Beatles para além da música

beatles

PIX: 007.486.114-01

Colabore com o jornalismo independente

Alguém já disse que os Beatles são responsáveis por uma das maiores revoluções do nosso tempo, feita sem tiros e sem sangue: a revolução dos costumes. Realmente a importância histórica dos Beatles é bem maior do que se pensa.

Em primeiro lugar, consagraram, na música popular, um gênero – o iê-iê-iê -, tornando-o mundialmente difundido, e o fizeram em alto nível artístico, a ponto de merecerem elogios de exigentes críticos musicais e compositores eruditos, como Leonard Bernstein. Aliás, já se chegou, mesmo, a comparar sua canção com o lied de Schubert.

Mas, ao lado desta revolução musical veio a revolução dos costumes.

Com seus cabelos compridos; com suas atitudes anárquicas, às vezes valendo crítica social; com suas vestes espalhafatosas e com seu romantismo, sua irreverência e alegria, os Beatles ditaram sem o querer normas de comportamento aos jovens do mundo, na década de sessenta. Podem ser considerados precursores do movimento “hippie”, da música pop e de outras manifestações da chamada contracultura.

Curioso que a revolução beatleana haja surgido na tradicional Inglaterra, cuja imagem simbolizava-se na figura do gentleman: circunspecta, formal, elegante, cinzenta como o fog.

O iê-iê-iê

Como se sabe, o iê-iê-iê tem sua fonte no Jazz e no Rock. Ritmo vigoroso, às vezes frenético, fortemente marcado pela percussão constitui uma música sensual, boa de dançar.

A guitarra elétrica, herdada do Rock, foi eleita instrumento básico nos conjuntos de iê-iê-iê. Instrumentos de sôpro, como piston e sax, tão caros ao Jazz, não tiveram vez, de início. Mais tarde, porém, os Beatles introduziram estes e muitos outros, inclusive reabilitando alguns arcaicos.

Sucesso no Brasil

Surgem os primeiros sucessos beatleanos no Brasil: “She Loves You” e “I Want to Hold Your Hand”. Aquele impacto. Criaram-se dezenas de fãs-clubes pelo país afora; instituiu-se, meio pueril, a beatlemania. John Lennon e Paul MacCartney, autores (parceiros) da maioria das canções interpretadas, lideravam o conjunto. Novos sucessos vieram: “Eleanor Rigby”, “A Hard Day’s Night”, etc. Como tônica das letras: assuntos de amor. Legítimos trovadores, os Beatles, até então.

A idade da razão

Em 1967 é lançado o LP “Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band”. Este é marco importante na carreira dos Beatles. Com ele revelou-se o aperfeiçoamento de pesquisas já demonstradas em “Revolver”, por exemplo. Alguém disse: “Os Beatles entraram na Idade da Razão”. Não mais aqueles rapazes, cuja imagem os filmes de Richard Lester (“Reis do Iê-iê-iê” e “Help”) ajudaram a propagar pelo mundo. Não. Agora apareciam barbudos e vestidos de modo mais extravagante.

George Harrison trazia de suas experiências na Índia, “Within You Without You”, com uso de instrumentos orientais. John e Paul, revelando notável amadurecimento, apresentaram neste LP algumas de suas obras-primas: “A Day in The Life” (em nível de música erudita); “When I’m Sixty-Four” (revivendo música americana típica da década de vinte); “With a Litle Help From My Friends”, “She’s Leaving Home”, “Fixing a Hole” e “Lucy in the Sky With Diamonds” (em que muitos viram alusão ao LSD). Entre parênteses, diga-se, a propósito, que não se pode responsabilizar os Beatles pela difusão do usa da droga.

O fato é que os Beatles, até então ídolos de jovens e adolescentes, ganham admiradores em outras faixas etárias, por conta de “Sgt. Peppers”.

E sua estrela ia subindo… “Magical Mistery Tour”, pequeno álbum com dois compactos, traz faixas como “The Fool on the Hill”, em que se apura a sofisticação musical iniciada em “Sgt. Pepper’s”. Outro álbum, lançado em seguida – aquele da capa branca-revela “The Beatles” mais ecléticos: da canção folclórica (“The Continuing Story of Bungalow Bill”) ao rock (“Back in the USSR”); do Blues (“Yes Blues”) às ousadas experiências de “Revolution”.

Caetano Veloso traduziu algumas letras de canções deste disco, entre as quais a popularíssima “Ob-La-Di, Ob-La-Da”. Outro tradutor, digno porém de maior respeito: Carlos Drummond de Andrade.

The end

Em 1970 surge o LP “Let It Be”, com canções do filme homônimo, estrelado pelo conjunto. Verificam-se aí tendências diversas da música contemporânea (soul, etc.), como já havia ocorrido no LP anterior, o excelente “Abbey Road”. Há também em “Let It Be” um retorno ao “iê-iê-iê” embalado dos primeiros tempos: “One After 909”.

Pode-se considerar este como sendo o último LP dos “Beatles”. Em seguida viria a dissolução do conjunto, motivada, ao que parece, pela rivalidade entre John e Paul.

Manoel Onofre Jr.

Manoel Onofre Jr.

Desembargador aposentado, pesquisador e escritor. Autor de “Chão dos Simples”, “Ficcionistas Potiguares”, “Contistas Potiguares” e outros livros. Ocupa a cadeira nº 5 da Academia Norte-rio-grandense de Letras.

WhatsApp
Telegram
Facebook
Twitter
LinkedIn

2 Comments

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Mais lidos do mês