Hazy Ipa em garrafa de vidro: uma nova (velha) tendência

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Saudações, Ipeiros de carteirinha!

O texto de hoje é dedicado a todos vocês que ficam caçando o nome do lúpulo nos rótulos das cervejas.

Brincadeiras à parte, vamos falar sim da queridinha de 9 em cada 10 cervejeiros artesanais: a Hazy IPA. Outrora denominada de NEIPA (ou de algumas outras variantes, como Juicy IPA, e similares), a Hazy IPA, doravante denominada assim após uma mudança no guia do BJCP de 2022, é o estilo dominante atualmente.

Assim, seja na predileção dos consumidores ou na escolha comercial das cervejarias, um ponto inefável e indiscutível no mundo das cervejas artesanais é o da prevalência do estilo em apreço. Se há poucas unanimidades no mundo, possivelmente, essa é uma delas.

Para além desse fato incontestável, o texto de hoje buscará falar de uma particularidade do estilo ao longo dos seus anos de se firmar como dominante.

Foi comum que, na maioria dos casos, ela fosse colocada na forma de lata no mercado (para além dos chopes, nos bares e Brewpubs, obviamente), contudo, parece haver um movimento de envasar as cervejas em garrafas de vidro mais recente.

É justamente sobre a perspectiva dessa mudança que falaremos um pouco mais no texto de hoje.

O velho dilema Lata x Garrafa

Apesar de não ser o foco do objetivo mais específico do texto de hoje, de alguma forma, é necessário tangenciar a celeuma: é melhor a cerveja em lata ou em garrafa?

Esse tema nunca teve um enfoque prioritário em textos pretéritos, todavia, no texto em que debati alguns mitos cervejeiros (clique aqui) falei um pouco mais sobre o tema.

Inobstante, o fato é que para cervejas do estilo Hazy IPA, no qual, quanto mais fresca a cerveja, melhor, enlatar o produto final acaba sendo sempre melhor, em termos de acondicionamento e de qualidade.

A vedação que a lata é capaz de ter, tanto em termos de pressão física quanto em termos de isolamento térmico e luminoso, é algo infinitamente superior às demais formas de envase. Então, em critérios técnicos, a preferência por enlatar suplanta qualquer outra perspectiva (não-técnica) por outros métodos de comercialização das cervejas (do estilo Hazy IPA).

De modo que, pode-se dizer que o dilema pretensamente existente é apenas aparente, é melhor acondicionar as cervejas do estilo em questão em latas.

O costume de já se ter Hazy IPA em lata

Diferentemente de outros estilos de cerveja, como a Pilsen, que precisou aclimatar o consumidor brasileiro a recebê-la em lata, algo deveras custoso para o mercado cervejeiro no final dos anos 90 e início dos anos 2000, o público já se acostumou com a Hazy IPA em lata logo de cara.

Na verdade, não foram com as latinhas de 355ml que a Hazy IPA iniciou e prosperou. Foram com os latões de 473ml (medida de um pint). De certa forma, a escolha pelo formato maior já foi uma jogada de marketing para elevar um pouco mais o seu preço de comercialização.

Decerto, ao vender quase meio litro, a maioria das cervejarias, na segunda metade da década passada, conseguia elevar o patamar dos preços próximo a casa dos 30 reais. Obviamente, que nos dias de hoje, pode parecer barato, já que uma Hazy IPA top de linha passa facilmente dos 50 reais, mas, para a época, com um mercado ainda engatinhando, eram valores bem elevados.

Inobstante, o ponto é que a escolha pelos latões foi acertada e passou a ser a forma mais usual de acondicionar o estilo e de vendê-lo. A exceção era justamente quem não fazia isso, e optava por envasar as cervejas em garrafas de vidro. Deveras que algumas ainda faziam isso, a reboque de que o costume fosse enlatar.

Uma (velha) nova tendência

Se formos pensar que o costume pré-anos 2000 era justamente envasar em garrafas de vidro todo e qualquer tipo de cerveja (as latinhas eram bem excepcionais antes disso), a tendência a colocar cervejas em garrafas não é nova.

Portanto, a novidade é observar que (ainda de modo tímido) algumas cervejarias de ponta dos Estados Unidos (e algumas pioneiras aqui no Brasil logo seguem) estão optando por colocar seus exemplares de Hazy IPA em garrafas de vidro. Decerto que, para quem é do Rio Grande que não fala Bah nem Tchê (é o do Norte, caso você não seja tão bom em cultura e geografia para se localizar), o costume sempre tenha sido beber Hazy IPA em garrafa de vidro, a novidade da lata chegou por aqui apenas em 2023…

Porém, nos pequenos casos isolados em que enlatar a Hazy IPA não foi a tendência dominante anteriormente era explicado por fatores logísticos e/ou econômicos. Acabava sendo muito mais caro manter um sistema para enlatar longe dos grandes centros.

Sobretudo, algo similar acontecia quando a cervejaria optava de cometer o crime de pasteurizar sua Hazy IPA: nesse caso, o destino era a garrafa de vidro mesmo. Afinal, a perda de qualidade já estava sacramentada e o custo de envasar em garrafa um produto de menor qualidade era deveras atrativo.

