Croniketa da Burakera #13, por Ruben G Nunes
Vige! A globalização tá “amarelando”, mano! Olha só, deu na mídia semana passada: China é a
segunda economia do mundo. Passou o Japão. Colou nos EEUU. Dominio global do capital
“amarelo”: China, Japão, “tigres asiáticos”.
Mas o mundo tá “amarelando” mesmo é de medo dos “poderes-atípicos” que estão surgindo
da base da pirâmide social global. Nos lumpens. Nas favelas. Nos guetos. Nas máfias. Nas facções.
Nas milícias. Nos presídios. Nos grupos terroristas. Nos black blocs.
Enfim, na Multidão, esparsa, dispersa, se organizando-desorganizadamente, no improviso de sua
própria diversidade, por cima de pau e pedra, como multipoderes, diferenciados, independentes,
multifacetados, agressivos, fanatizados – e ao mesmo tempo parasitas dos poderes juridicamente
constituídos e do movimento do Capital.
Multidão, observe-se, no sentido atual da concepção de Hardt&Negri, em seu Império, de 2000,
onde analisam a nova ordem política da globalização, em seus avanços e quebras ideológicas,
teóricas e práticas. Concepção de Multidão em que das várias camadas dos “bolsões de miséria”
surgem grupos sociais independentes, contestadores da distribuição de renda e do “jogo político
de interêsses” de grupos dominantes que instituem e detêm o Poder.
Não necessariamente ideológicos, mas sempre transgressores da ordem instituída, esses grupos egressos
da Multidão, se constituem em “poderes-atípicos”. São poderes dentro do Poder. Traficantes, marginais,
contraventores vários, terroristas, etc, que em todos os níveis possuem o poder de fato de armas pesadas,
de redutos impenetráveis e táticas sociais de arrastões, assaltos, saques, incêndios, depredações,
redes sociais, etc.
O que quero dizer é que, ao lado do poder do terrorismo, há uma expansão incontrolável dos poderes
dos Estados Gerais da Bandidagem, e das Multinacionais do Narcotráfico. Poderes-atípicos que estão
tomando conta do pedaço, perigosamente, como forças organizadas. E que praticam abertamente e
impunemente a pena de morte.
Dia-a-dia o Narcotráfico, corrompe todas as dimensões do Poder, dos Estados, da Política, da Produção,
do Consumo, da Civilização, da Cultura. Tudo deformando-e-banalizando, moral e eticamente.
Vamos tentar focar com uns closes mais ajustados esses “poderes dentro do Poder”. Vamos dar uns closes
nesse fumacê social em que se gesta a violência urbana, pra gente sentir o tamanho da encrenca em que
estamos metidos. Não só no Brasil, mas em todas as nações, com algumas exceções. Vamulá!…
CLOSE-UM:
O mundo está em trabalho de parto. Da moral ao celular, da ética à tecnologia, da corrupção do
poder à corrupção social. Da ONU ao DNA.
Tudo é gestação da violência banalizada e organizada pela drogalhada. Favelas, lumpens, máfias, cartéis,
facções, guerrilhas, se tornam a ferro-e-fogo poderes dentro do poder; se tornam autossustentáveis.
E ditam a alucinante banalização da violência.
Ética vira trapaça. Teoria aqui é cego em tiroteio. Vida humana é detalhe. O sujeito-da-droga é frio.
Não vibra. É pré-e-pós-humano. É antivida, anticuidado, antisolidariedade. É anti-amor.
O drogueiro é morte pura de si e da sociedade. Morte cotidiana: assassinatos : por violência e bala perdida.
Segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) em 5 anos houve no Brasil 278.839 assassinatos por
conta da violência. No mesmo período na guerra da Síria houve 256.124 mortes.
Ou seja: a violência descontrolada brasileira mata mais do que a guerra da Síria: quase 60.000 assassinatos
por ano!
Como surge essa tronchura social?
CLOSE-DOIS:
Dezenas, milhares, de drogueiros surgem das favelas, da grana fácil, das bravatas do tráfico,
da paranóia dos tiroteios, das disputas de pontos.
São criações nossas. Das injustiças sociais. Da educação furada. Dos programas assistencialistas fajutos.
Dos Direitos dos “Manos”. Da democracia de cabresto. Da neuro-ganância do Capital. Da esquerdopatia-fanaticóide.
Sim, eles, os traficantes, são nossos. Como nós somos deles. São criações de politicalhas e corruptoses humanóides.
São deformações sociais de nós mesmos. Pesadelos sem retorno. Os Estados Gerais da Bandidagem são
suprafederativos. Quase globalizados.
Eles são eles. Têm suas festas e tradições. Cada Ano-Novo dão festas de arromba, com meia hora de queima
de fogos. Tudo na rua. E nas lajes. Festa popular mesmo. Com superprodução de vídeo e web-divulgação
no YouTube. Cultura, chefia, cultura !
CLOSE-TRES:
Festança de réveillon na Travessa Jurupis, Morro do Samba, Diadema, São Paulo. Domínio do
megatraficante Birosca, bigboss do PCC.
Rola tudo. Charutões de maconha, pedronas de cracks, bandejas generosas de pó e cafungadas com canudinhos
de 1 dólar. Bebida-comida grátis e bandas se revezando. Menores soltos na buraqueira, aprendendo a ser mais um.
Voz arrastada, o animador da festa repete no microfone “Graças a Deus e graças à ‘firma’, esse evento tá sendo
realizado… Isso aqui é pra mostrar c’a gente faz acontecer, tá ligado?… Num tem governador, num tem presidente,
num tem polícia, num tem político, num tem vereador, num tem nada, meu! Nada! O mundo tá amarelando de nóis,
tá ligado?!… É nóis, maluco, é nóis!!!”.
Tráfico é Poder. Violência organizada. O banal no último registro de si mesmo. É nóis e pronto! O resto não interessa.
Se o governo dá bolsa família, se constrói escolas, se há mais polícias – tantofazporra! tofa-se! Nem fede, nem cheira.
O tráfico se faz por si: é crente, fiel, autônomo, cult e fashion. A bandidagem criou moral profissional. Do nosso
lumpen favelat, surge novo ser social: o marginal-fashion-for-export. Ele é o cara! Que mata por nada e por
sua comunidade. Mesmo preso. Nada o intimida. Tudo é lucro. Tudo é corrompível. Desde o Governo até o guarda
do presídio.
Nisso, educa suas crianças. Não tem volta. Eles somos nós. Avessos de nossos avessos. Excluídos que nos excluem.
São humanos ou pós-humanos? Não sei. Sei que com as tais leis cidadãs, direitos humanos, teorias de
ressocialização e bolsas-esmolas, criamos dentro do Estado Organizado um poderoso Estado de Crime Organizado,
que nos desorganizam.
CLOSE QUATRO:
Essa croniketa, meus campanhas foi escrita e publicada em agosto/2010, na minha coluna VidaViva,
do Jornal Metropolitano. Só dei umas guaribagens de leve, nessa edição.
De lá pra cá, são 7 anos, cumpadi! Nessas burakeras políticas trágicas de violência, corrupção, e esqueminhas
populistas cínicas, nada mudou. Ou mudou pra pior.
Fazer o quê? Adianta pedir a São Jorge o Dragão emprestado, como fez Djavan?
Sei não. Quem sabe? Diga aí, malandro!