ENTREVISTA: Alexandre Carlo, do Natiruts: “A fé está acima das religiões e a música está acima de estilos musicais”

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Hoje é o Dia Internacional do Reggae e para este regueiro de alma celebrar a data, resgatei esta entrevista que fiz com o vocalista do Natiruts para o Diário de Natal, em alguma data de março de 2012. Positive vibration para iniciar a semana e celebrar o ritmo libertário de Bob!

Por Sergio Vilar

Quando o então Nativus estourou nas rádios com “Beija Flor” e “Liberdade Para Dentro da Cabeça”, o reggae nacional vivia um período de estagnação. O Cidade Negra tinha dado uma pausa e nenhum outro grupo ou cantor despontava com a “pegada” necessária para furar o poderoso bloqueio da grande mídia. O Nativus supriu a lacuna e produziu vários hits do álbum de estreia, fidelizou público nos discos e shows seguintes e hoje se dá ao luxo de lançar um DVD acústico a pedido dos fãs.

Mas, falamos de reggae. E regueiro que se preze despreza a cultura de massa, sobretudo quando a massa é um engodo gorduroso enfiado goela abaixo. O hoje Natiruts, do mesmo vocalista, compositor e líder da banda Alexandre Carlo, se afastou das rádios e da mídia; já cedeu espaço à nova geração de bandas de reggae e hoje concentra atenções ao público dos shows: aquele que compra o ingresso para assistir quem gosta, e não o zumbi televisivo boquiaberto com o que lhe é transmitido via satélite.

Com postura mais independente e mais experiência após 17 anos de estrada, a banda desembarca em Natal para show neste sábado, no Praia Devassa (Via Costeira), junto aos potiguares regueiros do Alphorria e à banda de rock de repertório oitentista, Uskaravelho. Na entrevista abaixo, Alexandre Carlo comenta da aceitação da banda no exterior e da opção pelo modelo acústico do novo trabalho – ora, se Bob Marley gravou Redemption Song, por que não o Natiruts?

COM ALEXANDRE CARLO

O reggae chegou pelo serrado em Brasília? Como começou a história do então Nativus?

O Nativus começou através de mim. Eu criei o boneco chutando a bola, o nome Nativus e as canções que fizeram parte do primeiro álbum. Mas como eu sempre gostei dessa coisa de compartilhar preferi criar uma banda em vez de seguir carreira solo. O interessante é que naquela época todo mundo queria ter uma banda de rock em Brasília, então capital do rock. Nas primeiras apresentações na cidade era comum nos perguntarem se éramos da Bahia ou do Rio.

O reggae passa por um momento de baixa no Brasil, pelo menos na grande mídia?

Pode ser. Mas o que está em alta? Canções de duplo sentido, apelo sexual, apologia ao álcool? Independente do que seja os artistas mais festejados pelo povo e pela imprensa sempre serão os que estão em alta na mídia, independentemente do conteúdo.

Há muito não vemos um grande hit de reggae nas rádios. O motivo é a baixa produção, a má qualidade ou o preconceito das rádios com o gênero? Ou qual seria o motivo?

Não sei. Faço música porque gosto. Por isso o resultado que mais importa para mim é a presença das pessoas nos shows. É a verdade do artista. Mas falando em hit já tivemos inúmeros no Brasil e realmente não é o foco do nosso trabalho atual. No entanto lançamos o DVD em Portugal e a canção ‘Sorri, sou rei’ é hoje a música mais tocada em língua portuguesa no além mar. E em dezembro lançaremos o DVD na Argentina. Enfim, nosso trabalho é feito para o nosso público e nada mais.

Por que um DVD acústico quando faltam canções essencialmente regueiras nas rádios e na mídia em geral?

Jesus Cristo nos ensinou que a fé está acima das religiões. A música está acima dos estilos musicais. Uma das canções mais emblemáticas de Bob Marley, que falava da guerra fria na época de seu auge, foi ‘Redemption song’. Acústica.

No que o Brasil colaborou, musicalmente, para o reggae jamaicano? O reggae produzido aqui já está ritmicamente amadurecido?

A Jamaica ama o Brasil. Bob Marley amava o Brasil. Contribuímos com a Jamaica em todos os sentidos. Não só na música.

Você ainda sente preconceito como negro ou como vocalista de uma banda de reggae?

No fundo o preconceito é medo. Medo de alguém que pode te superar. É a insegurança de saber que em igualdade de condições aquela outra pessoa seria muito melhor que você.

Artista nunca gosta de rotular sua música, porque realmente delimita o trabalho. Mas há sempre uma corrente predominante, embora o trabalho de vocês tenha experimentado diferentes correntes do reggae. Mas no reggae do Natiruts predomina o pop ou o roots?

Não sei. E nunca parei para analisar nossas canções dividindo-as por estilo, se essa é A e aquela é B. Gostamos de todas. Eu ainda tenho dúvidas se pop é um estilo musical ou se é um posicionamento do artista na mídia. Se ele está pop ou não atualmente, por exemplo. Geralmente no Brasil o termo pop é usado de forma pejorativa. Como algo que não é tão legal. Já nos Estados Unidos eles dizem que o rei do pop é o Michael Jackson – um artista incontestável. Vai entender…

No que a banda evoluiu desde “Liberdade para dentro da cabeça”?

A essência do artista é algo que ele traz desde o princípio. É o que o define, o que o posiciona. Não sei se a palavra evolução caberia nesse contexto. O que evolui é a experiência de palco, de estrada, você passa a cantar melhor, a lidar melhor com o público nos shows, nas entrevistas. Nas entrevistas principalmente.

O Alphorria, que tocará no mesmo palco de vocês, alcançou algum espaço na mídia nacional nos anos de 1990. Tem uma pegada mais pop. Vocês conhecem o trabalho da galera? E qual a opinião a respeito?

Não conhecemos ainda. Mas sempre é bom dividirmos o palco com companheiros de profissão.

Há uns três ou quatro anos vocês tiveram um entrevero com a MTV em função da criação da categoria Reggae, no VMB. Desde então, salvo engano, não houve espaço para vocês na emissora. O que acham dessa postura da MTV?

É difícil falar desse entrevero, pois as razões oficiais nunca poderão ser expostas. Eu adoro a emissora MTV, não tenho nada contra e nunca terei. Voltei a participar do rockgol esse ano. Mudaram alguns diretores da emissora e no último VMB o Criolo foi o maior vencedor, teve o Planet Hemp se apresentando, o Racionais, o Emicida. Tomara que continue assim.

Você, brasiliense e “surfista do lago Paranoá”, qual sensação em ter “visto” Renato Russo, no show recente no Estádio Mané Garrincha?

Eu entendi como uma homenagem. E não que seria ele cantando ali. Eu cantei ‘Faroeste Caboclo’ antes do holograma. Como sou fã desde sempre, valeu muito a experiência.

A geração de Renato Russo foi chamada de “Coca-cola”. Qual seria o adjetivo para a atual para os jovens da atualidade?

Não sei. Seria Red Bull?

Rapidinhas:

Tribo de Jah: respeito

Capoeira: é Brasil

Maconha (legaliza?): sim

Religião Rastafari: Bob Marley

Jimmy Cliff: ícone

Natal: qualidade de vida

Sérgio Vilar

Sérgio Vilar

Jornalista com alma de boteco ao som de Belchior

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