Hoje vou iniciar a coluna com alguns questionamentos que chegaram em um e-mail de marketing do e-commerce cervejeiro chamado Bros Beer: “de onde vem o hype de uma cerveja?” […] “Estaria o hype associado à qualidade da cerveja? Ou a sua limitação e escassez? Ou a sua nota no Untappd? Ou, ainda, ao fato de todo mundo a sua volta estar falando sobre ela? Talvez um pouco de cada coisa?”. Em uma resposta simples: sim, um pouco de cada coisa, mas, ainda, algo mais.
Hypando: origem, qualidade e performance
A origem do hype é algo que não se explica por si. A busca por algo “exótico” ou que todos querem é algo que não se limita apenas às cervejas. Isso é algo bem óbvio, mas em um determinado meio, no caso, o dos beergeeks ou cervejeiros nerds, por assim dizer, essa ânsia pelo novo transcende alguns limites.
De modo sociológico, o hype nada mais é do que o próprio fetiche pela mercadoria – sim, o grande Carlos Marques, vulgo, Karl Marx, está certo sim, amiguinho; você vai pagar caro por algo que não precisa e que nem vale tudo aquilo só porque foi alienado do resultado da sua práxis – já que o valor de troca supera em muito o valor da mercadoria (são margens de 200% ou mais).
Ou será que alguém acha razoável pagar 50 coronavacs (ou quase 10 bidens) numa NEIPA? Não existe malabarismo ou ginástica hermenêutica que justifique esse valor, nem a qualidade nem a performance justificam isso. E nem caiam na ilusão que “você não está pagando pela cerveja, você está pagando (CARO!!!) pela experiência”. Alguém ainda cai nesse engodo? Espero que vocês já tenham superado esse marketing de pseudo-coach-quântico-de-internet.
Existe outro argumento que tenta dar murro em ponta de faca dizendo: tal cervejaria é hypada porque usa melhores insumos, coisa importada, lúpulo fresco plantado nas planícies do Idaho ou no pé da montanha que filmaram o Senhor dos Anéis na Nova Zelândia (o lúpulo de Mordor deve ser o melhor).
Aí você pesquisa mais um pouco, e tem cervejaria local vendendo NEIPA mais caro que (Pastry) Russian Imperial Stout. Enfim, a hipocrisia (já que sai exorbitantemente mais caro fazer uma RIS meia boca que uma NEIPA ótima). Então qualidade não é um critério.
Cervejaria hypadas: o que fazer?
Os filhotes do livre-mercado costumam dizer que cada um é livre para escolher a cervejaria que quiser, e que se tal cervejaria é cara e hypada, que se escolha outra. Adoro o elitismo de quem lucra com isso, mas, deixando a ironia de lado, não é uma simples questão de escolher uma outra mais barata e sim promover um verdadeiro cancelamento das hypadas.
Em síntese, não basta simplesmente não comprar tal cerveja de tal cervejaria hypada, e aqui, vamos dar nome aos bois: Koala San Brew e Spartacus Brewing, duas cervejarias hypadas, caríssimas, e que pouco estão ligando para acessibilidade de seu produto.
Engraçado que ambas são de Minas Gerais e se orgulham de ter técnicas inovadoras, usar lúpulos super frescos, etc etc. Todo aquele discurso marqueteiro que todos conhecem e que não justifica o preço excruciante que elas praticam. Talvez MG tenha sido anexada aos EUA e ainda não nos comunicaram, já que os valores praticados por elas são destoantes com o restante do mercado. Inclusive sua concorrente direta pelo posto de melhor cervejaria nacional, a Dogma, pratica valores bem mais abaixo, algo entre 10 a 15% (há um tempo atrás chegava a ser até 25% mais barata). Mas, como sempre, o hype justifica tudo (para quem acredita nele).
Poderia citar outras cervejas do mesmo talante das mineiras, como a Salvador, que dá frete grátis e tem um produto similar a R$ 34,75 a lata, com envio refrigerado (às vezes a lata ainda chega gelada, e olhe que eles mandam lá do Rio Grande do Sul).
Enfim, alternativas existem, o que é necessário fazer é cancelar cervejarias como a KSB e a Spartacus que praticam preços absurdos e até mesmo incentivam o hype para se locupletar, e já tiveram o despautério de ir às redes sociais de alguns consumidores questionar certos reviews que não lhe conferiam o valor que elas achavam devido. Em outras palavras, consumidores que não embarcaram no hype.
Limitação e Untappd: eles geram o hype?
