O flipAut! – festival literário alternativo de Pipa – comemorou em 2019 dez anos de existência, colecionando dez edições consecutivas, desde 2010. Nos últimos quatro anos, firmamos a data de realização do evento no começo do mês de dezembro, assim como tinha sido também já em 2013.
Neste ano de 2020, quando a pandemia chegou ao Brasil, embora não tivéssemos alguma certeza, nos reservamos no calendário cultural de Tibau do Sul uma data no período habitual, quer dizer da quinta-feira 3 ao domingo 6 de dezembro. Isso na esperança otimista que a pandemia fosse durar menos de quanto, de fato, está durando.
Com o passar dos meses, ficou decretada claramente a proibição de realizar na praça pública eventos culturais que possam gerar aglomeração e eventualmente o contágio.
O coletivo de produção cultural do flipAut! se reuniu virtualmente mais de uma vez. Examinamos a possibilidade de realizar um evento “híbrido” e até um “adaptado”, planejado e produzido em poucas semanas para dar tempo ao tempo e ver uma melhora na situação geral.
Desde o começo, ficou bem claro para todos nós que a realização do festival literário estaria diretamente condicionada à execução da feira de livros na Praça do Pescador; a feira de livros novos e usados que, desde 2013, é peça fundamental no calendário do evento.
Assim, após muita reflexão, após ter examinado a questão atentamente, não sem uma dorzinha no coração, foi nestes dias mesmos que decidimos acatar plenamente as recomendações sanitárias e não arriscar-nos minimamente, adiando a 11ª edição do flipAut! para uma data que quanto mais antes divulgaremos ao público.
Mas a galera do flipAut! não ficou nem vai ficar de braços cruzados e estamos com uma bela surpresa no forno! Trabalhamos nos últimos meses à edição do livro “10 Anos de flipAut – Uma Década de Resistência Cultural!” que pretendemos lançar quanto mais antes. Fique ligado em nossas redes sociais e reserve já sua cópia pelo e-mail flipaut@yahoo.com.br
Um forte abraço a todas e todos!
Sempre gostei de anotar fatos importantes e informações úteis em meus caderninhos.
Hoje, ao acordar, recebi uma mensagem do meu velho amigo Jorge, preocupado comigo porque tinha assistido na TV sobre a forte chuva de ontem em Mossoró; mais de 100 mm/m² de chuva, que causaram certo estrago na cidade.
Tranquilizado Jorge (aqui ontem choveu só 2,5 mm/m²), fui conferir em meus caderninhos as maiores chuvas no Sítio Araras*, ao longo dos anos que estou registrando isso.
Desde outubro de 2015, quando comecei a anotar sistematicamente cada chuva, as maiores precipitações foram registradas nesses dias:
10 mar 2017 ………….. 76 mm/m²
20 jul 2017 …………….. 72 mm/m²
1º mar 2017 …………… 70 mm/m²
16 abr 2018 …………… 70 mm/m²
Folheando os caderninhos, as memórias voltam à tona. Essa chuva gigante em julho de 2017 foi absolutamente inesperada, pela época e tamanho. Eu estava acampado com Cabeça, a cadela que me acompanha nessas peripécias, pouco distante da ponte de Alto do Rodrigues/RN, última noite de uma aventura de seis dias em canoa.
À tarde já tinha dado para ver que ia chover, assim preparei o acampamento para aguentar a chuva. No começo, principiou a cair uma chuvinha normal, mas com o passar do tempo engrossou muito e tive que guardar todo o equipamento, desarmar a rede e aguentar o pior. Com um arroz e batata já cozinhado e um café quente pronto, ficamos, eu e Cabeça, umas duas horas e meia por baixo da lona dobrada apenas por cima da gente; eu sentado no banquinho baixo e Cabeça num pedaço da lona seca, os dois pensando: será que vai parar quando?
Trovejou e relampejou muito, mas não caíram raios nas redondezas do Campo K naquela noite; isso creio que foi graças à pitada de boa sorte que a gente nunca deve esquecer de carregar no bolso, partindo por uma aventura.
Baixou de intensidade, afinal, e deu para voltar ao formato “acampamento de chuva” normal, para passar a noite dormindo ao seco na rede, mas só parou mesmo de chover quando deu as dez da manhã do dia seguinte.
Quando, nesse mesmo dia, terminada a aventura voltamos em casa, encontrei o registro da chuva no pluviômetro do quintal e me dei conta do tamanho da chuvarada que a gente aguentou lá no mato, à beira do rio. rss
* Sítio Araras é a vila de pescadores, no município de Itajá/RN, na qual moro desde outubro de 2015. Comprei minha casinha em junho de 2008, a utilizei por anos como base de partida para minhas aventuras em canoa e, em 2015, me mudei pra cá de vez.
Hoje acordei com o meu joelho direito doendo um pouco. Deve ser a chuva, que diz que vem e não vem, deve ser a idade, também… Contudo, eu acredito que o dito-cujo fique doendo mais quando estou sentado que quando estou fazendo coisas, pedalando, andando etc.
Assim, como hoje não fosse preciso ir na rua nem para comprar o coentro (rss), peguei a bicicleta e fui dar uma pedalada até o sangradouro da Barragem ARG.
Como disse outro dia, o sertão está começando a mudar de cor, depois das chuvas de janeiro e fevereiro, mas não está todo verde ainda.
Já desde o dia daquela chuva boa, que rolou duas semanas atrás, eu tinha ficado com vontade de ir tomar um banho no “secret point”. Passaram-se os dias; choveu de novo, outra chuva boa, anteontem. E hoje fui.
Antônio, pescador do Sítio Araras, chama o meu “secret point” de “Lagoa das Piabas Magras”. Trata-se de uma lagoazinha que se forma, às escondidas, entre os maciços de pedra que do sangradouro descem até o vale. Quando chove muito, se forma uma pequena queda de água bem bonita, que abastece a lagoa.
