SMaSH IPA: a simplicidade cervejeira

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Olá HopHeads!

Hoje vamos falar mais uma vez do estilo preferido dos cervejeiros atualmente, as IPA’s! Mas, ao invés de buscar uma gourmetização do estilo, vamos partir para uma abordagem inversa, a simplificação do estilo.

Para tanto, vamos falar de uma proposição ainda um tanto quanto incipiente no mercado, com pouquíssimas proposições nesse sentido: as SMaSH IPA’s.

O acrônimo, traduzido do inglês, significa Single Malt and Single Hop IPA. Ou seja, são cervejas feitas apenas com um único tipo de malte e um único tipo de lúpulo. Essa proposição simplista, ainda que não simplória, faz toda a diferença na composição final do produto.

Assim, o intento de hoje é analisar o impacto de tal iniciativa na composição derradeira da cerveja, e como um único lúpulo e um único tipo de malte impactam o resultado final.

Importante denotar que a iniciativa é uma simplificação, uma forma de tornar mais viável e mais enxuta a produção, sem malabarismos ou sem uma proposta de hype (para ler mais sobre hype, clique AQUI) propriamente dita.

A produção de uma SMaSH IPA tende a ser sóbria e sem exageros pirotécnicos, algo muito próprio do mercado cervejeiro, muito familiar com várias dessas estripulias de produção, que nem sempre resultam em algo efetivo.

Vamos, portanto, desbravar como a SMaSH IPA é capaz de formar e produzir boas cervejas, sem distrações, sem firulas, e sem subterfúgios marqueteiros (chora Mammon!).

Simplicidade e simplificação

Se existe um pressuposto elementar na produção das SMaSH IPA’s é: simplificar. E isso é algo denotado de modo indelével no processo de produção da cerveja.

O estilo de cervejas IPA tem sido algo bastante exaltado ultimamente, e inclusive alvo de campanha de hype muito forte por parte das cervejarias de ponta (não citarei nomes para não ofender as locais que, porventura, se acham hypadas – mesmo que, de fato, não o sejam – sorry, not sorry).

Todavia, quando se fala de SMaSH IPA, a toada é outra, e diametralmente oposta ao caminho do hype.

A simplicidade é sempre um resultado da simplificação empregada nos ingredientes escolhidos, e isso não é necessariamente um elemento depreciativo da cerveja produzida, de acordo com a mentalidade empregada.

A simplicidade oferecida pelo estilo contrasta com as estratégias do marketing de guerrilha exaltado no presente momento. O hype é o filho preferido do marketing de guerrilha, e, talvez, eles nem tenham cortado o cordão umbilical ainda. Não há agressividade no marketing cervejeiro sem o hype.

Ainda bem que a proposição cervejeira das SMaSH é algo totalmente anti-hype e se resume em: como simplificar ao máximo sem sacrificar a qualidade?

Dado que os elementos elementares de uma cerveja (seja ela uma IPA ou não) são água, malte, lúpulo e levedura, os elementos que mais encarecem o produto final são as cargas magnânimas de lúpulo, em primeiro lugar, e de malte, em seguida.

Simplificando as receitas para que se use apenas um lúpulo e um malte, não se altera a quantidade final utilizada (um dos componentes de maior impacto do preço final), mas, ao menos, simplifica-se o uso diferenciado de várias qualidades de malte e de lúpulo, e pode-se concentrar, de uma maneira otimizada, nas escolhas feitas.

Uma cerveja SMaSH é composta por um único malte e um único lúpulo. Nem mais nem menos: essa é a definição básica do (sub)estilo. Mas, dentro da lista minimalista de ingredientes está um desafio que separa o joio do trigo, o amador do especialista.

Preparar uma cerveja SMaSH elimina a capacidade de contar com uma mistura de sabores de uma miríade de ingredientes. Em vez disso, um cervejeiro deve confiar na técnica, experiência e sua capacidade de cronometrar cada etapa do processo com precisão de laser e chegar ao seu objetivo primordial de ter uma boa cerveja.

De início, uma SMaSH IPA oferece um desafio novo e excitante que serve como um verdadeiro teste de quão refinadas as habilidades de um cervejeiro podem ser. Com apenas um único malte e um único lúpulo, não há onde se esconder. Os sabores e os aromas são bem definidos dentro dos estritos limites do que está posto em termos de ingredientes.

Obviamente, uma cerveja SMaSH também é uma ótima maneira de aprender mais sobre as propriedades de um determinado malte ou lúpulo. Ao eliminar coadjuvantes, aditivos e grãos / lúpulos extras, o verdadeiro caráter de seus ingredientes realmente se destaca.

Conforme se evolui na análise sensorial das cervejas, é possível saborear e mergulhar a fundo em ingredientes específicos e obter um entendimento agudo de seu caráter básico, para que seja mais capaz de defini-los estrategicamente na roda de sabores encontrada. Uma comparação direta pode ser a melhor maneira de se familiarizar intimamente com os ingredientes utilizados.

Uma coisa importante a não esquecer quando se trata das vantagens de fabricar uma cerveja SMaSH é que muitas vezes é muito mais barato do que fabricar algo com uma conta de grãos mais robusta. Com apenas dois ingredientes principais, não se precisa quebrar a banca comprando todos os tipos de maltes especiais ou uma grande variedade de lúpulos para amargor e aroma. A partir da simplificação com dois ingredientes básicos se consegue o elementar de simplificar a produção e conseguir bons resultados.

SMaSH IPA e IPA: quais as diferenças?

