Hoje um dos mais famosos potiguares do mundo em toda a história completaria 101 anos. Aldo Parisot morreu em 29 de dezembro do ano passado. Pouco depois de receber merecida homenagem da Escola de Música da UFRN pelos seus 100 anos: um concerto magistral com violoncelistas locais, nacionais e internacionais.
Aldo Simões Parisot morreu “enquanto ouvia Bidu Sayão cantando A Casinha Pequenina e as Bachianas Brasileiras no. 5, de Villa-Lobos”, segundo anunciou o portal oficial do “mais importante professor de violoncelo dos Estados Unidos”.
Parisot levou consigo muito da história e da identidade musical do Rio Grande do Norte. Uma identidade sempre fruto de discussões. Mas o músico e compositor pode explicar uma tradição inédita no Estado potiguar e corroborar a tese de que a música instrumental, e mais especificamente o violoncelo, é a principal tradição musical do Rio Grande do Norte.
Mas essa história começa antes de Aldo Parisot, e fora da geografia norte-rio-grandense. Em 1885 nascia em Faenza, na Itália, Tomazzo Babini ou Thomaz Babini, como ficou conhecido no cenário musical. Na primeira década do século 20, já violoncelista, chegou ao Brasil, primeiramente no Rio de Janeiro. Na então capital brasileira ele foi assistente de Heitor Villa Lobos – posto que logo se inverteu, proposto pelo próprio maestro brasileiro que passou a ser seu assistente.
Thomaz Babini em Natal
A temporada de concertos da Sinfônica do Rio de Janeiro era pequena e Thomaz Babini continuou a tocar com seu Trio, visitando Belém, Fortaleza, Recife… Consta que em 1907, chegou a Natal. Segundo seu filho Italo Babini, ele ficou encantando com a cidade e seu clima. Apesar de a cidade não possuir um violoncelista, eram muitos os natalenses que possuíam um considerável conhecimento e gosto pela música clássica, e essas pessoas o convenceram a morar em Natal.
Para criar uma escola de violoncelistas, o professor Severino Bezerra, diretor de um Ginásio, o ajudou muito na sua realocação. Babini criou uma orquestra de câmara e dirigiu a escola de música no então Teatro Carlos Gomes, nomeado Teatro Alberto Maranhão, em 1957.
“Meu pai aos poucos se transformou em uma atração no mundo musical de Natal. Ele era também um bom pianista, e nessas ‘horas de música’, veio a conhecer Luiz Parisot, um engenheiro que se casaria com minha mãe. No casamento de Luiz Parisot com a minha mãe, meu pai tocou um belo programa na Igreja”.
Luiz Parisot faleceu após dez anos de casado. E Babini assumiu o posto sendo um pai exemplar para os filhos do Parisot – Danilo o Aldo Parisot. Thomaz Babini morreu em 1949, em Recife. É considerado hoje um dos músicos de concerto mais conceituados do século passado.
Herança ao filho e ao enteado
Em Natal, Thomaz ensinou violoncelo ao filho Italo Babini, que repassou o conhecimento ao também natalense Aldo Parisot, então irmão de criação. Ambos continuaram a obra de Thomaz e deram início à tradição de notáveis violoncelistas de Natal reconhecidos no mundo.
Confira aqui uma entrevista rara com Italo Babini para nosso blog.
Ítalo e Aldo Parisot eram residentes famosos da Ribeira, ali próximo ao hoje Buraco da Catita. Há relatos que recontam a história de Natal, do som advindo do violoncelo da casa dos Babini por quem passasse pelo já movimentado bairro naquela época. Anos depois, Parisot, assim como o padrasto Thomaz, também foi colaborador de Villa-Lobos e dirigiu algumas das maiores orquestras do mundo.
No cenário musical do mundo, Parisot está para Natal como Tom Jobim está para Ipanema. Sua biografia foi publicada recentemente na Inglaterra pela professora Susan Hawkshaw. Ele foi o último colaborador vivo próximo de Villa-Lobos, que lhe dedicou duas peças para violoncelo e orquestra. Durante mais de 60 anos foi professor catedrático da Yale University, nos EUA. Se aposentou três meses antes de morrer.