O local é muito pouco frequentado porque o acesso não é fácil e de consequência não é muito conhecido entre os moradores da região. A primeira coisa que se nota, à causa disso, é a falta de qualquer tipo de lixo. Isso pode parecer nonada, mas pelo meu ponto de vista é um parâmetro importante para uma apreciação prazerosa da beleza natural de um local meio afastado.
Estivemos pela primeira vez no “secret point” em 2013, com Mateus e Marina Luna, ainda pirralhos; em canoa, até o sangradouro e depois a trilha a pé. Tem um videozinho na net.
Com a bicicleta, eu consigo chegar pedalando num local pouco distante da lagoa e de lá por uma trilha que tenho já toda na cabeça, desço pulando pelas pedras; dando uma bela volta, de qualquer jeito.
Mas vale a pena. O local é muito bonito, com silêncio total, e o merecido banho refrescante é uma sensação agradável demais.
A volta eu já dou pelo outro lado da lagoa, porque nem sempre por onde sobe-se facilmente consegue-se descer, e vice-versa.
A subida é por um lajedo meio íngreme, que passa por cada pé de xique-xique grande que só, mas rapidamente se chega a uma cerca, seguindo a qual eu alcanço em breve a bicicleta.
…
– E o joelho, seu Jack?
– Ficou bonzinho
Domingo passado, eu coloquei o despertador para as quatro da madrugada; contudo, ainda me levantei um pouco antes disso. Tomei café, comi duas bananas, amarrei a bomba de inflar e o kit de reparo no bagageiro da bicicleta, peguei a bolsa e saí pedalando às quatro e meia, ainda no escuro.
Quando cheguei à periferia de Itajá, me encontrei com Evanildo Cesar, com o qual fui pedalando até a casa do pai dele, seu Cícero, não muito distante do trevo da BR304 com a pista que, passando por São Rafael, vai até Caicó.
Gustavo, outro ciclista que iria com a gente, não apareceu no local de encontro e assim seguimos logo pedalando apenas os dois; atravessamos toda a cidade e pegamos a BR, que tem acostamento asfaltado em ótimas condições.
A primeira ladeira que encaramos parece não terminar nunca, mas, com santa paciência e força nas pernas, chegamos ao topo dela e seguimos a pedalada sem outras dificuldades até o trevo de São Rafael, distante uns cinco quilômetros do de Itajá.
A estrada lá não tem acostamento nenhum e após poucas centenas de metros começa outra ladeira das que parecem não ter fim. Quando, já nos três quartos da ladeira, o declivo aumenta um pouco, achei que tivesse chegado a hora certa para dar uma parada e bater umas fotos do amanhecer. Também aproveitei para tomar uns goles de café e comer quatro biscoitos. Descansados, seguimos pedalando até a casa de seu Cicero, pouco distante.
A pedra pintada está mesmo no quintal da casa dele, atrás do cercado das cabras. Trata-se do único registro oficial de petróglifos no município de Itajá/RN. Fazia tempo que estava com vontade de conhecer o local e nesse dia finalmente fomos. Agradeço o amigo Evanildo pela oportunidade.
A grande pedra se encontra nas margens de um riacho que seca na estiagem e que, na época da chuva, no local até cria uma lagoazinha. Uma localização típica por uma itacoaticara, perto de um curso de água.
Os petróglifos são poucos e mal conservados. Tirei a foto de todos eles. Perguntei para Evanildo se no topo da pedra tivesse mais pinturas e ele me disse que não.
Confirmei no GPS a posição do local e voltamos às bicicletas para a pedalada de volta.
O retorno foi todo por caminhos de terra, numa pedalada tão boa que não me deu tempo ou vontade de parar e tirar uma foto. Quem conhecia o caminho certo era o meu amigo, que segui confiante, sempre pedalando a uma boa distancia de segurança nesse percurso misto de terra, pedras e areia fofa, com curvas rápidas e algumas descidas íngremes; ainda vou ver se consigo achar no wikiloc os singelos caminhos que percorremos.
Quando recomecei a orientar-me sozinho, reconhecendo uns lugares familiares, a gente já estava pelas bandas do Sítio São Francisco; num trevo, Evanildo dobrou por um lado e eu segui pro Sítio Araras, chegando em casa às sete e quarenta, três horas e dez minutos depois de ter saído. Acho que o percurso completo não deu 20 km, ou talvez pouco mais.
Não faz muitos dias, fui passar um fim de semana no Seridó paraibano, na fazenda de Zé Domingos no Riacho da Serra, município de São José do Sabugi/PB; a ocasião foi o 90º aniversário da bisavó de minha filha Marina Luna, dona Anair Domiciano Dantas. O casamento dela com José Domingos Dantas deu origem a uma grande família, composta por 16 filhos, 33 netos, 23 bisnetos e 3 trinetos, em sua maioria presentes nessa reunião. A comemoração foi grande, muito bonita e durou o dia inteiro, principiando com uma missa solene na capela da área rural e continuando com um tradicional banquete interiorano, com cada iguaria sertaneja de lamber o bigode; grande festa de uma grande família, alegrada por um trio de forró pé-de-serra, com um sanfoneiro das grandes virtudes musicais.
Numa certa hora, já depois do bolo e dos parabéns, enquanto ainda umas dezenas de pessoas seguiam no alegre convívio, eu armei minha rede num alpendre escuro e logo dormi, com gorro de lá e agasalho de frio, para aguentar as ventanias noturnas.
Domingo, 13 de outubro, acordei às 5h15, calcei as botas, peguei da mochila minha faquinha suíça, bebi um copo de água e, assim como estava, subi a Serra do Jacu, que fica, a certa distancia, bem na frente da casa de Zé Domingos. Já subi essa serra em 2005 e agora, 14 anos depois, repeti a façanha para comemorar os 90 anos de dona Anair e minha volta ao Riacho, após uns dez anos que não ia mais lá. O tempo passa rápido e é nessas ocasiões que percebe-se como o tempo voa mesmo e, num sopro, se vai uma década.
