A TV Globo exibiu recentemente uma minissérie contando a história de Chitãozinho e Xororó. Assisti a alguns episódios e achei interessante conhecer alguns detalhes da história da dupla que enfrentou no início da carreira inúmeras dificuldades (como a grande maioria dos artistas). A dupla gravou seu primeiro LP em 1970 e fez um estrondoso sucesso com a música Galopeira. A canção de autoria do paraguaio Maurício Cardoso Ocampo, com a gravação de Chitãozinho e Xororó, ganhou projeção nacional e abriu as portas para José Lima Sobrinho (Chitãozinho) e Durval de Lima (Xororó) para o sucesso, em uma época em que a música sertaneja era chamada de música caipira.
Com o tempo, depois de enfrentar inúmeras dificuldades para firmar o nome no cenário musical, a dupla Chitãozinho e Xororó evoluiu e, em 1982, gravou uma canção que foi um marco divisório na sua história, cuja letra começa assim: “Quando a gente ama qualquer coisa serve para relembrar / Um vestido velho da mulher amada tem muito valor… E depois a letra prossegue, falando da saudade deixada por um grande amor perdido: “Aquele restinho do perfume dela que ficou no frasco / Sobre a penteadeira mostrando que o quarto / Já foi cenário de um grande amor…” E no refrão: “E hoje o que encontrei me deixou mais triste / Um pedacinho dela que existe / Um fio de cabelo no meu paletó…” A canção chama-se Fio de Cabelo. Consagrou de vez a dupla, substituiu o termo música caipira por música sertaneja e abriu novas perspectivas para a produção do estilo musical no Brasil.
Algumas vezes canções românticas conseguem, através das suas letras, de melodias sentimentais e de arranjos inspirados, criar verdadeiros clássicos. No Brasil, temos inúmeras canções que, cada uma a seu modo, se tornaram imortais por abordarem temas aparentemente triviais, mas com profundo conteúdo sentimental e até psicológico. Existem dezenas de casos, mas, sem dúvida, pelo menos três podem servir de exemplos: Detalhes, gravada por Roberto Carlos (O ronco barulhento do seu carro, a velha calça desbotada…), Tortura de Amor, sucesso de Waldick Soriano que por pouco não foi censurada durante o regime militar por causa da palavra Tortura (Hoje que a noite está calma, e que minha alma esperava por ti…) e Fio de Cabelo (Lembrei de tudo entre nós, do amor vivido, aquele fio de cabelo comprido…)
Em meados dos anos oitenta, em uma viagem que fiz a São Paulo para participar do programa do Bolinha e fazer alguns shows, conheci, nos bastidores do programa na TV Bandeirantes o compositor Dino Rossi, autor de Fio de Cabelo. A canção de Dino Rossi fez sucesso nas mais diversas classes sociais, pois na letra da música existem referências a elementos que estão presentes no cotidiano de grande parte da população: o vestido da mulher amada, o resto do perfume no frasco, a penteadeira… Estas são citações que evocam a lembrança e a saudade de um grande amor que partiu.
Outras canções populares também podem ser citadas como exemplos de músicas que, com versos simples e melodias que despertam emoções, se tornaram clássicos do cancioneiro brasileiro, exatamente porque traziam mensagens que falavam de situações que fazem parte do dia a dia de casais apaixonados, independente da classe social a que pertencem. Alguns exemplos são Fuscão Preto, de Almir Rogério, Entre Tapas e Beijos, de Leandro e Leonardo e até mesmo Ronda de Paulo Vanzolini, gravada pela primeira vez em 1953 por Inezita Barroso, que fala de “cena de sangue na avenida São João”, trecho cuja melodia foi utilizada na introdução de Sampa, grande sucesso de Caetano Veloso.
O disco com a música Fio de Cabelo vendeu 1,5 milhão de cópias e alterou completamente o mercado fonográfico do estilo sertanejo. A partir do sucesso estrondo de Fio de Cabelo teve início um processo de urbanização do estilo, que deixou de ser quase uma exclusividade do universo rural, se estendendo para o ambiente urbano.
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