Projeto museológico recebeu recursos federais, mas nunca saiu do papel
Tibau do Sul guarda atrativos para além do turismo capitaneado pela paradisíaca praia da Pipa. É terra de saberes, tradições e artes genuínas pouco catalogadas e muito menos reverenciadas. O etnógrafo e historiador Hélio Galvão é detentor dos mais preciosos registros da gente tibauense. Mas cerca de 20 anos atrás um projeto de museu inspirado na obra do renomado escritor Gabriel Garcia Marques prometia a oferta de um atrativo turístico capaz de contar a história do município. Recursos federais foram destinados à obra, o prédio do Museu foi erguido, mas nunca funcionou e hoje, já na quarta gestão municipal após a construção, serve apenas de depósito à Prefeitura.
O Museu Etnográfico Hélio Galvão poderia abrigar a história quilombola de Sibaúma, dos povos originários indígenas, da ocupação francesa e holandesa na região, o projeto Homem das Dunas, do arqueólogo Paulo Tadeu, que trabalha a pré-história do município. Servir ainda de fomento à economia criativa com artesanatos típicos que contem também, pelo viés artístico, a história da pesca e do desenvolvimento econômico de Tibau do Sul, além de gerar o sentimento de pertencimento à população, identificada com suas raízes ancestrais, contra a globalização e o cosmopolitismo tão latente na própria Praia da Pipa.
Mas esse projeto, elaborado pelo renomado museólogo Hélio Oliveira (responsável por projetos como o Museu de Cultura Popular, em Natal e outros Brasil afora), nunca existiu, embora tenha recebido recursos do Ministério do Turismo, de emenda do mandato do então senador Fernando Bezerra e sido aprovado e sancionado como Lei em 18 de junho de 2019, pelo então prefeito de Tibau do Sul, Antônio Modesto. O museu foi vinculado à Secretaria Municipal de Cultura, Esporte e Lazer e erguido pela empresa CG Construções e Serviços à Rua Tabelião Rivaldo Rodrigues, no Centro da cidade, próximo à Lagoa de Guaraíras. Hoje está sob responsabilidade da Secretaria de Cultura, desmembrada anos depois.
Nosso blog visitou o local. O prédio estava fechado, mas pela porta de vidro se via tralhas, material de construção no interior, além de entulhos ao redor. Segundo moradores da vizinhança, o teto cedeu há poucos meses. Moradora da casa exatamente em frente ao museu, Mônica dos Santos, 37, disse que desde que se mudou para Tibau do Sul, em 2012, nunca houve projeto de museu. “Do ano passado pra cá virou depósito. Antes até tinha uma porta aberta que só servia para menino entrar e fazer baderna. É uma pena porque foi feito para o turismo. O turista passa direto pra Pipa e não vem aqui, não sabe da nossa história”, completa.
O prédio usou o terreno da Escola Municipal Hélio Galvão, logo ao lado. Professores preferiram não se identificar, mas lamentaram a situação. “Usaram um terreno da escola e nada fizeram. O museu seria ótimo não só aos alunos, mas ao turismo e à economia do município”, relatou um deles. A dona de casa Andréia Marques, também moradora do quarteirão, reclamou da inércia municipal em tocar o projeto. “É um desperdício. O turista só quer saber de Pipa e poderia vir pra cá também. Valorizaria nossa cidade e nossa gente”, disse.
A construção do prédio teve início na gestão do então prefeito Valmir José da Costa, nos primeiros anos dos 2000. Passou pela administração de Edmílson Inácio da Silva (Nilsinho). Em seguida, pelo prefeito Valdenício Costa. No mandato seguinte, de Antônio Modesto, a prefeitura recebeu um adicional de R$ 135.257,36 para conclusão da obra. Segundo Modesto informou à reportagem, “a obra estava há 10 anos abandonada e parada” e foi concluída em sua gestão. Indagado sobre o porquê, mesmo concluído, o museu permaneceu fechado, o ex-prefeito afirmou que seria aberto caso fosse reeleito. No entanto, a previsão de conclusão de obra foi datada de maio de 2019, e seu mandato finalizou em dezembro de 2020 sem que o Museu recebesse uma peça de acervo sequer.
O atual prefeito Valdenício Costa voltou ao cargo após vencer o pleito eleitoral contra Antônio Modesto. Já no último ano do mandato e mesmo já tendo passado por quatros anos sem que nada fizesse pelo projeto, em gestão passada, nem o prefeito nem a assessoria da prefeitura responderam ao repórter. A secretária de Cultura, Natália Keller, empossada recentemente, informou ao blog, via whatsapp, que há um projeto em andamento e que estão em “trâmites com instituições federais para em breve inaugurá-lo”. E quando o projeto estiver mais adiantado, voltaria a contatar o blog para mais informações.
De acordo com a lei sancionada, o prefeito estaria obrigado a regulamentar as atividades, normas de funcionamento e segurança, assim como a formação, a manutenção e o registro do acervo, e definir a estrutura organizacional do Museu Hélio Galvão.
Ainda segundo a lei, o equipamento “terá por finalidade a guarda e a difusão de objetos, obras de arte e documentos que contribuam com o conhecimento dos aspectos sociais, artísticos, políticos, econômicos, dentre outros, da história antiga e recente da cidade de Tibau do Sul”. E ainda “atribuições de recolher, inventariar, estudar, expor e divulgar os testemunhos históricos, artísticos e culturais do município; preservar, conservar e restaurar o patrimônio imaterial da cidade de Tibau do Sul; realizar pesquisas, promover cursos e conferências, de modo a formatar um banco de dados em página eletrônica; promover atividades culturais junto ao meio acadêmico e à comunidade escolar do ensino médio e fundamental e da comunidade em geral, proporcionando a interação entre o passadoe o presente locais”.