Retrospectiva 2023: top 5 das melhores cervejas do ano

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Saudações, cervejeiros retrospectivos!

Mais um ano se passou e estamos na sequência dos dois tipos de texto que eu mais gosto: essa semana tem a retrospectiva 2023 e na semana que vem teremos as perspectivas 2024 (texto que eu brinco de ser mãe Dinah e tentarei adivinhar quais serão as tendências do ano que vem sem nenhuma base científica para tanto, apenas no achismo presunçoso mesmo!).

Apenas para repisar o que já foi descrito nas retrospectivas anteriores (clique aqui para ler a de 2020; aqui para a 2021; e aqui para a 2022. O texto a seguir vai buscar fazer um breve apanhado, em 5 atos, sobre as melhores cervejas do ano, com a devida recomendação musical dos melhores álbuns lançados.

A metodologia é simples, é necessário que a cerveja seja nacional e tenha sido lançada em 2023 e tenha sido degustada (por mim, obviamente) no mesmo ano. Recorri aos meus alfarrábios estatísticos do Untappd para lhes trazer tal apanhado. Para as recomendações musicais os critérios são quase os mesmos, exceto que não precisa ser um lançamento nacional (vide acervo do Last.FM).

Depois de mais de 360 cervejas diferentes provadas ao longo do ano (meu Untappd não me deixa mentir: clique aqui) e de aproximadamente 200 álbuns lançados em 2023 ouvidos na íntegra (meu Last.FM também não me deixa mentir: clique aqui), acho que me qualifico como um bom julgador em ambas as frentes.

Aparentemente, esse ano bebi menos cervejas e escutei mais álbuns diferentes.

Esse é um dos únicos textos que é desenvolvido ao longo de todo ano, já que sempre é uma retomada do que foi feito, experimentado e pensado noutras ocasiões. Assim, convido-os a mergulhar numa saudosa retrospectiva 2023, sobre as melhores cervejas e sobre os melhores álbuns musicais do ano!

Saúde!

#1 Cerveja: BA Icon Neapolitan Ice Cream (Batch 2), da cervejaria Spartacus

Entra ano e sai ano e a Spartacus sempre figura, valorosamente no top das minhas retrospectivas! (Todos os guerreiros espartanos gritam auuuu auuuuu auuuuuuu!!!).

Todo o crédito devido seja dado ao Rei Leônidas, o trabalho de barril das cervejas, agora sob a batuta do marketing do clube Wizards of Delphi (por favor, meu rei, leia corretamente, se pronuncia: “délfai”), é excepcional!

Nessa Neapolitan (o segundo batch, no qual o próprio rei asseverou ter melhorado a receita apresentada no festival ISO 2023), há uma simbiose perfeita entre os barris utilizados, a pegada de chocolate belga e um leve toque de morango, fazendo com que ela seja a melhor cerveja do ano, na minha singela opinião.

Uma cerveja muito bem trabalhada que merece estar no topo da lista anual.

Alcançou nota máxima no Untappd: 5/5 e numa escala macro de 100 pontos ela atinge 98 pontos.

Simplesmente um altíssimo nível de complexidade!

Estampa o número um nela!

#1 Álbum Musical: A Fleur de Peau – V – At The Poles of Everything, do Déhà

Em termos musicais, o topo das paradas de 2023 é ocupado por uma one man band que leva o nome do seu autor. Trata-se do Déhà, um artista belga, multi-instrumentista, pintor, produtor, escultor, e tudo mais que a arte permite, etc etc etc.

Déhà é conhecido por duas características básicas em seu trabalho musical: primeiramente, a variação absurda de estilos nos quais ele transita, do pop ao gótico, do Black Metal ao Death Metal, do Ambient ao Avant-Garde, com músicas autorais, covers, muitas participações e colaborações. Isto é, não há nenhum regramento musical claro e ele não segue nenhum padrão (pré-definido) de som entre os lançamentos sucessivos.

Secundariamente, ele é um artista muito prolífico, haja vista que em 2020, por exemplo, lançou um total de 13 álbuns diferentes, mais de um por mês. Em 2023 lançou 5, mas apenas consegui ouvir dois.

Um deles foi o melhor do ano!

