#CaminhosdeNatal: Praça André de Albuquerque, primeiro logradouro de Natal

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A atual praça André de Albuquerque, em Natal, corresponde ao ponto tradicional da fundação da Cidade, ocorrida a 25 de dezembro de 1599. É portanto, o mais antigo logradouro público de Natal.

Em 1614 o capitão-mor de Pernambuco, dom Alexandre de Moura, e o ouvidor geral do Estado do Brasil, desembargador Manuel Pinto da Rocha, chegaram à capitania do Rio Grande com a finalidade de proceder a uma averiguação, no tocante às terras doadas na capitania, a título de datas e sesmarias.

Foi um documento firmado naquela ocasião, que aparece pela primeira vez o topônimo Cidade do Natal do Rio Grande.

Igreja de Nossa Senhora da Apresentação

A igreja matriz, iniciada por ocasião da fundação da Cidade na atual praça André de Albuquerque, sofreu muitos estragos empreendidos pelos holandeses, quando de sua expulsão da Capitania do Rio Grande, no começo de 1654.

Ocorreu então, a recuperação no templo, que na ocasião também foi ampliado, suas obras somente foram concluídas em 1694. Trata-se da Igreja Matriz de Nossa Senhora da Apresentação, que foi intencionalmente construída para ser a matriz de uma Cidade, visto que Natal nunca foi Vila.

Sua construção primitiva, embora acanhada nas proporções, atendia a pequena população da Cidade recém fundada. Constituído inicialmente apenas de capela mor, o templo foi, ao longo dos séculos, sendo ampliado, seguindo o traçado previamente elaborado no projeto inicial de 1599. O edifício somente foi considerado definitivamente concluído, em 1862, com a edificação da torre.

A partir do final do século XIX, elementos espúrios de mau gosto estilístico, que comprometiam a leitura da sua arquitetura original, foram sendo incorporados ao templo. Uma restauração realizada em 1995, devolveu a feição original da igreja.

Apesar de quatrocentos anos de existência, aquele templo encontra-se em ótimo estado de conservação e continua fazendo parte da paisagem urbana da praça André de Albuquerque.

Casa da Câmara e Cadeia

Contemporânea da fundação da Cidade, existia também naquela praça, em “rua fronteira à matriz”, a Casa da Câmara e Cadeia, que em 1674 achava-se em ruínas.

Em fevereiro de 1675 foram iniciados os trabalhos de edificação de uma nova Casa do Concelho, também na mesma praça, que à época era chamada de Largo da Matriz.

Essa segunda Casa da Câmara e Cadeia estava em decadência no ano de 1709. É o que informa uma carta enviada pelos Senhores Oficiais da Câmara ao Corregedor Ouvidor Geral, desembargador Gonçalo de Farias Baracho, datada de 17 de agosto de 1709.

Em 15 de maio de 1719 foi concedida uma data de terra, através da qual se comprova que naquela época estava sendo construída uma terceira Casa da Câmara e Cadeia, nas proximidades da velha Casa do Concelho, à época já em completa ruína.

O novo prédio foi também construído na atual praça André de Albuquerque, no local hoje ocupado pela casa de número 608.

Em 1736, aquele prédio foi reformado com a finalidade de nele funcionar a residência do governador da capitania. Foi então ordenada a construção de uma nova Casa da Câmara, o que não foi possível por falta de recursos.

O inglês Henry Koster, em visita a Natal, no final do ano de 1810, informou a respeito da existência do Palácio dos Governadores.

Foi naquele palácio que funcionou o efêmero governo revolucionário de 1817, liderado pelo coronel André de Albuquerque Maranhão.

A citada edificação foi demolida em 1830, quando da conclusão das obras de um novo palácio do governo, na atual avenida Câmara Cascudo.

As obras de construção da quarta Casa da Câmara e Cadeia somente foram iniciadas em 1767, ocorrendo a inauguração do prédio em 7 de maio de 1770. O local correspondente ao referido prédio, invadia parte da hoje denominada rua João da Matta, ocupando completamente o terreno da casa número 604 da praça André de Albuquerque. Existia um estreito beco, entre a velha cadeia e a atual casa número 594 da mesma praça.

O quarto prédio foi o mais sólido e resistente dos edifícios levantados até então na Cidade, com a finalidade de nele funcionarem o Senado da Câmara e Cadeia.

Por ocasião da inauguração de uma nova cadeia, no bairro de Petrópolis, em 1911, aquela velha edificação foi demolida com a finalidade de alargar-se a via de acesso entre a praça André de Albuquerque e o rio Potengi, trecho então conhecido como “Caminho do Dr. Sarmento”, hoje rua João da Matta.

Segundo Olavo de Medeiros Filho, em 1706, já existia a denominação de rua da Cadeia, que era a rua fronteira à matriz. A documentação do antigo Senado da Câmara indica a existência, em 2 de agosto de 1731, da “rua nova desta cidade”. A referida rua estendia-se acompanhando o alinhamento da fachada principal da igreja matriz.

Segundo uma data concedida a Manuel José de Vasconcelos, de 30.05.1767, havia a chamada rua da Matriz, aquela mesma rua da Cadeia.

Documento de 24 de julho de 1816, fazia menção à “praça grande desta Cidade”: Em 13 de janeiro de 1821 surgia pela primeira vez nas doações de terrenos, a denominação rua Grande, assim continuando até 1827, de conformidade com a documentação compulsada.

Em 1888, a praça assume a sua atual denominação, uma justa homenagem prestada a André de Albuquerque Maranhão, o grande líder e mártir da Revolução Republicana de 1817.

