Santos e festas do mês de junho

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As festas juninas remetem-nos para velhos tempos, acalentam lembranças da infância, fazem recordar fatos e encantos do passado. Evocam-se santos alegres, festeiros, ligados a crendices e superstições, com forte apelo popular e que vão além da convicção religiosa.  Quem fica indiferente a uma rua embandeirada, ao colorido das roupas das quadrilhas, ao ritmo do baião e do forró, à visão ou ao cheiro das canjicas, das pamonhas, dos bolos e do milho assado?

Menino do interior, tive a sorte de passar várias festas juninas nas fazendas Riacho e Favela, terras do meu avô materno, seu Chiquinho, em São José de Campestre. Noites alegres, inesquecíveis, rojões, busca-pés, traques, e estrelinhas; muita comida de milho, sanfona e pandeiro, tudo e todos ao redor de enorme fogueira.

A família reunida e meu avô no comando, pois era o mais animado do grupo.  Com requinte, sabia puxar quadrilha, quando não faltavam palavras de ordem com timbre francês: balancê, anavantur, anarriê, travessê, e por aí seguia.

Lembro que um jovem vaqueiro da fazenda Riacho convidou-me para ser seu compadre de fogueira. Sobre dois tições em brasas, feito uma cruz, o aperto de mãos selava o compromisso, ao se repetir quatro vezes, mudando de lugar: “São João disse, São Pedro confirmou, que nós fôssemos compadres, que Jesus Cristo mandou.”  O vaqueiro Chico Borges, que depois se transformou em dono de parte da fazenda, levou a sério aquele contrato e, ao longo do tempo, fomos compadres de verdade, nas saudações e na amizade.  Chico Borges morreu ainda moço, por doença cruel e rápida. Seu compadre de fogueira, mesmo médico, tentou ajudar, mas nada pôde fazer.

A devoção popular atribui a Santo Antonio a graça de operar milagres, para atender suspiros e preces de moças à procura de um noivo.  Tenho uma amiga, já com muitos natais, que ainda não perdeu a esperança, pois o seu Santo querido “tarda mas não falta”.

Muitas dessas crenças e crendices vieram com os portugueses para o Brasil, conforme estudos de Câmara Cascudo e de outros folcloristas. Alguns anos atrás, visitei a Igreja dos Mártires, em Lisboa, localizada na rua Garrett, no Chiado. É uma linda igreja, reconstruída depois do terremoto de 1755. A fachada fica quase rente à rua e vis-a-vis com o famoso bar A Brasileira, que tem a figura em bronze de Fernando Pessoa, sentado a uma mesa da calçada, a escutar – quem sabe? – os sinos da sua aldeia. Nas laterais da nave principal da Igreja, existem altares de santos bem conhecidos, todos adornados com flores e com velas luzentes deixadas pelos devotos. Porém o altar mais florido e com real profusão de velas era o de Santo Antonio. Assim, lá como aqui, ainda são muitas mulheres à espera do dia de dizer “aceito”, embora estejam em voga o ata e o desata dos novos casais. Parece até que o Antonio lá de cima só atua na fase da escolha, mas não fornece termo de garantia.

São João é o mais festeiro dos três. Não é à toa que a fogueira vincula-se ao seu dia, 24 de junho, quando Isabel fez queimar a lenha para avisar à prima Maria o nascimento de João Batista. E São Pedro, pescador da Galileia e protetor das viúvas? Não precisa dizer nada, basta relembrar que ele tem nas mãos as chaves do céu.

Daladier Pessoa Cunha Lima

Daladier Pessoa Cunha Lima

Primeiro reitor eleito da UFRN. Exerceu o cargo de 1987 a 1991. Graduado em Medicina pela UFRN (1965), tem especialização em Medicina do Trabalho e Administração Universitária, com vivência em instituições universitárias no exterior. Ao se aposentar, abdicou da Medicina e optou pela Educação, tendo se dedicado à instalação da FARN, atual UNI-RN, no ano de 1999. É, ainda, membro da Academia de Medicina do RN e do Instituto Histórico e Geográfico do RN. É autor dos livros Noilde Ramalho – uma história de amor à educação e Retratos da Vida, além de outras publicações. E em abril/2017 foi eleito para a cadeira nº 3, da Academia Norte-rio-grandense de Letras.

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