No álbum A Fleur de Peau – V – At The Poles of Everything, Déhà, seguindo um formato de Post-Black Metal na maior parte das composições, ele traz muita angústia, dor e sentimento a sua sonoridade. Vocais variados, letras complexas e intimistas, somada a uma produção limpa e clara.

Sem dúvidas, um dos lançamentos imperdíveis de 2023.

O álbum em referência alcançou nota 98, numa escala de 100 pontos totais.

Fiquem com a melhor música do álbum: Reconciliation. A qual conta com os vocais convidados do cantor Walran (da banda francesa Angellore) e com violinos tocados por Caroline Salmona (da banda alemã Antucuran).

https://www.youtube.com/watch?v=mebp9IF83d8

#2 Cerveja: Follow Me, da cervejaria Croma

A cervejaria Croma parece ter aumentado a produção em 2023 e encadeou um pack de Barrel Aged’s após o outro em sequência. A sensação foi que a maioria das cervejas ficou muito parecidas umas com as outras, eu também tive essa impressão…

Contudo, no primeiro pack do ano veio a Follow Me, e essa cerveja certamente me conquistou! Uma Barrel Aged RIS, sem adjuntos, como manda o figurino dos amantes do estilo. Ela tem um perfil com muita baunilha e muito chocolate, que, diferentemente, das demais de outros packs, foi bem assertivo e singular!

Estupenda! Ela é 5/5 no Untappd e alcançou numa escala macro 96 pontos.

#2 Álbum Musical: Зямля Пад Чорнымі Крыламі: Кроў, da banda Dymna Lotva

Sim, eu sei, o nome do álbum que chegou ao segundo lugar é impronunciável para nós, meros mortais brasileiros. Contudo, eu acredito que a língua jamais deve ser uma barreira para a apreciação artística, seja no âmbito musical ou não.

Inobstante, em termos musicais, é até difícil definir a sonoridade da banda em apreço. Para começar, o núcleo musical é formado por dois músicos bielorrussos, realocados, posteriormente, para a Polônia. No entanto, há uma série de músicos convidados, tocando os mais diversos instrumentos, de acordeão até saxofone, tenor e barítono. Destaque para o Déhà como músico convidado nesse álbum, programando a bateria.

A sonoridade da banda Dymna Lotva nesse álbum é usualmente descrita como Doom Metal, com pitadas de Post-Metal. Porém, seria simplório definir assim o som deles. Tem muito de música Folk, muito de Black Metal, principalmente em alguns vocais que se ligam diretamente ao Depressive Black Metal, e também bastante coisa de música ambiente e de Avant-Garde. Isto é, uma salada musical bem complexa.

O álbum em referência foi capaz de atingir 97 pontos, na escala de 100 pontos máximos.

Brindo-vos com o soturno clipe da música Пахаваны Жыўцом.

 

#3 Cerveja: Gorilla Baunilha do Tahiti Barril de Jaqueira, da Cervejaria Trilha

Fechando o pódio, temos uma cerveja que é sempre um dos destaques do Barrel Club da Trilha: a Gorilla, uma Russian Imperial Stout que serve de base para várias criações da cervejaria.

Por mais que o clube da Trilha tenha decepcionado no âmbito mais geral, não se pode fugir do fato que essa cerveja em específico abrilhantou demais o set da cervejaria. Como já mencionado, a Gorilla é uma Stout muito singular, que carrega em sua base muito chocolate amargo, tonalidades de café, um pouco de frutas vermelhas e já vem imbuída de notas fenólicas de destaque.

Quando colocada no barril feito de madeira de Jaqueira, a cerveja brilhou ainda mais. Com o complemento da baunilha do Tahiti, essa Gorilla é superlativa! Com muito chocolate amargo, amadeirado fino e bem inserido. O barril aporta muita erva-cidreira, noz-moscada e anis. Seu final é longo e remete a café, cacau em pó e canela. Tem um dulçor médio-alto, com um corpo robusto e um amargor pronunciado!

Belíssima cerveja.

Certamente, ela é digna do nosso pódio cervejeiro ao alcançar uma nota 95.

#3 Álbum Musical: Nightsphere, da banda Hereoir

Heretoir é uma banda expoente da onda do Post-Black Metal alemão que surgiu há mais quase 15 anos atrás e logo atraiu muita expectativa com seu álbum homônimo de estreia.

