O MORTO
Despido de azul e de paisagem
O morto está.
Silenciosa semente de carne
Aguardando as raízes.
Sem pai, sem mãe,
Sem casa,
Sem sono.
Até sem mortos
O morto está.
Não lhe resta lembrança alguma,
Ignora a tarde e as flores
Que o cobrem
E a escura casaca
Com que o vestiram um dia.
Não tem pranto nos olhos.
Não tem olhos,
Nem saudade,
Nem lembrança.
Nem ele mesmo se possui
Nem mesmo alma.
Apodrecida semente
Que espera raízes,
Assim o morto está:
Incompleto, inconseqüente
E só.
Sem presença
Sem confiança de que será terra,
Infinito,
Assim o morto está.
Os sinos da cidade
Não o despertarão nunca.
Por que, então, o vosso pranto, Senhora?