A Academia Norte-rio-grandense de Letras tem se rejuvenescido com o tempo. E não pela idade dos novos membros. Muito mais pela abertura a nomes realmente aptos à cadeira de imortal e com ideias novas para tirar a naftalina do velho prédio da Mipibu e modernizar a instituição. Humberto Hermenegildo é exemplo.
Em eleição ocorrida ontem na ANL, sem maiores alardes na imprensa ou nos meios intelectuais, o professor e escritor Humberto Hermenegildo foi eleito com 28 votos. Ele ocupará a cadeira número 2, cujo patrono é a indianista Nísia Floresta e teve, entre os ocupantes, Henrique Castriciano e Hélio Galvão.
Para saber mais sobre o professor da UFRN, especialista no modernismo brasileiro, leia esta entrevista AQUI feita por Thiago Gonzaga e publicado neste Papo Cultura. Hermenegildo preenche a segunda vaga em aberto, deixada pelo médico mossoroense Ernane Rosado. O poeta Lívio Oliveira tomou posse há poucas semanas da cadeira do jurista Francisco Fausto.
Mas se engana quem pensa que as vagas abertas foram fechadas. Também ontem foi oficializada a vaga da cadeira número 9 deixada pelo poeta e artista plástico Dorian Gray Caldas. E aqui eu indicaria pelo menos uns 30 nomes bacanas para a cadeira. Mas deixo cinco: Adriano de Souza, Antônio Francisco, Ruben G Nunes, François Silvestre e Rostand Medeiros. Infelizmente nenhum, acredito, se interesse em concorrer.
Para o sistema de substituição da cadeira dos imortais cabe ao presidente declarar a vaga aberta após a morte de um dos ocupantes. A partir daí publica-se na imprensa e admitem-se candidaturas em até 60 dias. Por vezes a própria ANL sugere convites. Não acho que isso venha a ocorrer. Portanto, aos interessados, lancem seus nomes.
Outra notícia quentinha? Hermenegildo lançará seu primeiro romance no próximo dia 20 de abril, na própria sede da ANL. O livro se chama Rastejo. Mas a posse, segundo previsões, se dará apenas no segundo semestre. Há todo um trâmite para o processo. Mas não nenhum segredo marçon na ANL. Seguem abaixo algumas curiosidades:
HISTÓRIA DA ANL
A fundação da ANL foi uma resposta de Cascudo aos apelos da Federação das Academias de Letras. Assim como a Academia Brasileira de Letras, criada em 1896, a ANL também se emoldurou com base na Academia Francesa, a primeira do mundo, fundada em 1635.
Presente na data de fundação da ANL, Adauto Câmara, Edgar Barbosa, Januário Cicco, Otto de Brito Guerra, Antônio Soares de Araújo, Nestor Lima, Floriano Cavalcanti e Luís Gonzaga de Monte, entre outros.
O RN colecionava intelectuais de reconhecida capacidade. Mas faltaram nomes para preencher as 40 cadeiras (número inspirado na ABL) e apenas 25 imortais protagonizaram as primeiras vagas da ANL. Em 1943, o número era de 30 acadêmicos, alcançando, mais tarde “a tarefa realizada dos 40 e seus sucessos no tempo”, como afirmou Cascudo.
Mesmo fundador da Academia, Cascudo recusou-se a aceitar a presidência. Mais tarde também rejeitaria o convite para ser membro da ABL; convite enviado por votação unânime dos chamados imortais.
Segundo Diógenes da Cunha Lima, Cascudo alegou ser apenas um provinciano. Talvez daí venha a origem da frase “Sou um provinciano incurável”.
Cascudo seria o quinto representante potiguar na história da ABL. Os outros quatro são o médico e ficcionista, estudioso das artes e ciências, Peregrino Júnior; o historiador Rodolfo Garcia; e os ainda atuantes, o jornalista e escritor Murilo Melo Filho e, mais recentemente, o diplomata Almino Afonso, nascido em Mossoró.
Com a recusa de Cascudo, o bacharel em direito e escritor Henrique Castriciano foi eleito o primeiro presidente da ANL, tendo como secretários Adherbal de França e Edgar Barbosa.
Ativista pelos direitos da mulher, sobretudo no campo da educação (criou a Escola Doméstica de Natal), Henrique Castriciano escolhe patrona de sua cadeira a idealista, revolucionária e escritora Dionísia Gonçalves Pinto, ou Nísia Floresta Brasileira Augusta, como é mais conhecida.
A irmã de Castriciano, a poeta Auta de Souza, que morreu prematuramente aos 24 anos, também foi homenageada pela ANL como patrona da cadeira de número 20.
PATRONOS E AUSENTES
Além dos 40 patronos escolhidos quando da fundação da ANL pelos 40 primeiros ocupantes das cadeiras, houve mais de 80 sucessores ao longo dos 80 anos de história da Academia.
Muitos ficaram de fora, seja por derrotas em suas candidaturas, seja por rejeição ao convite ou por esquecimento da instituição. Casos de Deífilo Gurgel, Zila Mamede, Moacy Cirne, François Silvestre, Marize Castro…
Entre os imortais, estão padres, políticos, jornalistas, historiadores, artistas plásticos, folcloristas, cronistas, pesquisadores, médicos, juristas… Mas predominam mesmo os poetas.
E, tristemente, uma amarga maioria de homens. Entre os 40 patronos, três mulheres: Nísia Floresta, Isabel Gondim e Auta de Souza. Entre os 40 primeiros ocupantes, apenas Carolina e Palmyra Wanderley.
E o quadro parece não se alterar. Entre os mais de 80 sucessores, apenas mais cinco mulheres: Maria Eugênia Montenegro, Anna Maria Cascudo, Sônia Fernandes Ferreira, Diva Cunha e, mais recentemente, Leide Câmara.
PRIMÓRDIOS E DIFICULDADES
No início, ainda sem sede própria, as primeiras reuniões dos acadêmicos se davam em locais variados. O Instituto Histórico e o Atheneu foram os espaços mais usados.
Foi o então governador Sylvio Pedroza (depois acadêmico) quem doou o terreno na rua Mipibu para construção do prédio da ANL, inaugurado em 28 de junho de 1958, na administração de Manoel Rodrigues de Melo.
Hoje, sendo associação privada sem fins lucrativos, a ANL é mantida pelos acadêmicos. Por vezes recebe verba do Governo do Estado, mas sem regularidade. Alguns espaços do prédio são alugados e ajudam na manutenção.
PROJETOS EM 80 ANOS
Alguns projetos encabeçados pela ANL passam despercebidos pela imprensa, a exemplo da idealização do Presépio de Natal, com assinatura de Oscar Niemayer.
Também obra de Niemayer é a União dos Continentes, arcos em forma de chifre, localizado na BR 101, em Touros.
Muitos nomes pitorescos e históricos de cidades, bairros, etc, também foram mantidos graças a campanhas da ANL, a exemplo de Parnamirim, que estaria hoje com o nome Eduardo Gomes não fosse a intervenção da Academia. Ou Monte das Gameleiras, Barra de Maxaranguape e Caiçara do Rio dos Ventos.