Contudo, como é para a maioria das bandas, é difícil sustentar o frisson que se cria e manter o mesmo ritmo nos lançamentos seguintes. Por isso que demoraram a lançar o segundo álbum, e ele mal pode ser considerado um álbum de metal propriamente dito, dada as várias experimentações feitas.

O importante é que no seu terceiro álbum, denominado de Nightsphere, o líder e único membro permanente da banda, o Eklatanz, consegue trazer muita atmosfera à produção, vocais ricos e variados, alguns toques eletrônicos e alguns outros efeitos muito bem inseridos, riffs marcantes e uma sonoridade que expressa o que há de melhor no gênero.

Assim, o álbum em tela alcança uma pontuação total de 96 pontos de 100. A recomendação musical fica por conta da canção: Twilight of the Machines, um hino pós-moderno em defesa do meio-ambiente sob a batuta do Heretoir. Canção essa que conta com o apoio dos vocais limpos do Tim Yatras, baterista e vocalista da banda australiana Austere.

#4 Cerveja: Etera (Tomo VI), da cervejaria Spartacus

O ano de 2023 foi de destaque para a cervejaria Spartacus. Por mais que tenha tido seus problemas na organização do evento do Spartacus Beer Legends, as produções por eles ofertadas no clube Wizards of Delphi são tão salutares que galgaram dois postos dentre as 5 melhores do ano.

No quarto lugar, ela emplaca a Etera (Tomo VI), à qual foi atribuída a nota de 93 pontos.

A verdade é que essa cerveja foi muito criticada. Acredito que a maior parte das críticas foi feita por quem nunca bebeu uma dose de Rum na vida. Muito menos do Rum Jamaicano, que é levemente diferente dos seus demais congêneres caribenhos.

Esse disclaimer é necessário porque a cerveja é parcialmente envelhecida em barris de Bourbon que continham o Weller 12 anos e de Buffalo Trace (mash #1) e outra parte repousou sob barris de rum jamaicano, o Appleton State.

Dito isto, temos uma cerveja que embarca em duas vertentes, nas quais a predominância do barril de Appleton State é premente. Ela é carregada de muitas notas empireumáticas, e isso pode ser um problema para quem não é familiarizado com elas. O segundo perfil trazido aqui é de muita fruta passa, principalmente banana passa, e um pouco de uva passa também. Essas notas mais passadas podem não agradar a todos, mas somadas com a pegada de muito chocolate, com o corpo denso e bastante melaço, eu julguei ser uma das melhores do ano!

#4 Álbum Musical: Glory, da banda By Fire & Sword

Esse talvez tenha sido um dos álbuns que eu escutei em 2023 quase que sem pretensão alguma. Aliás, vou além, eu confesso que só escutei porque achei a capa bonita (sim, quem não julga um livro, ou um álbum musical, pela capa que atire a primeira pedra!).

E a verdade é que eu fui surpreendido pela qualidade musical do que encontrei aleatoriamente.

Por causa disso, Glory ganhou 95 pontos em minha lista anual.

Trata-se de um álbum de heavy e power metal, só que feito à maneira americana. Ou seja, não tem muito da condução marcada no bumbo duplo na bateria e não apela para “solos fritadores” de guitarra e nem se toca na velocidade da luz. By Fire & Sword é uma banda que foca em riffs mais sóbrios e encadeados, sem grandes firulas instrumentais propriamente ditas. Com menos velocidade e mais melodia, eles construíram um dos melhores plays do ano.

O grande destaque de todo álbum são as letras, religiosas, políticas, dúbias e instigantes. Algo ainda mais sobrelevado pela ótima performance vocal do líder da banda, o The Reverend.

Brindo-vos com a melhor música do conjunto, que tem o melhor refrão indubitavelmente: Dear Reverend (Please Take My Hand)

Confiram.

 

#5 Cerveja: Segundo Círculo, da cervejaria Captain Brew

A série Círculos da Captain Brew é um projeto audacioso, para se dizer o mínimo.

A cervejaria lançou de uma só vez 3 cervejas, que seguem uma linha bem definida de pensamento e produção entre elas. O Primeiro Círculo é uma Wee Heavy, envelhecida em barris ex-vinho do porto. O Segundo Círculo, a melhor da série, é um blend da Primeiro Círculo com uma RIS envelhecida em barris ex-cachaça, resultando em uma Strong Ale. O derradeiro Círculo, o Terceiro, é um blend do que já foi “blendado” (um blend do blend), misturando outros barris de madeiras brasileiras, como Amburana e Jequitibá e mais outras bases diversas.

