#CaminhosdeNatal: Rua da Conceição, a segunda rua da capital

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Até o ano de 1700, existiam em Natal apenas duas ruas: a da Cadeia e aquela que era chamada O Caminho do Rio de Beber Água, hoje representado pelas ruas Santo Antônio e Conceição. Aquele rio de Beber Água era o antigo Rio Tiuru, Tissuru, da Cruz ou do Baldo.

Registro de concessão de terras, de 6 de agosto de 1791, refere-se à rua da Conceição atual, àquela época descrita como a “rua direita, que vai por detrás da matriz”.

Em 1808 apareceu, pela primeira vez, a denominação da rua da Conceição, conforme documentação relativa a uma doação de terras, concedida pelo Senado da Câmara do Natal, em 14 de junho de 1808, a Antônia Rita.

Em data anterior a 1791, a atual rua da Conceição constituía-se apenas das cercas que limitavam os fundos dos terrenos, cujas frentes estavam voltadas para a rua da matriz.

Existia também no lado do poente o Armazém Real da Capitania do Rio Grande, do qual ainda resta uma relíquia histórica: a parede de sua fachada posterior, construída em alvenaria de pedra e cal. Esse imóvel, de propriedade do IPHAN, é popularmente conhecido como casa do padre João Maria.

O primeiro sobrado particular de Natal

O capitão José Alexandre Gomes de Melo recebeu uma doação de terreno, em 21 de agosto de 1819, “para fazer casa no fundo da sua, em que mora, na rua da Palha”. A casa residencial já existente, onde morava José Alexandre foi o primeiro sobrado particular construído em Natal. O prédio chamado “sobradinho” ainda existe na rua da Conceição, encontrando-se tombado em nível nacional, nele funcionando o Museu Café Filho.

Em 1822, segundo informação de Pizarro e Araújo, existia o edifício da Fazenda Pública, na rua da Conceição, no mesmo local hoje ocupado pelo edifício do Palácio do Governo.

Até o início deste século, a rua da Conceição era pouco habitada, nela ainda havendo terrenos desocupados. Segundo Câmara Cascudo, “em 1834 havia um matagal espesso num dos lados. Tão denso que escondeu durante duas horas, os assassinos do tenente-coronel José Leite do Pinho”.

Em 1897 a Intendência Municipal realizou um recenseamento urbano. Joaquim Severino, o agente encarregado do censo da rua da Conceição, registrou a existência de 33 casas e 204 habitantes.

Origem do nome Rua da Conceição

Com o objetivo de instalar o parque do atual Palácio do Governo, foi derrubado, em 1908, um trecho da rua da Conceição. Em 1914, outro quarteirão foi demolido, a fim de ser construída a atual Praça 7 de Setembro. Uma das casas destruídas era conhecida como a “Casa do Nicho”, a antepenúltima à esquerda, antes da atual Ulisses Caldas”. Aquela casa apresentava, na parede de sua fachada principal, um nicho “fechado com portinhas de madeira. Abrigava um vulto de Nossa Senhora da Conceição, padroeira da rua e origem do topônimo”.

A Casa do Nicho tornou-se um ponto de romarias, onde o povo parava para rezar, acender velas e pagar promessas. A edificação pertencia a Joaquim Inácio Pereira (o 1º), passando posteriormente por herança, às mãos do seu filho homônimo, o Comendador e Vice-Cônsul de Portugal, Joaquim Inácio Pereira (o 2º).

Em meados do século XX, Luís da Câmara Cascudo localizou aquela imagem de Nossa Senhora da Conceição, em poder da viúva de Calixtrato Carrilho, ldalina Pereira Carrilho. Assim Cascudo descreveu a imagem:

“É uma figura de 29 centímetros e meio de alto, esculpida em madeira, num relativo estado de conservação. Tem as mãos postas, os pés ocultos em nuvens, de onde emergem cinco cabecinhas de anjos, encimando-a uma coroa de prata, já escura, de pobre lavor. É trabalho de influência nitidamente portuguesa, denunciando a prestigiosa tradição dos santeiros de Braga, especialmente no manto ornamental, azul-e-oiro, no exterior e vermelho-e-oiro na parte interna. O manto não recobre a cabeça da imagem mas o faz um pano branco, com verso imitando brocado. Está com o pescoço nu, gola deitada e olhos de vidro’’.

A primeira bebida gelada servida em Natal

Na rua da Conceição existiu um outro palácio, que serviu de sede ao Poder Executivo no período de 1862 a 1869, o qual foi demolido juntamente com outros prédios, para nos terrenos ser construída a Praça 7 de Setembro.

Naquele velho palácio realizou-se um dos mais famosos bailes em Natal, no dia 2 de dezembro de 1868, em cuja ocasião foi servida, pela primeira vez na Cidade, bebida gelada. O gelo veio a Natal, embarcado desde o Recife.

Jornais natalenses

No final do século XIX, concentravam-se na rua da Conceição, os principais jornais natalenses. “Ali vibravam as grandes folhas que apaixonavam centenas de correligionários e enfureciam outras centenas adversas.

Ali viveu A Situação, do Dr. Henrique Câmara, em 1877, O Correio de Natal, de João Carlos Wanderley, em 1878; A Liberdade, órgão do Partido Liberal, em 1885; O Nortista e o Diário de Natal, de Elias Souto, 1895; A Capital, em 1908, de Galdino Lima, Honório Carrilho e Juvenal Antunes e dezenas de jornaizinhos impressos nessas tipografias”.

Existia ainda naquela rua, o Bilhar Americano, a Alfaiataria de Gabriel Narciso Aranha, o Armarinho de Manuel Joaquim da Costa Pinheiro e a Padaria Flor de Natal, além de várias casas residenciais.

Mutilações arquitetônicas

No terceiro quartel do século XX, a rua da Conceição sofreu outra mutilação, perdeu outro quarteirão constituído de valioso casario colonial, para dar lugar ao imponente e moderno prédio da Assembleia Legislativa.

Em recente restauração empreendida na praça por detrás da igreja matriz, pela Prefeitura Municipal de Natal, o Caminho do Rio de Beber Água perdeu a sua principal característica, que era a ligação entre as ruas da Conceição e de Santo Antônio. O trecho foi fechado com o objetivo de ampliação da praça Padre João Maria. Uma pequena obra que prestou um grande desserviço à memória cultural da Cidade.

Atualmente a rua da Conceição está reduzida a um pequeno trecho. Nela destacam-se os prédios do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte, o Museu Café Filho, instalado no velho sobradinho e a casa onde hospedou-se o padre João Maria, quando chegou a Natal, para assumir a paróquia de Nossa Senhora da Apresentação.


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Jeanne Nesi

Jeanne Nesi

Superintendente do IPHAN-RN, Sócia efetiva do Instituto Histórico e Geográfico do RN, e Sócia correspondente do Instituto Histórico Geográfico e Arqueológico de PE. Fundou a Folha da Memória, com periodicidade mensal. Publicou cinco livros, sendo dois como co-autora. Publicou folhetos, folders e cordéis e mais de 300 artigos sobre o assunto em uma coluna semanal no jornal Poti, na Folha da Memória e em revistas do IHGRN.
Atualmente aposentada, mas sempre em defesa do patrimônio histórico.

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