Não vou embarcar na modinha neoliberal de alguns beer influencers que souberam Von Mises, Hayek ou Hoppe ontem indicados por algum vídeo de Youtube do “Olavo de Cavalo” e querem justificar tudo pela escassez. Aliás, algumas cervejas hypadas chegam até a encalhar, o exemplo mais recente é a “No Brainer” da KSB, que entrou em “promoção” em alguns e-commerce, ou seja, a limitação e a escassez não são o elemento prevalente no psicologismo do hype. Talvez a falsa sensação de que o produto é limitado contribua para isso, mas é apenas mais um joguinho mental de quem quer te cobrar mais caro pelo produto vendido.
De outra banda, temos o Untappd, um aplicativo que serve para avaliar cervejas, e os usuários podem deixar suas notas, impressões gerais e até foto da breja consumida.
Eu, particularmente, sou um entusiasta da ferramenta, até costumo pesquisar nela antes de adquirir alguma cerveja, mas a nota em abstrato não me representa muita coisa. Procuro me guiar mais por comentários e avaliações que tendam a ser mais técnicas, sejam de amigos ou dos demais usuários.
O hype se arvora nas notas dadas no Untappd, isso é algo facilmente perceptível, haja vista que o próprio site do Bros, mencionado no início, já fez propaganda da Spartacus (olha, mas que coincidência), dizendo: “Spartacus FWIW | Lançamento em 1ª mão | Limitado 4un por pessoa | rating 4,65 [de um máximo de 5]. Olha só o nível dos feedbacks:” e após isso colava alguns check-ins do Untappd.
No entanto, até aquele momento, a cerveja sequer contava com 60 check-ins, um número estatisticamente irrelevante para se traçar qualquer julgamento com base apenas na nota. Então, podemos concluir que essa publicidade era mero hype ancorado no Untappd.
A Saideira
Sim, o hype é real, precisamos conhecê-lo e até mesmo fugir dele. Todas as cervejarias em maior ou menor escala tentam hypar seus produtos, sejam elas nacionais ou locais. Sejam de MG ou do RN. O hype é onipresente. A saída é o cancelamento (foi assim que procedi com a Spartacus e a KSB a preços “normais”).
Música para degustação
Para finalizar, deixo como sugestão musical para degustação de uma cerveja não-hypada o clássico do System of a Down, “Fuck the System”. O hype é o sistema, não olvidem.
FOTO: facebook da KSB
12 Comments
[…] da “imperdibilidade” cervejeira é lastreado, prementemente, no que chamamos de hype (clique aqui e saiba mais), aquele conjunto de elementos imateriais e psicológicos que faz com que valoremos cervejas (ou […]
[…] O foco de entendimento nesse contexto é que, geralmente, cervejas mais acessíveis, sejam de massa ou alguma artesanal mais acessível, é que elas param de despertar certo “desejo cervejeiro” no degustador em função do hype (caso não seja familiar com esse termo, clique aqui). […]
[…] o uso desmedido da lactose (ou sem muito parâmetro, apenas pelo hype – leia mais sobre ele aqui https://papocultura.com.br/hype-cervejeiro-o-que-e/ ) acaba por tornar as cervejas um tanto quanto […]
[…] modo ou de outro já ouviu falar nas famosas NEIPA’s. É uma variante lupulada bastante hypada (clique aqui para saber mais sobre hype) por assim dizer, e que angaria cada vez mais fãs nas mesas de bares de cerveja artesanal mundo […]
[…] e mais enxuta a produção, sem malabarismos ou sem uma proposta de hype (para ler mais sobre hype, clique AQUI) propriamente […]
Concordo que tem uns preços altos por aí. Mas, esse negócio de cancelamento não é nada interessante, esse tipo de atitude não deve ser propagada na internet
Hum, entendi, não deve ser propagado, logo, deve ser cancelado? Quem cancelará os “canceladores”? Ser ou não ser, eis a questão, já dizia Hamlet.
Qual seu argumento? Veio só mandar um “ad hominem” e passar pano para cervejaria mesmo? 🤔🤔🤔🤔🤔🤔🤔
E cerveja boa tem que ser necessariamente caro???
Baita dor de cotovelo, hein?
Cancelamento? Kkkkkkk um cara cheio de diplomas e títulos sugerir cancelamento?!
Lamentável.
Vai beber cerveja ruim então! Kkkkkk
Mais um serviçal de Mamon dá as caras por aqui. Os deuses só existem porque tem quem os cultua. Mamon agradece a sua oferenda Francis(co).
Tira a bunda de trás do computador e vá fazer alguma coisa útil para o mercado ao invés de ficar metendo a boca em quem está dando as caras para fazer coisa boa no Brasil.
Se não quer pagar o preço, vai tomar Skol no boteco da esquina!
Calma, moreno! Tá nervoso? Gosta da sua IPA bem amarga para se sentir macho??? 🤣🤣🤣🤣🤣🤣 Vai ler o BJCP em tailandês para passar o tempo!