Resumidamente, o Segundo Círculo é o melhor dos 3 Círculos. Agrega notas de café, chocolate e tabaco com o blend ex-cachaça, e soma a isso tudo uma maior robustez, com notas vínicas vindas do Primeiro Círculo, base maltada sólida e bem caramelada, passas, notas positivamente oxidativas e um final longo e marcante.

Totalmente excelente! A verdadeira arte do blend.

Merece certamente uma nota 90 em 100 pontos possíveis!

Uma de suas muitas peculiaridades é ser flat (sem carbonatação), o que possibilita, se a garrafa não terminar de uma vez, só tampar e beber depois. Ademais, é uma cerveja para beber em temperatura ambiente (recomendada para dias mais frios)!

#5 Álbum Musical: Cycles of Pain, da banda Angra

Devem haver outras bandas nacionais com a mesma proficiência técnica do Angra (o que é algo extremamente raro de se alcançar, diga-se de passagem). Porém, o destaque da banda de heavy metal mais famosa do Brasil (depois que o Sepultura anunciou a aposentadoria, sobra apenas ela mesma como a mais popular) se atém ao fato de ela conseguir ser tecnicamente soberba e ainda alcançar o grande público.

No seu mais novo álbum, denominado de Cycles of Pain, a banda consegue ser fiel àquilo que a consagrou: música melódica e pesada, toques de música clássica e, claro, a fusão com ritmos brasileiros, em especial, com ícones da MPB. Tudo isso feito com ainda mais maestria, linhas de baixo fretless em várias músicas (como na introdução de Vida Seca e em Tides of ChangePart I), bateria complexa e bem executada, muitas orquestrações, vocais precisos e melódicos, e claro, riffs de guitarra matadores.

Com esse álbum, Angra alcançou 94 pontos na lista dos melhores do ano de 2023, sendo um dos melhores da banda desde o Rebirth!

A música sugerida já foi colocada como indicação em textos pretéritos, mas é tão boa que merece o repeteco com o clipe oficial. Trata-se da canção Vida Seca, que tem a participação do cantor pernambucano Lenine.

Saideira

Adoro listas e recomendações de final de ano. Fazer a retrospectiva do que foi bebido (de bom e de ruim) e escutado (do maravilhoso ao péssimo) é um dos melhores momentos. Por isso que digo que esse é um texto feito um pouquinho a cada momento do ano, sempre recorro a alguma anotação para poder escrever com mais precisão, já que algumas lembranças não são exatamente recentes.

Relembrar é viver, por isso que a retrospectiva é parte desse exercício de ressignificação das vivências tidas.

Este foi o TOP 5 do ano. E o seu qual seria? Concorda com esse?

Tiraria alguma indicação?

Acrescentaria alguma?

Comentem se concordam (ou não) e se gostaram (ou não).

Recomendações finais

Deixo o link final com a lista completa de todos os álbuns, por estilo e por nota, em uma tabela do Excel que eu monto ao longo do ano.

Clique aqui e veja a lista completa

Fica a dica para quem quiser conhecer mais algumas coisinhas inusitadas ou que passaram despercebidas no seu radar.

Saúde e boas cervejas/músicas!

Feliz 2024!

 

Lauro Ericksen

Lauro Ericksen

Um cervejeiro fiel, opositor ferrenho de Mammon (מָמוֹן) - o "deus mercado" -, e que só gosta de beber cerveja boa, a preços justos, sempre fazendo análise sensorial do que degusta.
Ministro honorário do STC: Supremo Tribunal da Cerveja.
Doutor (com doutorado) pela UFRN, mas, que, para pagar as contas das cervejas, a divisão social do trabalho obriga a ser: Oficial de Justiça Avaliador Federal e Professor Universitário. Flamenguista por opção do coração (ou seja, campeão sempre!).

Sigam-me no Untappd (https://untappd.com/user/Ericksen) para mais avaliações cervejeiras sinceras, sem jabá (todavia, se for dado, eu só não bebo veneno).

A verdade doa a quem doer... E aí, doeu?

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