A tendência se consolida?

Não basta surgir, tem que perseverar. O mundo das cervejas artesanais é uma pletora de modinhas. A cada semana ou pelo menos a cada quinzena uma nova é lançada e duas são esquecidas.

Não vou nem enumerar os falhanços a serem esquecidos. Mas, devemos de alguma forma, ponderar se a tendência da Hazy IPA e garrafa tem chances de prosperar.

Em termos econômicos, é certo que as cervejas desse estilo, que sejam de baixo custo e de menos expectativas, tendem a se beneficiar com o envase em garrafas de vidro. O baixo custo de operação facilita sua prevalência.

Todavia, quando se fala de cervejas de alto nível (high end), por mais que algumas poucas cervejarias americanas de ponta tenham tentado lançar bem recente essa moda, ela não tende a prosperar. Para elas, a economia na produção tende a irrisória e a perda de qualidade sensorial é significativa.

É a famosa “economia burra”, trocar centavos por um nível de qualidade quase que inestimável (em troca…).

Saideira

Tendências são como as ondas do mar, elas vem e vão. Algumas até chegam à costa, outras nem espuma formam.

Não quero dizer que não haverá cervejas do estilo Hazy IPA em garrafas de vidro, sempre haverá, principalmente aquelas advindas de cervejarias de um custo operacional mais modesto. Ou aquelas que optam por pasteurizar sua produção.

Porém, o envase de cervejas desse estilo como uma tendência de alto nível e de alta qualidade é algo prementemente duvidoso. Por isso, não tende a prosperar.

Claro que existem experimentações, até por parte de cervejarias consagradas, até mesmo no que tange ao envase e demais invólucros de oferta ao público. Contudo, as latas paras as cervejas do estilo Hazy IPA já é algo consolidado, tanto no imaginário consumerista, como bem também na formatação de venda do mercado.

Assim, é algo que não tende a ser alterado, ao menos no médio ou longo prazo.

Recomendação Musical

A recomendação musical de hoje tem pouco a ver com o texto!

Na verdade, trata-se mais de um mea culpa sobre os melhores álbuns do ano. Quando eu fiz a lista no texto do final de 2022 (leia sobre ele aqui), não tinha tido a oportunidade de ouvir a obra homenageada de hoje.

Outrossim, retificando, esse é o melhor álbum de 2022 (Louder Arriver, da banda Sonja).

A recomendação é a música Nylon Nights, da banda de heavy metal (pseudo) oitentista Sonja. O som é dos anos 80, mas a banda é de 2018.

A sonoridade, é como a Hazy IPA em garrafa de vidro, uma nova (velha) tendência em ambientações oitentistas, com vocais etéreos, guitarras com afinação bem aguda, bateria galopante e muito laquê nos cabelos. A nova tendência seriam os temas espinhosos e polêmicos, vale a pena conferir.

A Melissa Moore simplesmente arrasou nesse álbum! Aproveitem!

Saúde!

 


CRÉDITO DA FOTO: ALAMY

 

Lauro Ericksen

Lauro Ericksen

Um cervejeiro fiel, opositor ferrenho de Mammon (מָמוֹן) - o "deus mercado" -, e que só gosta de beber cerveja boa, a preços justos, sempre fazendo análise sensorial do que degusta.
Ministro honorário do STC: Supremo Tribunal da Cerveja.
Doutor (com doutorado) pela UFRN, mas, que, para pagar as contas das cervejas, a divisão social do trabalho obriga a ser: Oficial de Justiça Avaliador Federal e Professor Universitário. Flamenguista por opção do coração (ou seja, campeão sempre!).

Sigam-me no Untappd (https://untappd.com/user/Ericksen) para mais avaliações cervejeiras sinceras, sem jabá (todavia, se for dado, eu só não bebo veneno).

A verdade doa a quem doer... E aí, doeu?

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2 Comments

  • Lauro, gosto muito dos seus artigos. O de beber garrafas verdinhas por status estava Excelente, por sinal. Mas no caso das hazy engarrafadas, vou te falar por mim, o que talvez seja curioso para você: não consumo latas de jeito nenhum. Nunca. O custo de reciclagem do alumínio em litros de água é imenso, absurdo, desmedido. Garrafa é ambientalmente melhor, de forma indiscutível. Entendo seu ponto, já que o artigo é técnico (e muito bem fundamentado) mas fica o comentário apenas para exemplificar um pensamento dissonante, por um viés diverso. Grande abraço!

    • Lauro Ericksen

      Boa noite, amigo!

      Sim, em termos de consumo consciente, as latas são ambientalmente danosas!

      Você tem plena razão.

      O ideal seria consumirmos mais em Growlers, de vidro ou cerâmica.

      Uma alternativa de baixo custo, tanto para as cervejarias quanto para os consumidores, mas, aqui pelo Nordeste, infelizmente, a adesão ao Growler é baixa.

      Deixo como sugestão a leitura de outro texto meu sobre o tema: Growler: um acessório cervejeiro de grande utilidade

      Um abraço e boas cervejas para ti!

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