Cruzada a estrada de terra, desci pro leito do rio seco e caminhei até o pé da serra, acompanhando uma cerca de arame farpado. A novidade na região, que já comentei ser bem ventilada, é a presença no alto das serras de muitas hélices gigantes da companhia de energia eólica. Por sua natureza íngreme e inóspita, a Serra do Jacu foi poupada e ficou tal qual era e sempre será. Só algum caçador de abelhas deve subir essa serra, talvez, mas eu só vi uns cortiços atrás da casa de Deca Souza, no pé da serra, e nada mais. Bem no topo do penhasco, um pouco mais tarde, uma abelha veio me conhecer, curiosa, mas só foi uma mesmo.
Como ninguém anda por aí, bicho grande ou homem, não tem veredas, nem alguma picada aberta entre os arbustos secos e espinhentos que crescem por todo lado. Subo devagar, olhando bem por onde ando e escolhendo o caminho melhor.
Não estou bem equipado. Esta trilha na caatinga merecia umas perneiras e umas luvas de couro; um facão, ou uma boa tesoura de jardinagem, que eu até prefiro ao facão para abrir uma passagem entre os arbustos. Bom, minhas botas são boas. Logo que achei o pau certo, fiz uma bengala para mim, que sempre ajuda na caminhada e é útil em várias situações. Por exemplo, com a bengala, quando me aventuro nessas regiões povoadas pela cascavel e a jararaca, eu ando batendo a bengala nas pedras e no chão o tempo todo, avisando que estou passando. As cobras, avisadas, ficam entocadas e o encontro indesejado é evitado. Também os óculos escuros que eu uso, modelo segurança no trabalho (rss), protegem bem os olhos e acabam sendo um item de segurança importante numa trilha dessa.
Após uma primeira encosta meio íngreme, a serra se abre num platô pouco inclinado, no qual se alternam manchas de arbustos espinhentos e amplos lajedos, ricos em cactos e bromélias. Tem muitos coroas de frade. Avistei uns preás que saíram correndo ao perceber minha chegada. Fora os preás, alguns lagartos e uns pássaros típicos da região, não encontrarei outro animal durante toda a trilha.
Abruptamente, a serra cresce pro topo quase verticalmente e é preciso escalar as pedras com mãos e pés, passando por baixo de árvores caídas e dos arbustos espinhentos onipresentes. Finalmente, chega-se ao pé do penhasco de rocha amarela, no topo da serra. Subir até ali não foi fácil, assim me sentei por alguns minutos para descansar.
Toda a encosta do penhasco está ladeada por extensas áreas de macambiras. Não tem outra solução que caminhar por cima das plantas secas de macambira enfileiradas, com todo cuidado para não perder o equilíbrio. O ar fino das alturas é inebriante e a vista panorâmica estonteante. Sigo até onde uma pedra rachada me permite escalar os últimos metros do penedo amarelo; estou no alto da serra, sopra um bom vento e eu me sento para não cair.
Tiradas umas fotos, deitei com os braços cruzados por baixo da cabeça e fiquei uns dez minutos em silêncio a pensar. Pensar em muitas coisas, inclusive em que caminho pegar para a descida de volta. Descer uma parede inclinada de uma serra é sempre mais complicado que subi-la e, quando se está sozinho, a segurança sempre deve ser redobrada para evitar qualquer tipo de acidente.
Me lembrei que em 2005 desci pela outra vertente da serra, mas não consigo enxergar um bom local para dar inicio a descida naquele lado, assim, com cuidado desço pela mesma rocha rachada pela qual subi e sigo até o pé do penhasco encostado nele, com a bengala cravada no chão para garantir sempre um bom equilíbrio. Nas passagens mais difíceis tenho que rastejar de ré entre as pedras e por baixo dos arbustos. Minhas calças ficam cheias de espinhos, mas são folgadas e os espinhos não chegam a ferir-me.
Quando afinal cheguei no pé dessa parede mais íngreme, soltei um suspiro de alivio porque o pior já tinha passado. Na caminhada final de volta, ainda peguei três pequenos coroas de frade para levar comigo pro Sítio Araras, como lembrança desta aventura.
Cheguei em casa todo sujo e faminto; troquei de roupa e comi um pratão de cuscuz com carneiro guisado e queijo manteiga, acompanhado por três boas xícaras de café quente.
Só o sertanejo sabe quanto é duro o sertão; só o sertanejo sabe quanto é belo o sertão.
“Falves Silva e a Pipa”, “Moacy Cirne na Praia da Pipa” e “Inácio Magalhães de Sena e a Pipa” são três breves depoimentos que gravei em 2009, em ocasião do FLIPA, o primeiro festival literário organizado por Dácio Galvão na Pipa.
O flipAut! iria nascer só no ano seguinte e, naquela época, a gente atuava na Pipa como ECA13, espaço cultural alternativo.
Na tarde do último dia do festival, conversando com Abimael Silva, pintou a ideia e assim gravei primeiro Falves e depois Sêo Inácio, com uma pequena câmera fotográfica e os braços firmemente apoiados no espaldar da cadeira, como tripé. Cada um falando um pouco da “sua Pipa”.
Na manhã seguinte, acordei cedo e corri pra frente do hotel onde estava hospedado Moacy Cirne, para gravar também um depoimento dele sobre a Pipa.
Moacy estava pronto a sair de carona para Caicó com um conhecido, mas como tínhamos marcado no dia anterior, ele pediu pro dono do carro atrasar a saída uma meia hora e fomos gravar na varanda de um bar fechado, lá na frente.
Eu tinha ido com uma filmadora um pouco melhor que a outra. Moacy, inspirado, falou não só da Pipa, mas também do Seridó e do Bloomsday em Natal. Ventou muito, choveu forte e quase perdi a gravação por causa do barulho de fundo, mas acabei conseguindo salvar todo o depoimento de Moacy, afinal.
