para ouvir e olhos para ver”, de onde vêm as histórias da primeira parte do livro. Quanto à segunda parte, muito provavelmente são frutos das aprendizagens de uma professora de literatura de olhos míopes e espantados…
Nascida em São Paulo, mas de origem cearense, Araceli mudou-se para o Ceará, em final de 1982, para residir com a família materna, após a perda prematura de sua mãe, Almeri Sobreira. Residiu em Juazeiro do Norte e em Fortaleza, recebendo influência literária por parte de tios – radialistas e jornalistas reconhecidos nessas duas cidades.
Durante o período de faculdade, Araceli produziu muita poesia e contos. Após concluir duas especializações na área da Alfabetização (1991) e na área da Leitura e Produção de Textos (1993), muda-se para Mossoró (RN), ingressando na carreira de docente do Ensino Superior na Faculdade de Letras e Artes da UERN.
Nesse mesmo tempo, dedica-se à escrita de poesias e de contos, dividindo as tarefas de mãe de três meninos, Matheus, Caio e Igor, com a docência, a leitura e o cultivo de flores. Em 2000, muda-se para Parnamirim, cidade vizinha a Natal (RN), para cursar o Mestrado e o Doutorado na UFRN.
Sempre rodeada de livros, a professora Araceli é uma obstinada na tarefa de compartilhar a leitura literária na vida de futuros professores do Ensino Básico. Ao mesmo tempo que se envolveu com a escrita acadêmica na área da Formação Docente, não abre mão de levar a literatura para a sala de aula de cursos de Licenciaturas onde leciona.
Em 2006, lançou seu primeiro livro e já recebeu premiação em diversos concursos literários. Atualmente, a professora leciona Literatura e Religião no curso de Ciências da Religião, do Campus de Natal da UERN. Araceli Sobreira explora a temática do simbolismo religioso nordestino em seus contos, criando personagens ligadas ao imaginário da mulher sábia. Também explora o cotidiano sertanejo, voltando-se para a natureza, os animais, pelo olhar de seres mitológicos.
O lançamento será no próximo dia 26 de abril (quita-feira):
Livro: O espelho de Eloísa e outras histórias de mulheres sábias
Editora: CJA
Local: Temis Clube – Balcão Bar
Endereço: Av. Rodrigues Alves, 950 – Tirol – Sede do América F.C.
Horário: a partir das 18h30
Preço: R$ 30,00
Ler Charles Bukowski é tomar um porre, no melhor dos sentidos e um prazer, em muitos outros. É um percurso das relações de gozo e frustrações que implicam no contato do homem consigo mesmo, tanto na tentativa de se entender como tal quanto na expectativa de compreender a mulher.
Quando conheci, no final dos anos 70, o fiz acompanhado também de bebidas e drogas. Como no caso de alguém chegar numa festa em que os amigos já se encontram num adiantado estágio de embriaguez e, por mais que se tente ser agradável, fica sempre faltando algo, ou seja, alcançar o nível etílico suficiente para um mínimo de sintonia nos pretensos diálogos.
Assim é reler Bukowski. Na verdade, para se ler Bukowski é preciso ser um iniciado. Hoje, quase quarenta anos depois, apesar das poucas cervejas e nenhuma droga, o faço muito mais embriagado pelo poder desnorteante e desmoralizador de sua escrita: a literatura que se basta pela capacidade de dizer – sem maneirismos – a partir de si mesma, como uma poética da existência, onde a mundidade (não confundir com mundaneidade) se revela contra a razão.
O livro é uma narração no mais puro e simples estilo da vida amorosa, alcoólica e sentimental de Bukowski. Como uma espécie de crítica da razão puta, uma razão puta com a lógica da hipocrisia e da mediocridade, Bukowski escreve por espasmos, como se possuído pelo que há de mais necessário e cru na angústia.
Apesar de nascido na Alemanha, filho de soldado americano com uma jovem alemã, aos 3 anos de idade foi levado para os EUA, Bukowski é considerado o último escritor norte-americano “maldito”. Um tipo de anti-herói, alcoólatra de misantropo, de certa forma, uma espécie de beat honorário, considerando seu parentesco com o movimento, mesmo sem ter se associado a nenhum dos autores beatniks.
Dentre os personagens citados ou que transitam no romance, figuram seus contemporâneos como Bob Dylan, Willian Burroughs, John Fante, Céline, Hemingway, Gable, Cagney, Bogart, Errol Flynn, Catherine Deneuve, Judy Garland, Randy Newman e outros.
A obra também está repleta de personagens fictícios ou pseudônimos simbolizando alguns dos mitos que impregnaram o espírito de comportamento da época, como é o caso de Tanya, que ele compara com Betty Boop, personagem dos desenhos animados considerada a rainha dos desenhos animados da década de 1930, bem como, a alusão que faz ao modismo místico da classe média, através de Drayer Baba, um cara que nasceu na Índia e morreu em 1971, dizendo que era deus.
Estou falando de Mulheres, romance de 1978, das aventuras de Henry Chinaski que, além de protagonista de outras quatro obras e pequenos textos e poemas, é uma espécie de alterego de Bukowski. É a história de um escritor velho que vive em ambientes undergrounds e que, apesar de ter se tornado famoso, continua com seu estigma de perdedor, vivendo entre uma bebedeira e outra e se divertindo com diversas mulheres.
Este personagem, assim como o próprio Bukowski, é um escritor autobiográfico que cresce pobre, tem casos com diveresas mulheres bem jovens e – apesar de odiar – durante muitos anos trabalhou nos correios. E por falar em mulher, conforme Henry Chinaski, por causa dela “muito cara legal foi parar debaixo da ponte”.
Num dado momento, uma de suas amantes lhe pergunta: “quer dizer que você só vive para escrever depois?”. Ao que ele responde: “não, eu só existo. Daí, mais tarde, eu tento me lembrar de umas coisas e coloco-as no papel”.
Milan Kundera, em ‘A insustentável leveza do ser’, define dois tipos de amantes: o romântico e o épico. O romântico como aquele que nunca se realiza por acreditar na existência da mulher ideal e que, por mais que tenha experiência com diversas mulheres, nunca a encontra e, o épico, como aquele que sabe sentir prazer na particularidade, ou seja, naquilo que cada uma tem de diferente das outras.
Henry Chinaski não é um nem outro, ou é um e outro ao mesmo tempo. Nisso, numa espécie de ciranda entre Eros e Tanatos, ele mesmo se confessa confundido entre a crueldade de Marquês de Sade, sem o seu gênio. Ao mesmo tempo, seduzido pelo mito de Don Juan, reproduz o comportamento de Casanova, de Fellini, apaixonado pelo manequim de uma loja.
Num certo sentido, creio que Chinaski é mais fiel ao conselho daquele anjo de A última tentação de Cristo, de Nikos Kazantizakis, afirmando que na vida do homem só existe uma mulher e que, nesta mulher, o que muda é a cara e o nome. Em Mulheres, esta “mulher” se apresenta com o nome de Lydia, April, Dee Dee, Lilly, Mindy, Hilda, Cassie, Sara, Valerie, Tanya e tantas outras.
Por mais que, para muitos, a obra possa parecer uma história de sexo e bebedeiras, para Bukowski, na verdade, Mulheres, é um poema sobre o amor e a dor.
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