Domingo, 8 de janeiro de 2023. Um dia para não esquecer. No meio da tarde, Racine Santos me avisa pelo telefone:
-Ligue a televisão: em Brasília, um bando de extremistas, partidários de Bolsonaro, estão invadindo e depredando os palácios dos três poderes.
Não quis acreditar no que Racine teve a gentileza de me comunicar; pareceu-me algo absurdo, kafkiano. Mas, depressa, ligo o televisor, e as cenas que vejo me deixam chocado. A indignação logo me toma por inteiro. Ao mesmo tempo fico triste, desolado, diante de tanta barbárie.
Doeu na alma ver o rastro de destruição que esses vândalos deixaram – vidraças quebradas, móveis destroçados, uma tela de Di Cavalcanti e muitas outras valiosas obras de arte, brutalmente, agredidas. Isto, para não dizer todo o horror.
Mas, felizmente, não se abalaram as instituições democráticas. O Brasil resistiu aos que se dizem donos da verdade e desrespeitam a vontade da maioria, expressa em eleições, reconhecidamente, limpas.
REQUIESCAT IN PACE
Transladados os restos mortais de Augusto Severo para Natal, cuida-se, agora, de providenciar o seu sepultamento em Macaíba, terra-berço do herói e mártir.
Que seja dada, como morada definitiva, ao grande brasileiro, um monumento á altura daquele sob o qual jazia, há anos, no Cemitério São João Batista, do Rio de Janeiro – cemitério que já se tornou quase um panteão nacional, pois ali se encontram os túmulos de alguns dos mais ilustres vultos da nossa História, como Rui Barbosa, Heitor Villa-Lobos, Antonio Carlos Jobim, Café Filho, Augusto Tavares de Lyra e muitos mais, inclusive os que integram o Mausoléu da Academia Brasileira de Letras.
RAIZES DO BRASIL
O ano de 2022 passou sem que se registrasse grande homenagem aos 120 anos do nascimento de um dos maiores escritores brasileiros, o sociólogo e historiador Sérgio Buarque de Holanda (1902-1982).
Ao lado de Gilberto Freyre, Câmara Cascudo, Darcy Ribeiro e poucos outros ensaístas, ele figura como um intérprete do Brasil, sendo, portanto, merecedor da gratidão de todos os brasileiros.
No seu livro Raízes do Brasil, talvez a sua obra-prima, um dos pontos mais interessantes é a sua teoria do homem cordial, com a qual busca definir traços do caráter da nossa gente. No dizer do mestre, a palavra cordial (do latim cor, cordis: coração) significa não apenas amabilidade, cortesia, mas, também, a conduta do indivíduo “que só apela para os sentimentos e os sentidos e quase nunca para a razão e a vontade”.
LEITURA QUE RECOMENDO
A Grande Pancada – Crônicas do Tempo do Jazz, de Pablo Capistrano. ( Natal: Editora Jovens Escribas, 2014).
Figuras e fatos da grande música americana, desde os começos, no submundo de Nova Orleans até a contemporaneidade, passando por Louis Armstrong, Duke Ellington, Billie Holiday, Coleman Hawkins, Charlie Parker e outros ases. (Senti falta de Ella Fitzgerald). A linguagem adotada pelo autor, em tom de conversa entre amigos, prende o leitor, da primeira à última página, sem prejuízo da profundeza que os temas requerem. Vejam este trecho sobre a vida atribulada de Charlie Parker:
“Entre um medíocre feliz e um gênio atormentado, o público, sedento de arte e transcendência, em um vampirismo atávico da criatividade alheia, escolhe sempre canonizar os mártires, os sofredores, os heróis trágicos, os gênios que se entregam ao furor de sua arte e pagam com a sua vida ou com a sua sanidade mental o preço dessa aventura”.
O QUE VOCÊ ESTÁ LENDO?
Responde Lívio Oliveira, procurador federal, poeta, cronista e ensaísta, membro da Academia-Norte-rio-grandense de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte:
– Estou lendo A Arte da Biografia, de Lira Neto.
CRÉDITO DA FOTO: EVARISTO SA/AFP or licensors