Desde 1972, o 5 de Junho comemora-se o Dia Mundial do Meio Ambiente, com o objetivo de promover atividades de proteção e preservação do meio ambiente, e alertar o público e governos de cada país sobre os perigos de negligenciarmos a tarefa de cuidar do mundo em que vivemos. Isso é muito importante, com certeza.
Mas esta data também lembra-nos, ou deveria lembrar-nos, por melhor dizer, a comemoração do ano novo feita pelos povos indígenas do Brasil, antes da chegada dos colonizadores europeus.
Mesmo não tendo conhecimento maior do universo e da mecânica celeste, não sabendo calcular matematicamente os eclipses e as órbitas dos planetas, os indígenas do Brasil pré-cabralino criaram uma cosmologia bem desenvolvida, a que não faltam explicações pitorescas sobre a origem das fases da Lua, os cometas, os meteoros, a Via-Láctea etc.
Foi a necessidade de medir o tempo através da determinação do retorno das épocas de chuvas e secas, que conduziu esses astrônomos elementares a observar o movimento dos astros e relacionar o aparecimento de certas estrelas, ou constelações, com as mudanças das estações.
O mais importante agrupamento estelar que caracteriza o conhecimento dos aborígenes do Brasil é o das Plêiades. Duas são as razões desta importância: a primeira, o fato das Plêiades constituírem um dos objetos de mais fácil identificação; a segunda relaciona-se com o fato que sua aparição no céu, em Junho, antes do nascer do Sol, no lado do nascente, indicava aos indígenas que nesta época a Natureza começava a se renovar e, dependendo da região, a estação das chuvas estava acabando, ou principiando.
O aglomerado estelar das Plêiades (M45) é visível perto da constelação do Touro. Trata-se de um agrupamento estelar relativamente jovem, na ordem dos 30-40 milhões de anos, que dista aproximadamente 450 anos-luz da Terra.
São muitas as lendas sobre as Plêiades, popularmente conhecidas também como Setestrelo, por serem visíveis a olho nu, apenas sete estrelas desse aglomerado celeste. Os interessados podem ler, se quiser, um breve ensaio¹ que escrevi a propósito disso.
Muitas etnias indígenas de diferentes regiões do Brasil utilizavam as Plêiades para construir seu calendário. Eles consideravam principalmente os dias do nascer helíaco, do nascer anti-helíaco e do ocaso helíaco das Plêiades. Cerca de um mês por ano, as Plêiades não são visíveis porque ficam muito próximas da direção do Sol. O nascer helíaco das Plêiades ocorre no dia 5 de junho, o primeiro dia em que elas se tornam visíveis de novo, perto do horizonte, no lado Leste, antes do nascer do Sol. Esse era o dia que marcava o início do ano para a maioria das etnias indígenas do inteiro Brasil.
Por volta do dia 10 de novembro, as Plêiades nascem logo após o pôr do sol, este dia recebe o nome de nascer anti-helíaco das Plêiades, pois o Sol se encontra no lado Oeste e as Plêiades no lado Leste. Perto do 10 de maio, acontece o ocaso helíaco das Plêiades, pois elas desaparecem do lado Oeste, logo após o pôr do Sol. Depois desse dia, elas não são mais visíveis à noite, até perto do dia 5 de junho quando ocorre, novamente, seu nascer helíaco. Pode-se bem admitir, então, um ano sideral, baseado no nascer helíaco das Plêiades.
No Vale do Assu e no Seridó, interior do Nordeste, terras dos tapuios Tarairiú e Cariri, o simbolismo das Plêiades estava estritamente ligado ao mundo invisível dos mitos ancestrais.
Todos os bisamus² cariris colocavam seus mistérios nas Plêiades e na constelação de Orion, moradia celeste do deus Poditã, herói civilizador do grupo étnico Kariri. O mito de Poditã estava cercado de mistérios e sutilezas, que deixaram muitos intrigados, pois tinham os indígenas como regra sagrada guardar os ensinamentos do deus, conservando segredos que jamais foram revelados a quem não fosse do mesmo grupo étnico.
Seja os Cariris que os Tarairiús começavam a contar o ano pelo nascimento das Plêiades, que nesses sertões marcava o fim do “inverno”, estação da chuva, e a chegada da “primavera”, época de renovação da flora e da fauna.
Cantos e danças faziam parte dos cultos em honra do Setestrelo realizados pelos tapuios. Eram as arcaicas festas juninas, depois sincretizadas e inseridas no calendário religioso da igreja católica. A comida típica das festas era quase toda à base dos grãos e raízes que os indígenas cultivavam, como milho, amendoim, batata-doce e mandioca. Com boa fartura de caças, peixes e frutas, os indígenas comemoravam em grande estilo: comiam, bebiam, dançavam e, inebriados, farreavam por dias e dias, cada dia com renovada energia. A demorada comemoração chegava a alcançar e incluir nos festejos também o dia do solstício, que cai entre os dias 21 e 22 de junho.
Segundo Marcgrave, quando os frutos silvestres já estavam na maior parte maduros, os Tarairiús saiam em romaria do acampamento principal, situado nas margens do rio Otschunoch (Assu), caminhando por dois dias até as cabeceiras do rio Quoauguho (Upanema), onde realizavam cultos de adoração ao Setestrelo durante semanas. A festança era grande!
Câmara Cascudo, em seu “Nomes da Terra”, confirma que tal Lima Pacheco, em 1689, recebeu em sesmaria 24 léguas na ribeira do rio Upanema, “principiando de uma penedia que está onde o rio nasce, a qual o gentio denominava Sete Estrelas”.
Quando o rio Assu voltava ao seu leito, os Tarairiús dedicavam-se ao plantio do milho, jerimum, amendoim e fava, entre outros. Antes do plantio, havia umas cerimônias realizadas pelos feiticeiros, destinadas a propiciar a fertilidade do terreno; cerimônias, cujos rituais Jacob Rabbi, judeu alemão que viveu junto aos tapuios Janduís por anos, descreveu em todos os pormenores; seu famoso relatório, dedicado ao conde Mauricio de Nassau, é uma das maiores fontes de noticias sobre os Tarairiús para todos os pesquisadores, desde os cronistas da época da colonização europeia até hoje.