Certamente que, o processo produtivo de uma SMaSH IPA e de uma IPA “livre das amarras” da limitação de ingredientes exibem resultados diversos. Caso não houvesse nenhuma diferenciação, não haveria razão de ser da coluna em andamento, muito menos na criação do acrônimo (SMaSH).

O rótulo ou a pecha de SMaSH não garante nada. Por um lado não garante que será uma cerveja simplória (o equivalente depreciativo de “simples”), mas também não garante que será algo popular, ao ponto de sua vendagem ser alta, seu custo de produção baixo, e suas margens altas. Tudo dependerá da avaliação final do produto, apenas a rotulação de SMaSH não é garantia alguma, de nada.

A principal diferenciação que pode ser encontrada em uma SMaSH em comparação com as demais IPA’s, é a questão da variedade nos aromas e nos sabores. Por não combinar vários tipos de malte e de lúpulos, as SMaSH’s acabam se tolhendo às escolhas pré-definidas de aroma e de amargor que o lúpulo escolhido pode provisionar.

Assim, o comum é que se escolha uma variedade de lúpulo que consiga preencher ambas as lacunas, tanto provendo aroma quanto amargor. Exemplificativamente, caso se trate de um lúpulo muito aromático, mas de pouco amargor, ou o inverso, a cerveja tenderá ao desequilíbrio.

Dito de outra maneira, uma SMaSH IPA tende ao meio termo, e nunca aos extremos. Outrossim, ela não tende a ser extremamente lupulada, muito aromática, ou com um amargor altíssimo, mas terá como características elementares ser equilibrada, com um amargor presente (sem agredir) e um aroma herbal e cítrico sem muitas projeções extremistas.

Resumidamente, uma SMaSH IPA é centrão. Não pende nem à esquerda (lupulagem) nem à direita (maltado), em um clara alusão política do que uma produção cervejeira pode ser. Ela nem é progressista, nem é reacionária, é apenas o meio termo daquilo que se pode esperar, ela fisiologicamente não agride.

É sempre uma escolha difícil selecionar um malte que não apague as características de lupulagem que se quer obter e, igualmente, optar por um tipo de lúpulo que seja capaz de suprir ambas as lacunas, a aromática e a de amargor, de modo concomitante e satisfatório. Por mais que seja uma simplificação, produzir uma SMaSH IPA também é um grande desafio para quem se propõe a fazê-la, dado o alto grau de dificuldade em combinar os aspectos envolvidos.

Saideira

SMaSH IPA’s não são o futuro, não são revolucionárias, mas, são algo a se pensar, em termos de produção e de resultado cervejeiro. São sóbrias em sua execução e apresentam resultados satisfatórios, quando se pretende ter uma análise sensorial focada em algum lúpulo específico ou em algum malte em particular.

Desse modo, elas sempre se apresentam como uma execução viável de cervejas de custo acessível aos meros mortais proletários.

Música para degustação

A recomendação de hoje será dupla: cervejeira e gastronômica (haja vista que a coluna se enquadra na categoria cerveja/gastronomia do Blog). A indicação gastronômica é combinar sua SMaSH IPA com seu Smash Burger. Apesar de não terem nada a ver em sua nomenclatura, já que Smash Burger é apenas um Burger mais fino, prensado, e sem a parte pouco cozida no interior, o nome de ambos se parece, daí a associação (mais primária).

Já a recomendação musical, é a música I’m a Believer da banda americana de alternative rock Smash Mouth, nada mais nostálgico que relembrar a trilha sonora da animação do Shrek (nosso ogro favorito) e associar o nome do grupo musical ao estilo cervejeiro analisado!

Saúde, e boas SMaSH’s a todos!


CRÉDITO DA FOTO: Jonathan Moxey

Lauro Ericksen

Lauro Ericksen

Um cervejeiro fiel, opositor ferrenho de Mammon (מָמוֹן) - o "deus mercado" -, e que só gosta de beber cerveja boa, a preços justos, sempre fazendo análise sensorial do que degusta.
Ministro honorário do STC: Supremo Tribunal da Cerveja.
Doutor (com doutorado) pela UFRN, mas, que, para pagar as contas das cervejas, a divisão social do trabalho obriga a ser: Oficial de Justiça Avaliador Federal e Professor Universitário. Flamenguista por opção do coração (ou seja, campeão sempre!).

Sigam-me no Untappd (https://untappd.com/user/Ericksen) para mais avaliações cervejeiras sinceras, sem jabá (todavia, se for dado, eu só não bebo veneno).

A verdade doa a quem doer... E aí, doeu?

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2 Comments

  • PEDRO ROBERTO DE FREITAS

    Fala Lauro, tudo bem?

    Estava a procura de uma matéria que falasse sobre SMASH Ipa para explicar melhor o (sub) estilo para uma cervejaria que trabalho como Social Media, e cara, depois de ler sua matéria, não preciso de mais nada, parabéns mesmo pelo trabalho maravilhoso.

    Obs: Espetacular a sua analogia entre SMASH Ipa e política, de verdade.

    • Lauro Ericksen

      Olá, Pedro!
      Tudo ótimo, e contigo?
      Agradeço demais pela leitura e principalmente pelos comentários gentis. Muito gratificante quando alguém lê um texto que acha relevante e que vai contribuir para a cultura cervejeira!
      Acredito que cultura cervejeira é muito mais que apenas entender os estilos e beber boas cervejas. Isso também, mas a conexão da cerveja com nossos costumes é bem maior, inclusive com repercussões políticas. Sempre tento trazer alguma ideia ou inclinação assim no que escrevo! Bom que você percebeu e gostou do conteúdo!

      Um abraço! E recomendo os demais textos, se puder compartilhar, agradeço ainda mais!

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