“Há uma incompatibilidade entre a criação literária e a atividade política”. A frase é de Vargas Llosa, que foi candidato à Presidência do seu país.
Como se vê, o grande romancista peruano desiludiu-se com a política partidária. Mas há quem faça, ao mesmo tempo, literatura e política com igual competência. Exemplos encontram-se ao longo da História Universal. Basta lembrarmos alguns nomes icônicos: Júlio César, historiador (De Bello Galico), Winston Churchill, historiador e memorialista (Prêmio Nobel de Literatura, 1953), André Malraux, romancista, memorialista… No entanto, em se tratando de artistas da palavra – ficcionistas, poetas, dramaturgos – são poucos os políticos.
Na história da literatura brasileira constam nomes de políticos famosos, como Joaquim Nabuco, memorialista e biógrafo; Carlos Lacerda, memorialista, autor do livro “A Casa do Meu Avô”; Afonso Arinos de Melo Franco, ensaísta (“Amor a Roma” etc.) e vários outros.
E, em nosso Estado: quais os homens de letras que se envolveram com política partidária? Não poucos!
Primus inter pares, Antônio José de Mello e Souza, sob o pseudônimo de Polycarpo Feitosa, escreveu cinco romances – três deles elogiados por críticos literários de renome nacional – além de contos, memórias, poemas e ensaios. Antônio de Souza exerceu, no RN, altos cargos, foi governador (em dois mandatos), Senador, etc., mas sua verdadeira vocação era a literatura.
Podemos mencionar, ainda, dentre o rol de políticos-escritores norte-rio-grandenses, Juvenal Lamartine, memorialista; José da Penha (promoveu a primeira campanha de cunho popular), ensaísta; José Augusto de Medeiros, historiador, biógrafo; Eloy de Souza, ensaísta, memorialista; Aluízio Alves, idem.
Contemporaneamente, distinguem-se Geraldo Melo, ficcionista, na linhagem do romance regionalista nordestino, e Álvaro Costa Dias, atual Prefeito de Natal, que publicou, por último, estudo histórico, em que enfoca, de modo especial, o tratamento injusto dado aos índios na historiografia brasileira convencional.
PALAVRAS DE JOSÉ SARAMAGO, Prêmio Nobel, 1998:
“Não consigo me ver fora de nenhum tipo de envolvimento social ou político. Sim, sou escritor, mas vivo neste mundo, e minha escrita não existe em um plano separado deste”.
(“The Observer”; Londres, 30-04-2006. Reportagem de Stephanie Merritt).
ESTADISTAS BRASILEIROS
Há muito tempo não temos, no cenário político nacional, um verdadeiro estadista. O último, me parece, foi Getúlio Vargas, apesar de todos os seus erros. Getúlio marcou época. Ele deu a própria vida pelos seus ideais. Imolou-se. Mártir.
Outro merecedor de idêntica qualificação, Tancredo Neves, talvez tivesse ganhado muito maior dimensão se a morte não o levasse em pleno fastígio. Tragicamente.
Afora estes nomes nenhum mais nos ocorre, nos dias de hoje.
Ao invés de estadistas, tivemos até um presidente da República que, entre outras proezas, negou-se a tomar vacina em plena pandemia de covid-19, dando mau exemplo a milhões de brasileiros.
SUGESTÃO DE LEITURA
“Canguleiro – Ensaio Biográfico sobre Homero Homem”, de Alexis Peixoto, e “Navarro – Um Anjo Feito Sereno”, de Sheyla Azevedo. Ambos os livros fazem parte de uma coleção de biografias de escritores e artistas potiguares. Louvável empreendimento editorial.
O trabalho de Alexis Peixoto preenche todos os requisitos do gênero biográfico. E tem certo caráter jornalístico, que o torna atrativo para o grande público. Ao meu ver é mais bem conseguido que o de Sheyla Azevedo. Este contém algumas falhas, inclusive de revisão, e o seu ordenamento deixa a desejar. No entanto, recomenda-se a leitura tanto quanto o de Alexis, pelas suas inegáveis qualidades, valendo ressaltar as importantes revelações que faz sobre a vida íntima de Newton Navarro.
O QUE VOCÊ ESTÁ LENDO ?
Responde Vicente Serejo, jornalista, escritor, professor universitário aposentado:
– Estou lendo “A Lírica do Consumo – Literatura e Publicidade”, de João Anzanello Carrascoza.