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¹ “Astronomia Indígena – O Setestrelo” – 2018 Edições Igaruana
² Bisamu é o curandeiro, feiticeiro, autoridade espiritual; o mesmo que pajé em tupi
Dormir em rede garante uma maior qualidade de sono. Isso é o que afirma uma equipe de cientistas suíços e franceses, que publicou recentemente um estudo onde se afirma que o movimento de vai e vem de uma rede melhora a qualidade do sono e ajuda as pessoas a dormirem mais rapidamente.
A rede, também destaca o estudo, tem um efeito prolongado na atividade cerebral, aumentando as oscilações mentais e a irrupção da atividade conhecida como eixos de sono: estes efeitos são consistentes com uma atividade neuronal mais sincronizada, característica do sono mais profundo. Os pesquisadores europeus pretendem averiguar se a rede de dormir pode ser utilizada para ajudar pessoas que sofrem de insônia.
De acordo com os registros recolhidos até hoje, a rede de dormir possui o copyright sul-americano. A primeira citação nominal em português da rede de dormir foi feita em 27 de abril de 1500 pelo escrivão da frota portuguesa, Pedro Vaz de Caminha, na ocasião em que o Brasil foi “descoberto”. Segundo consta em seus relatos, os índios dormiam sobre redes altas, atadas pelas extremidades.
As redes feitas pelas mulheres indígenas eram resistentes, de fiação simples e malhas grandes, por este motivo faziam lembrar a rede de pescar. O nome “rede”, assim, foi dado pelos portugueses. Os indígenas a chamavam de “ini”.
O folclorista potiguar Luís da Câmara Cascudo, no seu ensaio “Rede de Dormir”, faz uma apologia a esta peça doméstica integrante da vida cotidiana das gentes do Norte e Nordeste brasileiros, comparando-a com a cama, e enaltecendo as vantagens da rede:
“O leito obriga-nos a tomar seu costume, ajeitando-se nele procurando o repouso numa sucessão de posições. A rede toma o nosso feito, contamina-se com os nossos hábitos, repete, dócil e macia a forma do nosso corpo. A cama é hirta, parada, definitiva. A rede é acolhedora, compreensiva, coleante, acompanha, tépida e brandamente, todos os caprichos da nossa fadiga e as novidades imprevistas do nosso sossego Desloca-se, incessantemente renovada, à solicitação física do cansaço. Entre ela e a cama, há a distância da solidariedade à resignação”.
Autênticas e eficazes também as palavras de Sérgio Buarque de Holanda (Caminhos e Fronteiras):
“Em contraste com a cama e mesmo com o simples catre de madeira, trastes sedentários por natureza, e que simbolizam o repouso e a reclusão doméstica, ela pertence tanto ao recesso do lar quanto ao tumulto da praça pública, à morada da vila como ao sertão remoto e rude. (…) O fato é que as redes – redes de dormir ou de transportar – são peças obrigatórias em todos os antigos inventários feitos no sertão”.
Até hoje, creio que no Vale do Assu, assim como em toda a área rural e silvestre do Norte e Nordeste do Brasil, a rede deve ser ainda muito mais usada que a cama para dormir.
Já há muitos anos, seja para dormir ou ficar a noite inteira lendo um livro que não se deixa fechar, eu prefiro sempre deitar numa boa rede que na cama. Boa rede por mim não tem muita frescura: deve estar bem armada e não pode estar muito deformada pela idade, ou usos diferentes do deitar pra dormir. Se estiver limpinha e cheirosa, então, já fica um convite irresistível a pular dentro dela!
Aos amigos que vem no Sitio Araras de Itajá RN, no meu sertão, conhecer meu “bom retiro” à beira-rio, para eles entrarem logo no estilo local, sempre ofereço como primeira opção de pernoite uma boa rede armada por baixo do imbuzeiro, na sala, ou na varanda da casa.
Mas a maioria deles, entre os quais também uns tantos brasileiros (geralmente, sulistas), diz que gosta muito da rede para descansar, mas não sabe dormir uma noite inteira. Alguns dizem até que ficam com dor nas costas e terminam quase todos dormindo nos colchões infláveis, que tenho como segunda opção para eles kkkkkkkkkkkkk
Mesmo assim, eu não deixo de explicar para cada pessoa, que aparece aqui em casa, como com poucos cuidados, a rede pode-se transformar num berço ancestral, onde dormimos sonos profundos e bem repousantes.
É bem simples. A rede deve ser armada não muito esticada, tampouco muito frouxa, para nela podermos deitar como se estivéssemos em uma suave bacia com a forma e tamanho do corpo. Ao invés de dormir no mesmo sentido da rede, que é a primeira posição que pode vir à mente, com os pés em direção a um punho e a cabeça ao outro, é preciso deitar na diagonal, num ângulo de aproximadamente 30 graus, ajeitando a posição até que não fique do seu próprio gosto, pois a elasticidade do tecido da rede ainda absorve as diferenças do corpo (traseiro, cintura, costas), tornando-a ainda mais confortável.
Em casa, em viagem, nas aventuras em canoa, hóspede em casa de algum amigo/a, eu não tenho duvidas: melhor jeito de dormir é na rede, de preferência armada por baixo de uma arvore, onde de manhãzinha vem cantar os passarinhos.
Quando, no começo de minha permanência em Brasil (anos 90), ainda viajava um pouco indo e voltando para e da Itália, num verão europeu fui a Roma com uma rede na mala. Entre outras, fomos de navio para a Sardenha, numa travessia que dura uma noite inteira e um pouco mais. Amigas e amigos, com os quais viajei juntos, foram dormir em angustos e quentes camarins, enquanto eu armei minha rede num cantinho de convés tranquilo, realmente o melhor lugar para dormir e, ainda mais, de graça. Foi naquele ano mesmo, creio, que inseri uma rede de dormir na lista de bagagens essenciais para qualquer viagem, ou aventura.
