A quarentena de Tácito Costa
Li há algum tempo e muito apreciei o livro “Crônicas da Quarentena”, de Tácito Costa (Caravela Selo Cultural, 2021), coletânea em que o autor traça um painel desse tempo que estamos vivendo, e o faz com inegável competência através do seu diário íntimo, revelando a angústia, o medo e um monte de outras coisas, que nos afligiram, inclusive o governo Bolsonaro, ao longo dessa pandemia.
Hoje, terminei de ler “O Caderno de Deuzivaldo”, contos, do mesmo autor, e a impressão que me ficou foi além das expectativas. Mais uma vez Tácito Costa retomou a “aventura do cotidiano”, abordando temas instigantes, não raro com ironia, em linguagem clara e objetiva, que, aliada à leveza de estilo, torna a leitura, extremamente, prazerosa para quem, como eu, curte a magia do Conto (Vá lá o clichê). Só tenho um reparo a fazer: acho que os “instantâneos” (historinhas), colocados no final do livro, ficariam melhor em outro tipo de coletânea.
Houve Uma Vez em Betânia
Outro bom livro que li, recentemente: “Houve Uma Vez em Betânia”, novela de Francisco Sobreira (Offset Editora, 2001). Em narrativas repassadas de certa nostalgia, conta-se aí a vivência de um médico (supõe-se que alter ego do autor) numa cidade do interior cearense – suas impressões sobre o meio, suas relações de amizade, seus amores, etc.
Apesar de subtítulo – “Uma narrativa entre ficção e memória” -, o gênero em que se enquadra a obra, não é, de modo algum, a Memorialística, mas, sim, a Novela, embora esta se situe na fronteira com o Romance.
No prefácio, o escritor Thiago Gonzaga, concluindo análise, do ponto de vista literário, afirma:
“Partindo de algumas experiências pessoais, o autor, neste livro, recriou o real, dando origem a um fato ficcional, e através dele consegue transmitir suas ideias e emoções ao mundo. É desta maneira que a literatura se revela como um objeto vivo, uma verdadeira relação eficaz do escritor com o seu meio.”
Não é preciso dizer mais.
Francisco Sobreira, ficcionista veterano, com alentada bagagem literária, dispensa apresentação.
Sábias palavras do Mário
Mário de Andrade dizia:
“Crítica apologética significa que eu escrevo sobre livros de que gosto.” (cito de memória).
Sábias palavras do Cascudo
É de Câmara Cascudo a seguinte afirmativa constante do seu prefácio ao livro “História da Alimentação no Brasil” (1967):
“Sei dos recenseadores de omissões, mais atentos ao que falta que verificadores do que existe, conto com eles”
Quanta ironia em relação aos proverbiais catadores de ciscos!
Francisco Rodrigues da Costa
Ainda me acho sob o impacto emocional causado pela morte do escritor Francisco Rodrigues da Costa, que ocorreu ontem em 28 de setembro de 2021.
Aos 87 anos de idade, mas ainda em plena atividade literária, Chico de Neco Carteiro, como gostava de ser chamado, partiu para o Outro Lado (se é que este existe), quando os seus leitores ainda esperavam muito dele. Memorialista de primeira linha, escreveu seis livros de reminiscências, quase todos sobre tipos e imagens de sua querida Areia Branca, terra natal – obras que nada ficam a dever a qualquer outra das melhores, no gênero, que se produziram em nosso Estado. Mas, além de suas qualidades intelectuais, Francisco Rodrigues da Costa era uma grande figura humana, simples, cordial, com aquele seu jeitão inconfundível. Um homem de bem.
Em Mossoró, onde vivia há longos anos, todos o estimavam. Seu nome inscreve-se de hoje em diante no Panteão dos Mossoroenses.