Esperando Godot

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Croniketas da Burakera #15, por Ruben G Nunes

O Homem precisa de ilusões. Intensas. Românticas como gaivotas lentiriscando os horizontes dos mares, praias ventos, coqueiros, se enroscando nas lonjuras de nuvens e lembruxas.

Fato curioso: gaivotas nunca voam solitárias. Sempre aos pares, elas voam leves, de mãos dadas. Numa rede de pios de afetos sobre nós. E num repente piam, mergulham, pairam juntas como se em gozodelírio estivessem. Falo dessa leveza emocional que me faz voar mergulhar flutuar como gaivotas. De viver cada segundo como nunca mais. Sim, isso mesmo, falo de afetos, sonhos, fantasias, fé, alegria, desejos.

Mas, não só gaivotas nos arrancam ilusões românticas. Também a cultura popular no seu espontaneísmo carnavalesco. Me lembro dum belo refrão da Beija-Flor de Nilópolis, no samba-enrêdo de 1979, que canta a lei das ilusões promulgada pelo Rei Sonho, no Paraíso da Loucura do Carnaval: “Joguem fora a roupa do dia-a-dia/e tomem banhos nos chuveiros da ilusão”.

Na Política, também nos movemos por românticas ilusões: as ideologias. E seus dogmas de fé, razão, astúcias, radicalismos.

Capitalismo à esquerda, e socialismo à direita.

Vejam só: recebo email de meu amigo jornalista Duarte Guimarães onde ele chama atenção da temática ideológica de uma Conferência sobre Educação na UFRN, no inicio de junho, pela Profa. Lucia Neves. Ela é Pesquisadora do Coletivo de Estudos de Políticas Educacionais/Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio(EPSJV) – Fiocruz, RJ.

Diz o título: “Direita para o social e esquerda para o capital“. Diz o subtítulo: Intelectuais da nova pedagogia da hegemonia no Brasil. Tema provocante. Evoca o papel dos intelectuais orgânicos na revolução cultural de Gramsci. Que educa a consciência ideológica e contra-hegemônica do trabalhador contra a hegemonia do Capital-explorador (“Cadernos do Cárcere”,12 e 13, de 1929). Alguns intelectuais acadêmicos, portanto, ainda ruminam-esperam a revolução comunista, nos conformes das trincheiras culturais de Gramsci.

Grunf! Grunf!

O diabo é que é preciso muita grana e tempo pra essas revoluções. Quem financia quem?

Grunf! Grunf!

Eis um fato-hoje: o mundo atual é inteiramente capitalista.

O capitalismo virou estado de espírito. E espírito dos Estados. Em volta do caroço capitalista o angu político do Poder se faz de ilusões ideológicas. Ou ingênuas. Ou matreiras. Depende do jogo-de-interesses do Capital.

Já não está o mundo dividido em democracia capitalista e socialismo (direita e esquerda). Países ditos socialistas ou comunas são fachadas ideológicas. Ilusões de si mesmo. Subsistem pela economia capitalista. E seus líderes conservam suas esquerdopatias crônicas nas doces lambuzeiras do mel das propinas capitalistas.

Daí outro fato: esquerdas e direitas se esgarçaram ideologicamente. Ampliaram ilusões e mutretas. São, agora, multiflex e intercambiáveis.

Grunf! Grunf!

Nos jogos-de-poder, suas ideologias percorrem toda gama de direitices e esquerdices, segundo os interesses dos jogos-do-capital.

Aliás, o poder político cada vez mostra mais o que sempre foi: fachada de movimentos do capital. O Poder é uma espécie de gerente do Capital, como dizia Marx.

Há, todavia, uma contra-ilusão impensável 50 anos atrás: está surgindo o capitalismo de esquerda.

Um híbrido que o pensador esloveno Slavoj Zizek chama de capitalismo autoritário, em seu livro “Primeiro como Tragédia, depois como Farsa”, 2005.

Exemplo: China.

Na sopa capitalista hoje, direitas se inclinam para o social para não perder zonas de poder. E esquerdas se inclinam para o Capital, para ganhar zonas de poder. Ambas, pourtant, sob o sacro manto do Capital.

O Poder, as benesses do Capital são encantatórios. Todas as esquerdas no poder, encarnam hoje o espírito capitalista. Não adianta espernear. As esquerdas estão todas empenadas e de bandinha.

A baboseira ideológica de hegemonia e revolução cultural são ilusões de superfície. Para Mr.GrandeCapital o que importa é a hegemonia de base: juros e juras fiéis do poder.

O combate contra o Capital, como queria o marxismo, virou combate pelo Capital.

A revolução é nostalgia de buteco. No duro, no duro, revolução é ter conta de banco em paraísos fiscais. Ou malas de propina vagando. Taí Palocci, Geddel e outros. Todavia toda esquerdopatia continua esperando a Revolução. Enquanto pedem mais um chopp.

Grunf! Grunf!

No teatro do absurdo do irlandês Samuel Beckett – Esperando Godot, 1952 – os personagens Vladimir e Estragon esperam Godot… esperam… esperam… embora ninguém saiba direito quem é Godot – uma pessoa? uma ideia? um sonho? – nem porque o esperam… daí Pozzo e Lucky aparecem também pra esperar Godot… Lucky vem com uma pesada mala que nunca larga… seria grana, propina, pra quem?, pra quê?… ninguém sabe… batem um bom papo e esperam Godot… mais um dia e nada… aparece um boy e avisa que Godot só amanhã… semanas, meses, anos, passam e Godot só amanhã avisa o boy… os personagens já estão velhos, menos o boy… e Godot nunca virá… esperam, conversam…

Vladimir: Então, vam’bora camarada?
Estragon: Sim, vamunessa!

Mas eles não se movem. Continuam esperando Godot…

Como na peça de Samuel Beckett, nossa ex-esquerda-aguerrida, agora esquerda-bolivari-ânus, no jogo político, joga “ao vivo” o jogo-do-capital… esperando a revolução contra o Capital.

Também nossos intelectuais orgânicos-mal-organizados ruminam-esperam nas academias, sindicatos e coletivos a revolução redentora… esperam… esperam… enquanto malas entupidas de propina passam nos closes das TVs… grunf! grunf!… psiu!.. fala baixo, mané!.. tá sendo gravado!.. Grobo fidaputa!..

… e o tempo passa e continuam esperando a Revolução e Godot… ainda e ainda…
… garçon! me vê mais um chopp com 2 dedos de espuma ideológica…
Assim é a VidaViva!

Ruben G Nunes

Ruben G Nunes

Desfilósofo-romancista & croniKero

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