Esse post se deve ao achado por acaso deste entrevista, realizada em 2012 e publicada no Diário de Natal. Se deve por sentir falta de Dorgival na programação junina de Natal. Se deve pelo orgulho de tê-lo como potiguar. Se deve por o cara ser gente boa demais. E se deve para manter mais um registro de entrevista minha perdida pela web aqui no nosso Papo Cultura, onde deveria estar de fato.
A Olho D’Água dos Borges de 30 anos atrás, de tão tranquila, se escutava o som dos raios solares adentrando a janela no amanhecer. Para o pequeno Dorgival Dantas de Paiva, a melodia mais audível, no entanto, vinha da sanfona ‘veronese’ do pai Cícero. Logo cedo o arrastado do fole troava, e as harmonias penetravam na mente e no coração de Dorgival da mesma forma que o sol entrava pela janela da humilde casa. Na noite de amanhã o público tem a chance de assistir o resultado dessa influência paterna, da sanfona nordestina. E mais: pode participar da gravação do novo DVD do cantor e compositor potiguar, reconhecido nacionalmente.
O show e gravação do novo DVD com todos os sucessos da carreira acontece na Arena Circo da Folia, em Pirangi. “Gravar esse DVD em solo potiguar me enche de orgulho, assim como também me enche de orgulho hoje eu ser um cidadão cearense. Nasci em Olho D’Água dos Borges, no RN, lugar que levo no coração e termino tendo um amor imenso por ambas as terras. Então, fazer esse registro na Arena Circo da Folia me dá uma estrutura excelente e visibilidade que nós precisamos para levar um trabalho que vem dando certo no Nordeste para todo o Brasil”, declara o hoje órfão Dorgival Dantas, mas filho do Nordeste musical brasileiro.
Dorgival ascendeu na música após superar o trauma da morte do pai. Aos 13 anos já tocava sanfona. Aos dezessete anos, já morando em Natal, começou a se familiarizar com o teclado. A escolha do novo instrumento possibilitou diversos trabalhos, seja individualmente ou acompanhando vários cantores. Em agosto de 1991 passou a acompanhar Messias Paraguai, até 1997, quando partiu para Fortaleza, aos 19 anos, e onde alcançou parte dos seus objetivos profissionais. Dois anos depois, em 1999, morre seu pai e exemplo maior. E Dorgival deixa de tocar sanfona por cerca de cinco anos.
Aos 25 anos se “amigou” de novo com a velha companheira, tocando com um grupo de amigos. As várias idas e vindas ocasionaram seu encontro com o cantor Flavio José na cidade de Picuí (PB). Foi quem lhe deu apoio e sugeriu a escolha do nome artístico Dorgival Dantas. Do encontro resultou a gravação das músicas Menino chorão e Casa de sapê. E a carreira desandou. Pelo talento de compositor veio o reconhecimento. Diversas canções dominaram o gosto popular: Eu não vou mais chorar, Paixão covarde, Me dá um beijo, Pode chorar.
Com a música Coração, gravada pela banda Aviões do Forró, veio a concretização do seu sucesso em âmbito nacional. Você não vale nada, inicialmente gravada pela banda Solteirões do Forró e depois pela banda Calcinha Preta, foi inclusa na trilha sonora da novela Caminho das Índias e transformou-se em sucesso nacional. Vieram os convites para programas como Fantástico, Programa do Didi, Programa do Faustão… Desde então suas composições têm sido interpretadas por diversos artistas: Jorge e Mateus, Cesar Menotti e Fabiano, Maria Cecília e Rodolfo, além dos cantores Alexandre Pires e Frank Aguiar.
“Vamos registrar em DVD tudo o que vem dando certo na nossa estrada. Isso é fundamental para que novos públicos conheçam o que o nosso público cativo já conhece e aprova. Estamos muito felizes em poder registrar isso com áudio adequado, luz e palco, suficientemente estruturados para o que queremos”, conclui Dorgival. O sanfoneiro é discípulo do mestre Luiz Gonzaga, admirador de Jackson do Pandeiro, Trio Nordestino e um grande defensor da valorização feminina.. É ele quem conversa com o Diário de Natal e comenta sobre o novo DVD e o atual cenário do forró nordestino.
ENTREVISTA – DORGIVAL DANTAS
Por que a gravação do DVD em Natal? É seu primeiro DVD? Será lançado por qual gravadora?
O RN tem sido muito generoso comigo, além de ser o meu estado, já que nasci em Olho D’água do Borges. Então, achei que seria um ótimo momento e o lugar certo para fazer esse registro. O selo é próprio e o DVD feito em parceria com a Destaque Promoções.
Suas canções são famosas na voz de outros intérpretes, muitas vezes confundidos como autores das canções. Bate uma ciumeira às vezes?
De jeito algum. Eu tenho um imenso orgulho que minhas composições sejam gravadas e regravadas e acredito que a confusão com a autoria é mais salutar do que prejudicial. A arte é maior do que o artista.
Quando chega um CD de inéditas?
Eu tenho consolidado um trabalho na estrada. O DVD nascerá justamente para registrar isso, embora inéditas nasçam o tempo todo. Mas o registro delas ficará para um outro momento, quando eu conseguir levar para cada vez mais públicos o que já tem dado certo por onde eu passo.
Mesmo residindo em Fortaleza, você tem contato com grupos e artistas potiguares? Quem você destacaria?
Eu sou potiguar, apesar de também ter a honra de ser cidadão cearense. Destaco o trabalho de compositores como Elino Julião, talento aqui do RN.
Você acredita que faria o mesmo sucesso se tivesse permanecido em Natal?
É difícil dizer como as coisas teriam acontecido. Eu prefiro olhar para o que pode acontecer daqui pra frente e gravar o DVD aqui com vocês é um excelente começo.
Você se diz, a exemplo dos bons forrozeiros, um discípulo de Luiz Gonzaga, além de admirador de Jackson do Pandeiro, Trio Nordestino… Todos autores de canções do chamado forró pé-de-serra, do xote, do baião. Como você analisa o atual cenário do forró no Brasil, dominado pelo chamado forró eletrônico?
Eu acho que existe espaço para todo mundo. Mesmo. É importante que o forró se democratize, no sentido de beber de vertentes mais pops, digamos assim. O forró eletrônico tem esse apelo e eu não tenho absolutamente nada contra. Essa coisa dos ‘paredões ’é puro entretenimento. É uma turma jovem, alegre e que está aí cheia de energia. Isso é maravilhoso de qualquer forma.
Boa parte das atuais bandas de sucesso no forró já gravaram canções suas. E são canções de valorização da mulher. Como você encara grupos de forró que deturpam essa valorização e até incentivam o machismo, o alcoolismo e a prostituição?
Essas três depreciações que você citou precisam ser combatidas em qualquer área, não só na música. Eu não me sinto à vontade para cantar, mas é preciso também lembrar que muitas vezes uma música é apenas uma música. Serve para muitas coisas, inclusive divertir. Acredito que se dosada de maneira correta, sem exageros, termina só levando discontração ao povo. E de alegria o povo brasileiro precisa.