Um defensor da nossa literatura

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Há alguns anos, observava-se, no Curso de Letras da UFRN, uma grande prevenção contra a literatura norte-rio-grandense. Escritores locais eram quase sempre ignorados, notadamente nos estudos da pós-graduação. Valia o ditado: “Santo de casa não obra milagre”. Tal mentalidade, felizmente, foi sendo modificada ao longo das décadas, graças a professores esclarecidos, como, por exemplo, Tarcísio Gurgel, e Humberto Hermenegildo, profundos conhecedores da realidade cultural da nossa terra. No entanto, apesar da eficaz atuação destes, ficaram alguns resquícios daquela prevenção, talvez por conta de professores provenientes de outras plagas, que aportaram na UFRN, mediante concurso, com inegável competência, porém, alheios à Intelligentzia potiguar.

Consola-nos saber que uma nova geração de mestres veio preencher a lacuna deixada com a aposentadoria daqueles pioneiros, entusiastas da literatura potiguar. Nomes como Derivaldo dos Santos, José Luiz Ferreira e Valdenides Cabral, doutores, do mais alto conceito, vieram dar valor ao que é nosso, no ensino das letras. Dentre eles, devo destacar Prof. Derivaldo, por conhecer, há mais tempo, o seu notável trabalho, de modo especial o realizado na área da pós-graduação. Ele é um trabalhador devotado ao seu ofício.

Extremamente criterioso, orientou dezenas de mestrandos e doutorandos, sem jamais discriminar o escritor norte-rio-grandense, mas reconhecendo sempre o valor da prata da casa. Sei de importantes estudos, feitos sob sua orientação, sobre escritores nossos, que nada ficam a dever às estrelas do cenário nacional, entre os quais, Luís da Câmara Cascudo, Bartolomeu Correia de Melo, Diógenes da Cunha Lima, Jorge Fernandes, Madalena Antunes, Nei Leandro de Castro e Palmyra Wanderley. Outros escritores potiguares passaram pelo seu crivo, em bancas: Aurélio Pinheiro, Eulício Farias de Lacerda, José Bezerra Gomes, José Gonçalves de Medeiros, Moacy Cirne e Oswaldo Lamartine de Faria.

Além de professor, Derivaldo é escritor – embora não se assuma como tal –  , havendo publicado vários estudos literários, em destaque os seguintes: Augusto dos Anjos:  uma lâmina do tempo (2002), As marcas da letra ( 2004, org. com Alfredo Cordiviola e Valdenides Cabral), Trama de um cego labirinto (2010, org, com Lourival Holanda e Zuleide Duarte), entre outros, todos bem recebidos pela crítica. Em 2012 coube-lhe a honrosa incumbência de elaborar estudo introdutório à obra completa de Florbela Espanca/Livro de Sóror Saudade.

Em 2016, a Academia Norte-rio-grandense de Letras concedeu-lhe, à unanimidade, o título de sócio benemérito, por relevantes serviços prestados à Cultura regional.

Quando se escrever a História da Inteligência no Rio Grande do Norte, há de se ressaltar a participação desse mestre, e dos seus colegas, da mesma estirpe, na construção da nossa identidade cultural. Hoje a miopia de alguns elementos, talvez não permita avaliar tudo que ele tem feito neste sentido. É pena. Esperemos o julgamento do Tempo, que é o melhor juiz.

Perde a UFRN, perde nossa literatura

Recentemente, soube que o Prof. Derivaldo foi desligado do PPGEL- UFRN (Programa de Pós-Graduação em Estudos da Linguagem). A notícia deixou-me perplexo. Não só ele, mas também outros professores igualmente dedicados, sofreram tamanho golpe. Pior para o PPGEL. Pior para a literatura do Rio Grande do Norte, pelos motivos já expostos.

Encerro este artigo com as palavras de Antonio Candido, adaptando-as à realidade do nosso Estado:

“Comparada às grandes, a nossa literatura é pobre e fraca. Mas é ela, não outra, que nos exprime. Se não for amada, não revelará a sua mensagem; e se não a amarmos, ninguém o fará por nós”. (Formação da Literatura Brasileira, 2013).

Manoel Onofre Jr.

Manoel Onofre Jr.

Desembargador aposentado, pesquisador e escritor. Autor de “Chão dos Simples”, “Ficcionistas Potiguares”, “Contistas Potiguares” e outros livros. Ocupa a cadeira nº 5 da Academia Norte-rio-grandense de Letras.

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