Velho entusiasta do presente

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Sim, sou um velho, amigo leitor. Assim fui classificado por uma de minhas leitoras. E se quer saber, nem a conhecia. “Seus textos transmitem a sensação de uma pessoa cansada, meio ultrapassada”, disse a jovem. Senti-me um personagem de um conto qualquer de Jorge Luís Borges ou aquele avô-garotão, ainda acreditado que o mundo é como antigamente. E um dia esse avô senta na velha poltrona e olha ao redor, cai na realidade, assusta-se com o tempo; com o inexorável e passa a viver de lembranças.

É que o progresso virou mito. A nova geração carece do novo. E as novidades nos chegam a toda hora, em tempo real. Uma enxurrada delas. E se costumo escrever do marasmo arquejante de Santa Rita, a garotada arremete-se como contra uma múmia do passado. E chamam-me “cansado, ultrapassado”. Ora, mantenho os ares da renovação em mesmo tom, desde sempre. E não há como fugir. Se o mundo avança é ao redor do Sol. Uma hora esta geração Y descobrirá a nostalgia e sentirá o mesmo pesar.

Se escrevo sobre estas banalidades cotidianas, da vida nas calçadas, é porque sei recriminar estas novidades passageiras, imerecidas mesmo para uma crônica semanal, destas mais leves, logo esquecidas. Não escrevo para velhos, amigo leitor. Talvez para jovens que não sabem envelhecer. Nos braços seguros do passado moram segredos. É onde habita, sim, a nostalgia. E dela, as recordações mais gostosas, a acalentar a alma em horas mais soturnas. E se lembro das nostalgias é porque comparo com este tempo-hoje de tantos cinzas.

A vida virou espetáculo. Somos filmados mesmo quando contemplamos o pôr-do-sol em Ponta Negra. Questão de segurança! Somos mirados; feridos por olhares burocratas, palavras e gestos a toda hora. Prefiro a contemplação descansada dos faróis ou a vida mansa daquelas vilas pouco iluminadas. Se retenho algo desta contemporaneidade é o status de “blogueiro”. Antes fosse poeta à moda antiga. É que resta destes escritores de alma mais lírica um saudosismo gostoso. E felizes à margem do banal, procuram nas manhãs chuvosas de uma terça o aconchego daquelas putas velhas que não o deram tempo de casar.

Sérgio Vilar

Sérgio Vilar

Jornalista com alma de boteco ao som de Belchior

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1 Comment

  • Theo Alves
    Theo Alves

    o bom de ser velho, meu amigo, é a certeza de já ter vivido muito

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