Eu nunca vou poder esquecer de toda a inveja dos meus amigos italianos, ao longo daquele verão, por causa de minha prática rede de dormir, trazida do Brasil kkkkkkkkkkkkk
Domingo de céu nublado. Acordei tarde e nem fui pedalar. Estou aqui, tomando um belo café “antes do almoço, é muito bom pra ficar pensando melhor” kkkkk
Ontem, no Sítio Araras, solzão até duas da tarde, depois o céu fechou e começou a ouvir-se de longe uma trovoada ameaçadora, que por longe passou e pouca água trouxe pra cá. Choveu um pouco à tardinha e mais um pouco à noite. O registro nas 24h, no pluviômetro do quintal, foi de 7 mm/m² só.
Enquanto isso, na noite entre a sexta e o sábado passados, o rio Assu, que está recebendo há três semanas a sangria do açude Mendubim (rio Paraú), rompeu a passagem molhada, que interliga as cidades de Assu e Ipanguaçu, sem precisar passar pela BR304. Uma estreita estrada de terra que corta o caminho a partir da RN118 e logo chega perto do centro da cidade, bem atrás da Praça da Matriz. É onde tem umas barracas à beira do rio, bastante frequentadas no fim de semana.
Eu conheço bem o local, porque chegando lá em canoa, saindo de Itajá, é preciso fazer uma portagem: carregar canoa e tralha do outro lado da parede, que na estiagem o rio atravessa por umas manilhas. Em canoagem solitária, já comecei duas vezes uma descida do rio até Pendências a partir dessa passagem molhada para evitar-me a portagem rss
Pois, naquela madrugada, com a abundância de água dos 60 cm de sangria do Mendubim, o rio Assu abriu caminho através das manilhas e levou tudo embora!
Viva a chuva!
Viva o sertão!
Viva o rio Assu!
Choveu bem nesta semana no meu sertão, para começar em beleza o mês de Abril. Confirmando as expectativas da Emparn, as precipitações do mês de Março foram na média em toda a região e o volume da barragem ARG cresceu sensivelmente. Por isso, o vazão na comporta foi aumentado de 3.500 para 4.000 litros por segundo, sendo 700 direcionados no canal Pataxó e o resto na várzea do rio Assu.
No Sítio Araras, onde eu moro, num dia de chuva a tendência é chover à tarde, ou à noitinha. Isso significa, então, que geralmente temos a parte da manhã para realizar atividades ao ar livre, ou ir pro comércio, na rua, e devemos destinar a parte da tarde para atividades em casa.
Assim, entre outros ofícios, nesta quinta-feira, de manhã cedo eu catei um bocadinho de umbu-cajá da árvore e, à tarde, prepararei uns potinhos de geleia; já na segunda, durante a chuva, preparei três potes de geleia de mamão com rapadura.
Sim, com rapadura. Eu já não compro nem utilizo mais açúcar branco há muitos anos; quando comecei a pensar em produzir um doce caseiro, a primeira ideia foi logo a de usar a rapadura, tão tradicional na alimentação nordestina e relativamente muito mais natural que qualquer açúcar refinado.
Ao invés de comprar produtos industrializados, uns dois anos atrás me decidi a preparar eu mesmo uns lanches energéticos, feitos com ingredientes naturais e orgânicos, para consumir no dia a dia, ou nas aventuras em canoa e bicicleta na Natureza.
Faço geleias com fruta da época, ou melhor, do meu jardim, com rapadura e um pouco de castanhas de caju, ou amendoins, às vezes.
Produzido seguindo as regras de higiene, um pote fechado se conserva por um bom tempo fora da geladeira (até 45 dias) e, quando aberto, evitando a contaminação direta, o doce dura tranquilamente dois, ou três, dias.
Os potes de vidro e suas tampas devem ser bem lavados e fervidos. A fruta, descascada e cortada em pedaços não muito grandes, deve cozinhar por cerca de quinze minutos, a fogo médio, numa panela sem tampa, remexendo sempre com uma colher de pau. Acrescentar a rapadura derretida, misturar bem e juntar algumas colheres cheias de castanhas, ou amendoins, quebradinhos.
Pôr a geleia ainda quente nos potes, até a borda, e fecha-los bem.
A variedade de sabores das geleias que produzi até agora inclui, entre outros:
– umbu-cajá com rapadura
– manga com rapadura e castanha de caju
– acerola com rapadura
– manga com rapadura e amendoim
– mamão com rapadura e castanha de caju
– manga com rapadura e nozes (no Natal kkkkk)
Umbu-cajá e acerola são do meu quintal. As mangas são da mangueira do vizinho e os mamões de um pequeno produtor local. Estou esperando crescer as goiabas do pé que nasceu espontaneamente há uns anos no quintal e, finalmente, começou a frutificar neste verão.
A quantidade de rapadura, ou algum açúcar integral orgânico, deve ser considerada para cada tipo de fruta. Minhas geleias são feitas com a quantidade mínima necessária de rapadura, para ressaltar o sabor da fruta. Contudo, é bom lembrar que é o açúcar que conserva a geleia no tempo e assim não deixar de colocar a quantidade necessária. Aproximadamente, em minhas geleias, para cada quilo de fruta, considero a quantidade de rapadura entre os 300 e os 500 gramas.
Pois é, encontrei essa babosa três anos atrás, durante uma pedalada pela caatinga. Na beira de estrada de terra, no duro chão do sertão, estava em más condições, com poucas folhas murchando e as raízes quase todas expostas. A levei comigo pra casa e, desde seu primeiro dia aqui, ficou num vaso em companhia do coroa-de-frade, para receber um suporte emotivo durante a recuperação.
