Em seu quarto e mais ambicioso filme, a roteirista e diretora Paula Pardillos transforma o horror em uma lente para uma crítica social urgente. O curta-metragem Olhe Atrás da Cortina enfrenta o gaslighting e os mecanismos sutis do abuso emocional que corroem a identidade e a autoestima. Por meio de ambientes íntimos, enquadramentos que isolam e da metáfora perturbadora de um buraco negro (que consome e distorce tudo ao seu redor), o filme revela como a misoginia atua silenciosa, porém devastadoramente. É uma obra que mescla a tensão visceral do cinema de gênero com uma consciência política aguçada, firmando Pardillos como uma das vozes mais contundentes do terror contemporâneo brasileiro.
O filme tem pré-estreia com acesso gratuito nesta quinta e sexta, no Auditório do Departamento de Comunicação Social (DECOM) da UFRN. Na quinta-feira, a programação inclui mesa redonda sobre terror em Natal com Márcio Benjamim, Davi Revoredo e Paula Pardillos, a partir das 19h. Na sequência, a exibição do curta, com 16 minutos de duração. E logo depois, bate-papo com a equipe do filme. Na sexta a pré-estreia terá recursos de acessibilidade e tem início às 18h com a exibição do longa-metragem A História da Eternidade (de Camilo Cavalcante, 2014). Às 20h, exibição do curta de Paula, e às 20h20, bate-papo com a equipe, acompanhada por intérprete de Libras.
O filme parte de um cenário intimista, mas não restrito: um espaço onde relações interpessoais são
atravessadas por poder, desconfiança e distorção. A protagonista, gradualmente privada de sua própria
noção de verdade, vive o apagamento emocional que tantas mulheres enfrentam em ambientes
abusivos, seja no âmbito doméstico, profissional ou social. Em Olhe Atrás da Cortina, o abuso não é
mostrado de forma explícita ou espetacularizada, mas sim sentido através de diálogos que minam a
autoconfiança, enquadramentos que isolam e diminuem, e uma direção de arte que constantemente
sugere instabilidade e opressão.
O buraco negro, símbolo central do filme, traduz esse processo: ele suga a luz (metáfora para a energia
vital, a autoestima e os laços saudáveis) e distorce tudo ao redor, assim como a manipulação distorce
memórias, significados e até a própria identidade. A presença constante desse elemento reforça a ideia
de que a violência simbólica não precisa de contato físico para deixar marcas profundas.
Essa abordagem reafirma o compromisso de Paula Pardillos com o terror como um instrumento crítico e político. Ao usar a estética do gênero para discutir misoginia e controle psicológico, ela expande o alcance da narrativa e cria um diálogo com debates urgentes sobre violência contra a mulher.
O filme se insere em uma tradição internacional de cineastas que utilizam o terror para expor desigualdades, mas preserva uma assinatura muito particular: a fusão entre a sensibilidade íntima e o rigor narrativo.
Olhe Atrás da Cortina é o primeiro filme de Paula Pardillos realizado com orçamento profissional. A produção reuniu novamente sua equipe de longa data: artistas e técnicos que têm acompanhado sua trajetória desde seus primeiros trabalhos independentes, feitos com recursos mínimos. Mesmo diante de um cenário adverso de produção audiovisual no Rio Grande do Norte, marcado pela escassez de políticas públicas, Paula construiu uma filmografia reconhecida em mais de 30 festivais nacionais e internacionais, conquistando prêmios e consolidando-se como uma das principais vozes do terror contemporâneo no estado.
Neste novo projeto, a diretora busca não apenas fortalecer sua presença no cinema brasileiro, mas também ampliar sua inserção no circuito internacional, reafirmando que o horror pode — e deve — ser um espaço para discutir o que há de mais urgente na sociedade.
Paula Pardillos
Paula Pardillos é roteirista, diretora e crítica de cinema, com atuação marcada pela dedicação ao gênero do terror. Seus três primeiros filmes (Distorção, Womaneater e Lia Ficou Sozinha em Casa) foram realizados com recursos próprios ou orçamentos reduzidos, mas conquistaram espaço em mais de 30 festivais e receberam diversos prêmios.
Pardillos, que é autista, encontrou no cinema e na escrita suas formas mais potentes de expressão, construindo um universo autoral a partir de vivências pessoais. Sua relação com o horror vai além do entretenimento: cada obra transforma emoções e memórias em narrativas viscerais, com o desejo de mover e transformar o espectador.
Em Distorção, ela explora o medo fomentado por uma mídia sem escrúpulos, num comentário social incisivo; Womaneater investiga as cicatrizes de um relacionamento abusivo, revelando os monstros psicológicos que ficam; e Lia Ficou Sozinha em Casa mergulha na solidão do luto infantil, evocando a ansiedade sobre aquilo que não se compreende.
Todos os seus — agora quatro — curtas-metragens acontecem dentro de um apartamento. As histórias buscam extrapolar o que existe profundamente, manifestando criaturas fantásticas que representam o tema do filme e o medo da protagonista.
PROGRAMAÇÃO DA PRÉ-ESTREIA:
- Data: 16/10 (quinta-feira).
- Horário: 19h.
- Local: Auditório do Departamento de Comunicação Social (DECOM) da UFRN.
- 19h: Mesa redonda sobre terror em Natal com Márcio Benjamim, Davi Revoredo e Paula Pardillos.
- 20h: Exibição do curta-metragem Olhe Atrás da Cortina (16 minutos).
- 20h20: Bate-papo com a equipe do filme.
PROGRAMAÇÃO DA PRÉ-ESTREIA COM RECURSOS DE ACESSIBILIDADE:
- Data: 17/10 (sexta-feira).
- Horário: 18h.
- Local: Auditório do Departamento de Comunicação Social (DECOM) da UFRN.
- 18h: Exibição do longa-metragem com recursos de acessibilidade A História da Eternidade (de Camilo Cavalcante, 2014).
- 20h: Exibição do curta-metragem Olhe Atrás da Cortina também com recursos de acessibilidade (16 minutos).
- 20h20: Bate-papo com a equipe do curta-metragem, acompanhada por Intérprete de LIBRAS.
(O auditório fica localizado no prédio do DECOM, atrás da TVU; a parada do Circular mais próxima é a Parada da Reitoria).
CURIOSIDADES DO CURTA
Locação
Olhe Atrás da Cortina teve sua locação construída do zero por Rogério Ferraz e Rodrigo Bruggeman a partir da visão e da decupagem de Paula Pardillos. Foram dois meses entre a construção e a preparação da equipe de arte, liderada por Pedro Balduino e Vitória Ventura, para deixar tudo pronto para as cinco diárias de gravação. Esse trabalho foi necessário porque Paula havia visualizado o filme por inteiro em sua decupagem e, além disso, há uma cena curta na qual uma parede se move, o que seria impossível em uma locação real.
Trilha Sonora
A trilha sonora original do filme nasceu inspirada pela harmonia e presença do Movimento Armorial e se expandiu com uma canção de forró composta especialmente para o filme. No cenário, objetos típicos reafirmam a presença da cultura regional. A equipe é formada por profissionais locais, incluindo os
atores, que trazem à tela seus sotaques e modos de falar, preservando a cadência própria do nosso lugar.
Canção original
A canção original do curta se chama “Se Você Insiste”, letra e música do produtor do curta, Sihan Felix, livremente inspirada em Carta Branca, de Beto Caju e Marquinhos Maraial. Intérprete: Abmael (Abi, vocalista da banda Stone Glass). Harmonia e instrumental por Isaque Silva Nascimento, também responsável pela edição e mixagem junto a Paulo Dantas.