Até ano passado, Parisot vivia nos Estados Unidos. Babini, aos 91 anos, permanece por lá. E a tradição de violoncelistas natalenses é continuada hoje sob o comando do professor Fábio Presgrave, na Escola de Música das UFRN, com vários de seus alunos premiados internacionalmente.
A música instrumental no RN
Vimos portanto um linhagem secular de violoncelistas natalenses. Por outro lado, também temos uma tradição de bandas de música no interior do Estado, incomum em comparação a outros estados. Seria outra tese fundamentada como identificação musical potiguar. Músicos como Tonheca Dantas, Felinto Lúcio, Oswaldo de Souza, Waldemar de Almeida, K-Ximbinho, Waldermar Ernesto são nomes legítimos dessa tradição.
Portanto, a música instrumental, representada depois por nomes mais contemporâneos como Tico da Costa e Manoca Barreto. Ou os de hoje, como os irmãos Taufic, Júnior Primata, Joca Costa, Edu Gomez, Jubileu Filho e Bethoven, Sérgio Groove, e até mesmo a novidade do Júnior Groovador. São talentos que evidenciam a força da música instrumental potiguar ao longo da história, muito acima do zambê, do côco, do forró ou outro gênero musical.
Então, seja no violoncelo com Thomaz Babini e a continuidade com Italo Babini, Aldo Parisot e, hoje, com Fábio Presgrave. Seja pela tradição das bandas de música com nosso Royal Cinema e nomes como o maestro Bembem Dantas, que mantém viva a magia das bandinhas e filarmônicas pelo interior, a música instrumental potiguar é e será por muito tempo a nossa verdadeira identidade musical.
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Sérgio, parabéns pelo blog. Sou fluminense, filho de potiguares: José Augusto da Câmara Torres (*Caicó, 1917 – †Niterói, 1998), jornalista, educador, advogado e político; e de Gertrudes Nóbrega da Câmara Torres ( (*Caicó, 1919 – †Niterói, 1989), professora e técnica educacional. Sou sócio correspondente do IHGRN desde 2007. Meu pai era primo de Luís da Câmara Cascudo e de Dom Hélder Câmara. Para sua informação: em 1940, Aldo Parisot se apresentava em Recife, no Teatro Santa Isabel, ao lado do pianista, meu saudoso amigo Túlio Tavares, com quem trabalhei em Brasília no período 1977-9. Túlio, artista amador, de grande cultura e sensibilidade, era irmão de outro gigante potiguar, o talentosíssimo músico, maestro e compositor, também natalense, Mário Tavares, o brasileiro que mais divulgou a obra de Villa Lobos, aqui e no exterior. Mário ficou muito conhecido regendo orquestras nos Festivais Internacionais da Canção, no Rio, na década de 1960. Uma informação sobre Parisot, que, não sei, se você já possui: Para o célebre violoncelista húngaro Janos Starker (1924-2013), Parisot foi o maior violoncelista que ele viu tocar.
Sérgio, parabéns pelo blog. Sou fluminense, filho de potiguares: José Augusto da Câmara Torres (*Caicó, 1917 – †Niterói, 1998), jornalista, educador, advogado e político; e de Gertrudes Nóbrega da Câmara Torres ( (*Caicó, 1919 – †Niterói, 1989), professora e técnica educacional. Sou sócio correspondente do IHGRN desde 2007. Meu pai era primo de Luís da Câmara Cascudo e de Dom Hélder Câmara. Para sua informação: em 1940, Aldo Parisot se apresentava em Recife, no Teatro Santa Isabel, ao lado do pianista, meu saudoso amigo Túlio Tavares, com quem trabalhei em Brasília no período 1977-9. Túlio, artista amador, de grande cultura e sensibilidade, era irmão de outro gigante potiguar, o talentosíssimo músico, maestro e compositor, também natalense, Mário Tavares, o brasileiro que mais divulgou a obra de Villa Lobos, aqui e no exterior. Mário ficou muito conhecido regendo orquestras nos Festivais Internacionais da Canção, no Rio, na década de 1960.
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