O coroa-de-frade também foi encontrado numa situação de dificuldade (na Ilha Timbaúba, em 2008, lá pelas bandas de Jucurutu) e trazido pra cá, onde se acostumou bem e cresceu feliz.
A babosa demorou um bom tempo para recuperar-se, mas ficou forte e criou até varias mudas ao redor dela.
Alguns meses atrás, troquei o vaso quebrado das duas plantas por um do mesmo tamanho e fiquei ponderando que já tinha ficado muito justo. Assim, pensando e repensando, não querendo separar a babosa do coroa-de-frade, me decidi hoje a mudar as duas plantas para um velho pneu, que encontrei por aí.
Pensei em cortar o pneu com a serra tico-tico elétrica, mas depois vi que era melhor e mais fácil fazer o serviço com uma faca utilitária bem amolada, que inventei a partir de uma tesoura quebrada.
Rapidinho, cortei o pneu e, preparada uma mistura de terra boa para acrescentar no vaso maior, coloquei as duas plantas uma perto da outra, mas não tanto para ferir-se com os espinhos. Para manusear o coroa-de-frade sem furar-me, usei um pedaço de papelão, circundando todo o cacto e segurando-o firmemente. Esta é uma dica boa para lembrar na hora certa.
E assim, babosa e coroa-de-frade continuam lado a lado, amigos para sempre.
In the Mood for Love – Shigeru Umebayashi
Alguns dias atrás, li uma noticia no jornal à qual deve ser dada toda a importância do caso: a combinação chuva, calor e descarte inadequado de lixo, mais o comportamento sazonal do mosquito Aedes aegypti, monitorado pela Secretaria Estadual de Saúde Pública (Sesap), indicam uma tendência de epidemia de dengue, este ano, no Rio Grande do Norte.
Nos primeiros 45 dias de 2019, a Sesap já confirmou 246 casos de dengue no RN – sendo dois casos graves – e 12 de chikungunya.
As áreas com maior potencial epidêmico são o Seridó potiguar e a Região Metropolitana de Natal, mas são 161 dos 167 os municípios do RN considerados a risco.
A estratégia prioritária é a prevenção e todo cidadão deve fazer sua parte.
Aqui no Sítio Araras existem uns focos de lixo, na periferia da vila, mas todos os moradores em geral estão positivamente sensibilizados com a questão de não deixar água parada no quintal e de manter caixas e toneis bem tampados.
Na época das chuvas, tem bastante mosquitos na vila, mas, averiguando com alguns dos moradores, que vivem aqui desde sempre, conferimos que não teve, até agora, caso algum de dengue confirmado.
Mesmo assim, a comunidade inteira se queixa dos mosquitos que, quando o Sol se põe no horizonte, invadem as casas e atacam todo mundo, sem poupar a ninguém. Aparentemente, o Sítio Araras é frequentado mais pela muriçoca (Culex), que pelo mosquito da dengue. A muriçoca, no caso, tem hábitos noturnos, põe ovos em águas sujas, ricas em dejetos materiais orgânicos em decomposição, como esgotos a céu aberto.
Anteontem, voltando de uma das minhas caminhadas ao crepúsculo à beira do rio, parei para conversar um pouquinho com Maria de Gai, sentada no alpendre da casa dela, em companhia do filho Daniel. Geralmente, eu dou essas saídas usando a porta dos fundos, mas nesse dia, sai pelos fundos e voltei pela frente, pois fui até o porto das canoas para tirar umas fotos.
Primeiro, falamos de chuva, naturalmente; depois Maria me contou de um novo rancho que eles aprontaram na margem direita do rio, a caminho para São Rafael. Esses ranchos ficam nas proximidades de locais de boa pescaria, onde os pescadores passam uns dias dedicados às suas atividades, antes de voltar em casa. Dependendo do uso, existem ranchos permanentes, onde é até construída uma latada, e provisórios, nos quais os pescadores aproveitam da sombra de alguma árvore e armam uma lona impermeável em caso de chuva. Existe um pacto entre os pescadores de uso mútuo desses ranchos, respeitando a regra fundamental de deixá-los assim como os encontra, sem vandalizá-los, ou carregar alguma coisa, que outro pescador deixou.
Em minhas aventuras em canoa no Vale do Assu, eu mesmo utilizo bastante os ranchos de pescador para acampar uma noite, ou duas. Fora ter uma área de sombra já livre de arbustos espinhentos, quase todos os ranchos estabelecidos tem um local apropriado para fazer o fogo já pronto.
Quando ia me despedir, já no escuro da noite, Maria bateu com a palma aberta no braço dela e gritou:
– Ai! Maldito mosquito!
– Ai, ai, ai! – respondi – Chegou a hora deles! Vou pra casa.
– Peraí! Sabe o que ia pedir pro senhor, agora que lembrei?
– Pois diga, minha amiga.
– Eu quero a receita do repelente caseiro que o senhor faz. O do qual deu um frasquinho de brinde para a minha cunhada, Tica de Zé.
– Ah, sim! Bem fácil de fazer. Vou explicar em dois minutos.
Hoje, acordei pensando em escrever uma nota sobre esse repelente natural que eu faço, porque realmente muitas pessoas me perguntaram a propósito disso. Tomado meu café, olhei para as mensagens no celular e a mais recente, do amigo Irvando, de Tibau do Sul, diz assim: “Eaí, bro?! Tudo beleza? Manda a fórmula do teu repelente para mim”. Na hora, meu chapa! kkkkkkkkkkkkkk
O “meu” repelente natural não é nenhuma invenção minha, não. O que eu fiz foi, após pesquisar na net e no campo, aprimorar uma fórmula que garanta uma eficiência real e durável. O principio ativo é o do cravo-da-índia, que afasta todo tipo de mosquito. Os ingredientes e as proporções que eu uso em minha receita são os seguintes:
– 150 ml de álcool
– 50 ml de óleo de coco
– 5 gr de crávo-da-índia
Fazer é fácil demais: basta colocar os 5 gr de cravo-da-índia de molho por quatro dias e quatro noites em 150 ml de álcool puro, numa garrafinha com tampa, remexendo bem o conteúdo duas vezes por dia. Após quatro dias, coar o liquido e acrescentar os 50 ml de óleo de coco. Qualquer tipo de óleo corporal pode ser utilizado, mas eu achei que o casamento do coco com o cravo produz um cheirinho bem agradável. É importante lembrar-se sempre de agitar bem o repelente antes de usa-lo, pois o álcool e o óleo têm tendência a separar-se.