Fatos e folguedos

A Praça André de Albuquerque, o mais antigo logradouro público de Natal, foi palco de inúmeros fatos históricos de relevante importância para a Cidade.

A presença da igreja matriz enchia aquela praça de luz e de cânticos produzidos pelas festas religiosas. No Domingo de Ramos, a praça era cenário da Procissão de Fogaréu, em que todos os participantes portavam tochas ou lanternas de papel “recordando a busca dos Judeus e soldados romanos a Jesus Cristo’’.

A Procissão dos Passos, na quinta-feira santa, atraia a maioria da população àquela praça da matriz. Na madrugada do Domingo da Ressurreição, as ‘’campainhas, sinos e foguetões enchiam de rumores a Cidade’’.

No meio do ano, as festas juninas alegravam a praça, com bandeirolas coloridas, fogos, fogueiras e modinhas. O mês de novembro ainda conserva a tradição da festa de Nossa Senhora da Apresentação, padroeira da Cidade. Outrora era comum a queima de fogos na praça e “a rua grande não cabia o povo’’. Em dezembro os festejos natalinos promoviam os autos populares na praça: fandango, bumba-meu-boi, pastoris.

Pena de morte

À época em que havia pena de morte, a antiga rua da Cadeia assistia muda o suplício dos sentenciados à forca. O réu acompanhado do juiz municipal, promotor público, escrivão e porteiro do auditório, saía da cadeia em direção à igreja matriz.

O porteiro do auditório seguia por aquele logradouro público, lendo em voz alta a sentença condenatória. Depois o cortejo seguia até o local da forca, na antiga praça do Peixe, espaço atualmente ocupado pelo prédio do Banco do Brasil, na avenida Rio Branco.

Jardins e paisagens

Até o final do século passado não havia ainda uma preocupação em relação ao ajardinamento da praça. O jornal A República, de 15 de abril de 1896, publicou o seguinte, sobre a praça que na época já era denominada André de Albuquerque: “os dignos moradores da referida praça acham-se muito empenhados em ajardiná-la, contando para isto com o auxílio não só da Intendência como do governo do Estado”.

O projeto então apresentado, reserva o espaço fronteiro à matriz para as festas religiosas. Foram projetadas quatro entradas simétricas, que conduziriam ao jardim através de alamedas de palmeiras. No centro do jardim seria erguido um monumento “que relembre 17, o herói que deu nome à praça, teatro do seu martírio”.

Até o dia 7 de maio de 1896, pessoas da comunidade local já haviam contribuído com 627$000 (seiscentos e vinte e sete mil réis). Ao que parece, o tal projeto não chegou a sair do papel. A Cidade, até o ano de 1905, não possuía iluminação pública; todavia, o cruzeiro fronteiro à matriz sempre estava iluminado. A princípio por um facho e depois por um lampião de azeite. ‘Era a luz única em toda a Cidade”.

Em 1907 começou a ser implantado um projeto paisagístico elaborado pelo arquiteto Herculano Ramos. O projeto consistia de “aterros, aplainamentos de terra, construção de largo passeio de contorno e um pavilhão central”.

Foi ainda construído um belo coreto de ferro batido, caprichosamente trabalhado, sob o qual havia um porão, utilizado para depósito de material de limpeza. O coreto de ferro não existe mais, foi substituído por outro em alvenaria, desprovido da graça dos ornamentos primitivos. Felizmente, aquele coreto de gosto discutível, foi suprimido na recente restauração da praça, realizada pela Prefeitura Municipal, por ocasião dos festejos comemorativos aos quatrocentos anos de fundação da Cidade.

André de Albuquerque

Em 1917, no Centenário da Revolução Republicana, foi inaugurada a Coluna dos Mártires, na Praça André de Albuquerque, defronte à igreja matriz.

André de Albuquerque Maranhão (1773-1817), herói e mártir de Revolução Republicana de 1817, era cognominado de Andrezinho do Cunhaú. Filho do coronel André de Albuquerque Maranhão (1º) e de Antônia Josefa do Espírito Santo Ribeiro. Nasceu Andrezinho no Engenho de Cunhaú, então pertencente à freguesia de Goianinha, RN.

Foi um dos maiores proprietários rurais da então Capitania. Era coronel comandante do Regimento de Cavalaria do Distrito do Sul da Capitania. Fidalgo Cavaleiro da Casa Real, por patente de 22 de agosto de 1811, e Cavaleiro da Ordem de Cristo.

Andrezinho de Cunhaú faleceu solteiro, no chão úmido da casamata existente na Fortaleza dos Reis Magos, na madrugada de 26 de abril de 1817, em consequência do ferimento de espada por ele recebido no baixo-ventre.

Não deixou descendência. Seus restos mortais repousam no interior da igreja matriz de Nossa Senhora da Apresentação, o primitivo templo da Cidade, sempre presente na paisagem urbana daquela praça.

Desconhecia-se o local da sepultura de André de Al-buquerque Maranhão, no interior da Igreja Matriz, até 1995, quando prospecções arqueológicas revelaram os restos mortais do grande herói potiguar.

Jeanne Nesi

Jeanne Nesi

Superintendente do IPHAN-RN, Sócia efetiva do Instituto Histórico e Geográfico do RN, e Sócia correspondente do Instituto Histórico Geográfico e Arqueológico de PE. Fundou a Folha da Memória, com periodicidade mensal. Publicou cinco livros, sendo dois como co-autora. Publicou folhetos, folders e cordéis e mais de 300 artigos sobre o assunto em uma coluna semanal no jornal Poti, na Folha da Memória e em revistas do IHGRN.
Atualmente aposentada, mas sempre em defesa do patrimônio histórico.

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