O rock e o jornalismo caminharam muito tempo juntos. Deram umas boas tragadas também, emanados a uma época de sonhos e idealismos. De quando música, política e cultura se misturavam sem sectarismos.
O começo desse casamento pode ser contado a partir do lançamento da mais emblemática publicação cultural de todos os tempos: a revista Rolling Stone, uns bons 50 anos atrás, justo na época efervescente do rock.
Quando assisti essa semana ao documentário ´Rolling Stone Stories From the Edge’ desejei uma máquina de escrever, uma redação esfumaçada e um pub popular americano para tomar umas brejas ao fim do expediente e sacar a nova cena folk que nascia na distante década de 60.
A Rolling Stone entendeu, desde o início, que aquele rock era mais que música. E em pouco tempo se tornou a voz de uma geração. E assim, o rock também compreendeu que aquela publicação era mais que uma revista.
E por aquelas páginas passou o melhor da cultura e contracultura dos mágicos anos 60 e 70. Não só do rock, mas do jornalismo. Textos com sensações, contextos, fatos, críticas. E textões, sem pedir licença aos leitores de facebook. Matérias inovadoras, tanto quanto aquele som elétrico que ganhava o mundo.
A febre beatlemaníaca, a rebeldia dos Rolling Stones, a guitarra de Clapton, eram novidades quase revolucionárias. E quando o som rocker se familiarizava aos ouvidos, surgia uma flauta do Jethro Tull, a estética de Bowie, o contrabaixo do Joy Division… E uma ousada manchete intitulada: “Nasce uma estrela do rock”. E lá estava o jovem Bruce Springsteen.
O experimentalismo cabia à época. E assim também surgia o jornalismo gonzo. E a Rolling Stone embarcou com o maior expoente do gênero: Hunter S. Thompson, um porraloca que escrevia movido a alucinógenos com textos tão alucinantes quanto.
Um tempo realmente mais romântico, libertário à música e ao jornalismo. Redações barulhentas, cinzentas, diferentes do ambiente clean e silencioso de hoje. Jornalistas que cobriam show de gênios da música e não celebridades do show business. Jornalismo gonzo x jornalismo google. Woodstock x passeatas alienantes.
Repórteres da Rolling Stone tinham contatos diretos com Lennon, com Springsteen, com o Fleetwood Mac; iam a suas casas e coletavam entrevistas históricas, espontâneas. Hoje há o intransponível obstáculo do marketing, e… o que as celebridades de hoje têm a dizer?
Nada. O rock perdeu expressão; virou gênero musical. Experimentou e inalou tudo o que podia e hoje é repetição de tudo. Um senhor cansado, sentado ao sofá com o controle na mão. E sem sua matéria prima, a Rolling Stone também afundou em depressão.
Rock de youbube. Jornalismo de blog. O mundo é outro, baby. Já não levantamos o dedo em V. Se o sonho acabara junto com os Beatles, enquanto os EUA fincavam bandeira na lua, o rock e o jornalismo perduraram mais algumas boas décadas, mas sucumbiram.
Nixon, o Vietnã, a iminência da Guerra Fria desembocaram em três dias de Woodstock. Agora pense: o rock Lollapalooza consegue reviver aquela aura de paz, cultura e política? Contentem-se com o tom sombrio de Lana Del Rey. É o que temos de impacto para o momento.
A Rolling Stone publicou a última foto de John Lennon, pouco antes de sua morte. Ele está nu, junto a Yoko. Nu artístico que o facebook, por certo, bloquearia. É que o mundo hoje respira falsa moral, alimento perfeito para blogs, umas guitarras distorcidas e uns ouvidos com ânsia de novidades.
Na década de 70 diziam que a morte tinha a letra J, com as mortes precoces de Jim Morrison, Janis Joplin, Jimi Hendix e, no abrir da década oitentista, John Lennon. Ninguém nem desconfiava que morreria, no século 21, também seu velho companheiro Jornalismo.
1 Comment
[…] Mas, claro, não seria o fim do Nirvana que sacramentaria um comportamento cultural. Sim, porque o rock, desde sempre foi muito mais do que música. Unido ao jornalismo contracultural ou publicações como a Rolling Stone, moldou gerações e influenciou o d…. […]