O repelente feito seguindo minha formula tem eficácia por aproximadamente quatro a seis horas; depois das quais deve ser, eventualmente, colocado de novo nas partes expostas do corpo.
1. Aprendi que é importante deixar a casa no escuro à noitinha; ao anoitecer, uma lâmpada ligada em casa, ou na varanda, chama uma porção de mosquitos. Acendendo as luzes só mais tarde, a porção de mosquitos que aparece em casa é bem menor.
2. Mosquito, em geral, voa baixo e ataca, de preferência, nossos pés e tornozelos. Uma boa solução para prevenir isso é usar um par de meias à noite.
No Sítio Araras, a quarta-feira é o dia da semana que passa o carro do lixo. Logo de manhã cedo. Até o ano passado, o caminhão da prefeitura passava à tarde, mas a partir de uma vez, que não me lembro mais quando foi, começou a passar de manhã e pronto; agora, é entre as seis e meia e as sete horas que aparece.
Buzinando, para avisar todo mundo, o caminhão desce pela vila até o fundo da estrada de terra. O motorista faz manobra na frente da casa de Chico Felix e os garis começam a recolher o lixo, que cada morador coloca num saco, ou num balde, diante de casa. Rapidinho, o caminhão atravessa a vila, com os garis que avançam a pé e jogam o lixo na caçamba. Tudo isso dura menos de dez minutos, creio. Tem que ficar ligado no dia e na hora, senão se corre o risco de seguir com o lixo guardado em casa por mais uma semana.
No meu caso, isso não seria tão grave, pois, numa semana, eu produzo uma quantidade de resíduos secos irrisória e ainda destino quase todo o lixo orgânico para a compostagem. Algumas cascas de fruta, tipo mamão, melão, manga etc, eu reservo para vacas, cabras e jumentos que andam soltos pela vila. Coloco as cascas no chão na frente de casa e o primeiro que passa, come. Tem até uma burrinha atrevida aqui na vila que, de vez em quando, vem bater no alpendre a pedir uns umbu-cajás pra ela. Já pensou?! kkkkkkkkkkk
Porém, para falar a verdade, a Quarta por mim é e resta principalmente o dia de fazer a feira verde semanal; quer dizer, o dia de comprar frutas e hortaliças, ingredientes essenciais de minha alimentação, assim que seja, de preferência, sempre bem saudável e gostosa.
Há alguns anos, num processo de transformação dos hábitos alimentares, comecei a eliminar uns muitos produtos que realmente não me interessa mais consumir, pelo menos no dia a dia. Na atualidade, o que mais eu como são grãos, frutas e hortaliças em geral; peixe, ovos e queijo, pouco.
Gosto bastante de arroz e aqui no meu sertão encontra-se com certa facilidade um grão integral orgânico típico da oeste potiguar: o arroz da terra. Desse aí, eu gosto mesmo e posso come-lo até todo dia.
Em bicicleta, são sete mais sete os quilômetros que pedalo para ir e voltar até o mercadinho Padre Cícero, o maior da cidade, onde duas vezes por semana chegam produtos frescos de Mossoró. Mas é claro que eu não deixo de ser cliente e dar uma passada em praticamente todos os mercadinhos da cidade, pois compro uma coisa aqui e outra ali, conforme produto, preço e disponibilidade.
Na praça da lotérica, nem sempre mas quase, na quarta-feira está armada a banca de um agricultor local com seus produtos; ali eu paro e consigo comprar por um bom preço a batata doce, o jerimum, o mamão, a melancia, o feijão verde, a fava, quando tem, e às vezes até os ovos de galinha caipira.
Estou já com muita fruta em casa: umbu-cajá, acerola e goiaba do quintal, mais a manga do vizinho. No mercadinho, comprei um pouco de uva só porque está bem docinha. Ao todo, hoje, reabasteci a despensa, comprando: batata doce, batatinha, abobrinha, jerimum, mamão, beterraba, vagens, cenoura, cebola, pepino, tomate, couve folha, alho, cúrcuma, gengibre e coentro. Está garantida uma alimentação gostosa e relativamente saudável pelos próximos dias.
A chuva é um tema recorrente de conversa no sertão o ano inteiro. Nesta época do ano, então, só se fala nisso. Seja Nhô Bilu que Pintinho, cada um na porta de seu mercadinho, logo que me viram, me perguntaram se tinha chovido bastante no Sítio Araras na semana e se a barragem tivesse já pego uma boa água. Também na lanchonete ao lado do clube, na outra praça, onde parei para tomar um belo caldo de cana, antes de empreender a pedalada de volta, me perguntaram exatamente o mesmo.
Na verdade a barragem ainda está com um volume bastante reduzido, porque mal começou a chover este ano. Localmente, janeiro totalizou um bom numero de chuvas, mas fevereiro foi meio fraco. Na realidade, as chuvas que podem fazer aumentar consideravelmente o volume da barragem ARG devem começar a cair na Paraíba, não só de Jucurutu pra cá.
Segundo os meteorologistas, numa reunião na Enparn da semana passada, as chuvas de março, abril e maio no semiárido potiguar vão estar dentro da média. A esperança, então, é que chova bastante e que todos os açudes da região recebam muita agua.
Não por nada, fui de manhã na rua, hoje, fazer a feira; porque, nesta época do ano, à tarde, de repente, o céu pode fechar e começar a chover, cair aquele toró assustador, com trovoadas e relâmpagos, e você não sai mais de casa.
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