A PEGADA DO SANTO
São Tomé esteve em Natal in illo tempore. Assim reza a lenda.
Em seu livro “História da Cidade do Natal” (1947), afirma Câmara Cascudo: “A cacimba de São Tomé aparece citada desde fins do século XVI (…) Deu nome à rua de São Tomé e tomou esta denominação por haver uma pedra com a impressão de um dos pés do Apóstolo”
Acrescenta Cascudo:
“A cacimba está encravada atualmente (1946) dentro de uma propriedade privada e creio ter desaparecido. A pegada de São Tomé tem muitos séculos de fama como existente na Cidade do Natal. Frei Claude d’Abbeville registrou discurso de Japiassu, no Maranhão, ao capitão senhor de Rasily. Japiassu afirma ter visto as marcas dos pés do profeta, sinais indeléveis, no rochedo próximo de Potitu, Potengi (“História da missão dos padres Capuchinhos na ilha do Maranhão”, 61, da versão brasileira).”
A Rua São Tomé situa-se no centro de Natal: vai da Praça Tomaz de Araújo à Rua Juvino Barreto.
APARIÇÕES NA GUERRA HOLANDESA
A MULHER DE AZUL
Durante a guerra holandesa, indo os brasileiros combater os invasores fortificados na lagoa de Groaíras, travou-se peleja à margem da lagoa, que viria a denominar-se lagoa da Batalha.
Conta-se que, em meio à luta, surgiu uma mulher vestida de túnica azul e que distribuía, numa coité, areia que se transformava em pólvora, facilitando aos brasileiros o êxito que alcançaram.
A mulher de azul era Nossa Senhora dos Prazeres, mais tarde padroeira de Goianinha.
É bem provável que esta lenda tenha sido divulgada como propaganda na guerra contra o holandês.
A SANTA DO AZORRAGUE
Quatro de outubro de 1645, em plena guerra holandesa, os hóspedes e prisioneiros do castelo de Keulen (Fortaleza dos Reis Magos), entre eles João Lostau Navarro e o vigário de Natal, Pe. Ambrósio Francisco Ferro, foram postos em batéis (pequenos barcos) e tiveram ordem de seguir, sob a guarda holandesa, pelo Potengi acima. Iam certos de que estavam no caminho dos seus lares.
Mas, nas margens da lagoa de Uruassu, os batéis pararam e os flamengos mais duzentos e tantos índios aliados iniciaram a célebre chacina, que é uma página de vergonha na história da dominação holandesa. Os brasileiros sofreram torturas incríveis antes de serem assassinados.
Pois, conta-se que, enquanto isto ocorria, uma menina de oito anos, indo refugiar-se numa casa das proximidades, saiu dali muito consolada e dizendo ter visto uma mulher alta, de branco, que tinha cólera no olhar e na mão um azorrague, e assim falava: “Cala-te filha, que com este açoite que aqui vês, hão de ser castigados os que fazem tamanha crueldade, como logo saberás”.
Câmara Cascudo, nas “Histórias que o Tempo Leva” ( 1924) diz ser a menina da lenda a filha de um certo Diogo Pinheiro.
Vítimas da chacina foram canonizadas pelo Papa Francisco, em 2017, e tornaram-se os Santos Mártires de Uruassu.
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PRESENÇA DO MISSIONÁRIO
AMANAIARA
Citando Cândido Mendes, que, por sua vez, citou o Pe. Antonio Vieira, Nestor Lima conta o seguinte episódio, em conferência publicada na revista do Instituto Histórico e Geográfico do R.G. N., vols.X XLV- XLVII, págs. 5 e 6.
Indo em missão aos sertões da Capitania do Rio Grande, o Pe. Francisco Pinto encontrou-os sob os rigores de grande seca. As árvores torravam ao sol do meio-dia, e os animais morriam de sede.
Então, o jesuíta ajoelhou-se no descampado e orou, o olhar voltado para o céu. Com pouco mais, formou-se “torre”, que foi ” desfiando”; chuva grossa, de alagar os campos.
Por isto o Pe. Francisco Pinto recebeu dos índios o apelido de Amanaiara: Senhor da Chuva.
Numa Colônia de formação católica, não é de estranhar, nesta, como em outras lendas, a presença do missionário. No Rio Grande do Norte haviam Missões em Estremoz (São Miguel de Guajiru); Arez (S. João Batista de Guaraíras); Apodi (S. João Batista do Apodi); S. José de Mipibu (Aldeia de Mipibu) e Vila Flor (Gramació).
O LAMENTO DO DIABO
Há muito e muito tempo, certo Frei Sebastião, quando fazia missões em Santa Cruz, achou de mandar recolher na vila todas as armas, instrumentos musicais e adereços de senhoras – que reputava coisas demoníacas – e os enterrou ao pé do cruzeiro do Serrote.
Desde então apareceram estranhos rumores para os lados do Serrote, também chamado de Serra de São Pedro. O povo acreditava que aquilo era o diabo chorando a perda dos objetos enterrados.
Em “Nomes da Terra” (1968) Câmara Cascudo cita Nestor Lima, fazendo referência à lenda.
SANTA QUE RETORNA AO LUGAR DE ORIGEM
NOSSA SENHORA DOS PRAZERES
A origem do culto a Nossa Senhora dos Prazeres, em Goianinha, está envolta na lenda. Em eras remotas do século XVIII, foi achada ali, sobre um tronco de carnaubeira uma imagem daquela santa.
A descoberta provocou exaltação no misticismo popular. Tratou o povo de conduzi-la em romaria até ao altar improvisado nas proximidades da lagoa da Batalha, lugar onde se pretendia construir a capela.
Alguns dias depois, o nicho encontrava-se vazio e a santa no lugar de antes. Trouxeram-na de volta. Mas não tardou que fosse encontrada no tronco da carnaubeira. Então, todos compreenderam: era ali mesmo que a santa desejava permanecer. Construíram novo altar e, depois, a capela, naquele local, onde hoje se alevanta a matriz de Nossa Senhora dos Prazeres.
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