Amanhecemos no aeroporto da pequena cidade. No interior da nave, reinava um silêncio de basílica. Tripulação e passageiros dormiam em estado de completa serenidade sobrenatural.
Sem fazer nenhum barulho, desci do avião rumo à feira. Fui rápido e voltei depressa. Quando cheguei com a cesta cheia de carambolas causei sucesso.
Ao despertar, o dono do jato perdeu a voz diante do arranjo que sua mulher preparara com as carambolas verdes e amarelas. Por volta das 11 horas da manhã voamos para Manaus. Joe Cocker, o astro que um dia comoveu o mundo cantando “With a little help from my friends” cismara de repetir a dose no teatro Amazonas.
A aeronave de porte médio abrigava quinze poltronas e uma onírica pista de danças. Era como nadar sem água, pulando no vazio, corpos e rostos beatificados pela música que invadia pele, sangue e respiração. A gente dançava como se estivesse em um lugar distante, mas que inexplicavelmente era como se estivesse dentro de nós.
O rock é como uma rajada de liberdade e levados pelo seu ritmo sentimos o futuro imensurável, o passado revivido e o presente sombreado por catástrofes morais e encruzilhadas ameaçadoras.
A gente só parava para dar uma bicada na ”caipirinha” de carambola que eu mesmo preparara, claro que devidamente batizada com uma boa pitada do remédio que o Dr. Timothy Leary inventou para curar a humanidade cretina.
Por favor, não me pergunte se esse texto é pura expressão da verdade. Porque te responderia que a imaginação é o maior espetáculo da terra. Se você resistir a ideia de viajar no jato do Joe Cocker, cuidado, a pasmaceira te pega e te prende na caverna do tédio.
Carambolas à parte, sugiro curtir. O avião fica ainda melhor quando o piloto desce de paraquedas. E a gente se percebe ao lado do comandante Joe Cocker que solta seu vozeirão festejando o nada e a glória.