Não sei bem se foi Millôr Fernandes quem disse, referindo-se a Curitiba, que ritiba significa do mundo. Coisa de humorista que faz de tudo para não perder uma piada.
Na verdade, Curitiba é cosmopolita e civilizada, talvez a mais civilizada das cidades brasileiras.
A qualidade de vida revela-se, por exemplo, no eficiente sistema de transportes coletivos urbanos.
No que se refere ao turismo, Curitiba é uma das poucas cidades que a exemplo de Nova York, conta com uma linha de ônibus especial que circula nos principais pontos turísticos. O roteiro começa na Praça Tiradentes, em pleno centro, a cada trinta minutos, das 9h às 17h30, mas é possível iniciá-lo em qualquer um dos pontos. “Para embarcar, você compra uma cartela com cinco tíquetes e tem direito a um embarque e quatro desembarques” – diz o folder. O referido é verdade, dou fé.
São vinte e cinco pontos, nove dos quais, parques e/ou bosques. Visitei os seguintes, na ordem de preferência: Museu Oscar Niemeyer, Ópera de Arame, Setor Histórico Jardim Botânico, Shopping Estação (com três pequenos museus: Ferroviário, da Farmácia e do Perfume), Torre Panorâmica, Santa Felicidade (bairro italiano, de tradições gastronômicas), Mercado Municipal e Universidade Livre do Meio Ambiente. Tudo isto, sem falar na Rua das Flores que é a sala de visitas da cidade e, perto dela, a Rua 24 Horas, galeria que nunca fecha.
Quando estive aqui pela primeira vez, há cerca de 15 anos, não havia muitas destas atrações.
Cidade sem praias, sem os encantos naturais de uma Salvador, de um Rio de Janeiro, Curitiba soube criar os próprios atrativos turísticos. A prova está nesse inteligente circuito.
NOSSA “CALLE FLORIDA”
Manhã de inverno, o frio dói na face e nas mãos nuas. Céu de puríssimo azul, como no hino. (O inverno aqui não é a estação das chuvas). Saio flanando na Rua das Flores – a “Calle Florida” de Curitiba. Primeira rua de pedestres do Brasil – me informam –, cópia ao que parece do modelo portenho. Depois, calçadões semelhantes se multiplicaram país afora. Não há uma grande cidade brasileira que não tenha, pelo menos, um. Mas nenhum superou este daqui – o número um em todos os sentidos –, largo e comprido, e belo, com seus canteiros floridos suspensos, seus arranha-céus, seus sobrados bem conservados.
Curitiba sabe cuidar dos monumentos arquitetônicos de valor histórico e artístico. E note-se que, sendo relativamente jovem, não se pode considerar uma cidade histórica. Mas aparenta ser – no centro, é claro.
A BOCA MALDITA
Já próximo à Praça Gal. Osório, onde a Rua das Flores desemboca, dois cafés defronte um do outro concentram animadas rodas de conversas. Senhores idosos fogem da solidão, falando da vida alheia. É a Boca Maldita, assim denominada, com muito senso de humor, pelos próprios curitibanos.
Dizem que Dalton Trevisan, o mais curitibano dos escritores, ali aparece, vez ou outra. Quem sabe até o Vampiro de Curitiba, na calada da noite, caladíssimo e esquivo, como Dalton, seu criador, passe também por lá.
MUSEU DE ARTE
A dois passos da Boca Maldita, encontra-se o Museu de Arte Contemporânea, visita obrigatória. Curiosamente esse reduto da vanguarda, com suas instalações, suas extravagâncias, está instalado num palacete de fins do século XIX (ou começos do século XX), aliás, muito bem restaurado.
HABEAS-CORPUS
Caminhando, caminhando. Sem dúvidas, é a melhor maneira de se conhecer uma cidade. Cuidado, porém, com o trânsito intenso nas largas avenidas curitibanas.
Atropelado por um carrinho de pipoca, escapei ileso.
VISITA AO MUSEU NIEMEYER
Sem o gênio Niemeyer, que teria a moderna arquitetura brasileira para legar às futuras gerações? Muito pouca coisa além de espigões fadados à implosão. Razão tinha Darcy Ribeiro quando disse que Niemeyer, dentre as atuais expressões da inteligência nacional, é o único cuja memória sobreviverá ao milênio, e suas obras ficarão, como a Acrópole de Atenas, per omnia saecula saeculorum…
É o que me ocorre diante do “Olho”, a espetacular torre do Museu Oscar Niemeyer, sem dúvidas, a melhor atração do roteiro turístico e cultural de Curitiba.
Tive sorte, havia duas exposições do meu especial interesse: “Pancetti” e “A Minha Casa Baiana”, a coleção de Odorico Tavares, com obras de Portinari, Di Cavalcanti e… Pancetti, entre outras, e mais: imagens barrocas, desenhos, gravuras, alguns móveis antigos. Beleza.
ÓPERA DE ARAME
Nunca vi e, com certeza, nunca verei um teatro como a Ópera de Arame. Todo armado com uns tubos metálicos e vidro, parece mesmo de arame…
A localização é perfeita: na periferia da cidade, dentro de uma nesga de mata preservada, junto à barranca de antiga pedreira, de onde salta uma cascata…
Detalhe curioso: passarelas em dois planos têm como piso, tão-somente, grades de aço. De modo que se a pessoa que estiver no piso inferior olhar para cima poderá ver algo inusitado. Visitantes do sexo feminino, cautelosamente vestem calças. Calças compridas, é claro.
JARDIM BOTÂNICO
Nada se compara com a elegante simetria da grande estufa do Jardim Botânico. Ela tem aquele ar hierático de templo grego, ou melhor, de templo romano, o teto recurvo, semelhando cúpulas. No meio da colina verde, presidindo o amplo jardim… Cartão postal.
Logo ao lado, o Espaço Cultural Krajcberg é imperdível.
EM TEMPO
Ia esquecendo de falar no Parque Barigui, que oferece, além do verde, o Museu do Automóvel, um dos melhores do Brasil no gênero.
———— CRÉDITO DA FOTO: Jimmu Palhano