A babel poética de um poeta da nova geração: Marcos Antonio Campos

PIX: 007.486.114-01

Colabore com o jornalismo independente

“Esquece todos os poemas que fizeste/
Que cada poema seja o número um”
Mário Quintana.

Freud disse, certa vez: “Seja qual for o caminho que eu escolher, um poeta/romancista já passou por ele antes de mim”. O pai da psicanálise não criou apenas uma bela frase, ele defendia os escritores criativos em geral, e enfatizava que eles tinham acesso a fontes que ele próprio ainda desconhecia, pois ainda não eram acessíveis à ciência. Segundo Freud, ficcionistas e poetas sabiam, muito antes dele, todos os modos possíveis do funcionamento mental.

Retomamos essa famosa citação de Freud depois de ter lido o novo livro do poeta Marcos Campos, “Babel” (Caravela Selo Editorial, 2018). O universo poético de Marcos Campos projeta-se em dimensões variadas, destacando-se sobretudo a sua capacidade de criação e de inovação ao trabalhar com a palavra. Ora, sabemos que a criatividade revolucionária nos versos, vem desde o movimento modernista: a poesia é livre, qualquer um pode escrever um poema, o que torna a poesia um gênero diversificado e democrático por excelência.

Marcos Campos faz parte de um amplo cenário que chamamos de poesia potiguar contemporânea, o qual tem apresentando diversos estilos e facetas. Para exemplificar, citamos alguns nomes, em destaque cada um à sua maneira, trabalhando com versos: Maria Maria Gomes, Jeanne Araújo, João Andrade, Leocy Saraiva, Ada Lima, Wescley J. Gama, Iara Maria Carvalho, Regina Azevedo, Victor Oliveira, Ayrton Senna e alguns outros poetas que transmitem sua mensagem de maneira diversificada, versificando, digamos assim, da forma mais variada possível, o que é perfeitamente compreensível, tendo em vista a revolução que o modernismo causou na poesia brasileira.

Recentemente, tivemos o lançamento de obras minimalistas de José de Castro, Lívio Oliveira e Jarbas Martins. Outros poetas, da nova geração têm feito tentativas e experiências com a palavra. Por exemplo, Marcelo de Cristo, cujos versos aparentam ser simples, mas, na verdade, são elementos de uma elaborada pintura poética.

EU LÍRICO MODERNO

Marcos Campos canta nos seus poemas um forte anseio pela plenitude da criação artística. Em algumas passagens, o eu lírico revela preocupação quanto ao sentido filosófico da existência e demonstra a capacidade de transformação do bruto e doloroso em algo bucólico e suave. Em outras passagens, a liberdade e esplendor nas palavras, que adquirem transcendência, uma totalidade existencial do ser poeta. O eu-lírico nos faz crer que não basta trazer a síntese do que é abstrato e/ou concreto, e sim transformá-la em poesia.

Outro ponto interessante na sua poesia é a ousadia, tranquila e precisa com que desliza pelas fronteiras das palavras. Dessa maneira nos oferece uma poesia competente, sobretudo antenada com a modernidade, um texto claro, fácil de compreender, mas também poeticamente denso, reflexivo, e bastante intrigante, e porque não dizer, em alguns momentos, vanguardista. Alinhado às modernas correntes estéticas, Marcos Campos demorou certo tempo para estrear em livro, mas sempre se destacou ganhando concursos de poesia em várias partes do país.

BABEL

A leitura de “Babel” é uma acolhedora exploração sonora e visual das palavras e das formas poéticas. Os versos são extensos e ricos em gamas temáticas e revelam um virtuosismo técnico que resulta de obstinada atividade criativa. A maneira de o poeta versar sobre a existência, o cotidiano, as pessoas, é de uma sensibilidade criadora em sintonia com a realidade física, com uma matéria-prima trabalhada – a palavra, – num processo de seleção e arrumação vocabular e vasta exploração de significados.

Notoriamente a palavra Babel, nos remete à antiga história da mistura de línguas, narrada no Antigo Testamento. A Torre de Babel, mencionada no Livro do Gênesis da Bíblia, teria sido construída por descendentes de Noé após o Dilúvio. Para os judeus adquiriu o significado de “confusão” como está descrito no livro do Gênesis. Moisés teria derivado o nome Babel, em hebraico Bavél, da raiz do verbo ba.lál, que significa “confundir”.

“Babel” compõe-se de múltiplas experiências com a palavra, que vão desde trovas, tercetos, poetrix e haicais, a poemas livres e gráficos experimentais. Nos seus poemas mantém a expressão de um lirismo atinado, contêm-se nos limites do equilíbrio e da harmonia. A tentativa de inovar está presente na própria ideia de misturar línguas, justificando o nome do livro. Devemos destacar também que muitos dos poemas incluídos no livro já foram premiados em concursos nacionais.

UM BÊBADO SONHADOR

Marcos Campos estreou na poesia, com “Um Bêbado Sonhador”; embora esse titules, em nossa opinião, não seja muito acertado, foi uma excelente estreia, muito elogiada, pelos experientes poetas Anchieta Fernandes e Jarbas Martins, dentre outros nomes. Eu, particularmente, achei o livro muitíssimo interessante, rico visualmente, liricamente, e de amplo valor literário. O próprio editor do livro José Correia, da Editora Caravela, notou a virtude lírica do poeta e fez uma edição diferenciada para o mercado livreiro.

Marcos Campos veio para marcar presença em nossa literatura. Afora do livro citado, organizou a obra “Pipa”, reunindo a poesia de João Bosco Campos, “Coletâneas pelo País”, e colabora em revistas literárias nacionais, além, de ter participado da coletânea “Terra Brasilis”, reunião de textos de autores potiguares, lançados na Feira Internacional do Livro de Havana em 2017.

Marcos Campos é membro do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte, da UBE/RN, e da SPVA-RN, participa ativamente da cena literária potiguar contemporânea.

Podemos destacar ainda, de modo especial, em, “Babel” o caráter visual de alguns poemas, que representam uma expansão no alcance da imagem poética: além de ser lida a poesia necessita ser vista. Em outros poemas o autor volta a sua atenção para o fazer poético e para várias concepções sobre o seu oficio. Ai enxergamos a função eficaz da metalinguística.

O livro “Babel” faz justiça à famosa frase de Jorge Luís Borges, segundo a qual “cada palavra é uma obra poética”.

Thiago Gonzaga

Thiago Gonzaga

Pesquisador da literatura potiguar e um amante dos livros.

WhatsApp
Telegram
Facebook
Twitter
LinkedIn

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Mais lidos do mês