Dos bons compositores da atual safra da MPB faz show em Natal nesta sexta

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Resultado de suas viagens e experiências nos últimos anos, incluindo convívio com indígenas, quilombolas e ribeirinhos em longas expedições pelo interior do Brasil, geralmente de bicicleta, o novo show de Makely Ka, em Natal, intitulado Triste Entrópico. Será apresentado nesta sexta-feira no Itajubá Memorial – Espaço Cultural, situado na Rua Chile, Ribeira. O acesso é colaborativo, ou seja, conforme a boa vontade de quem vai curtir esse show pensado e montado com todo o cuidado e estudo.

Esse trabalho é resultado das frequentes excursões de Makely por Portugal e Galícia, região ao norte da Espanha, onde reencontrou traços originários da cultura ibérica que absorvemos no Brasil no decorrer de quatro séculos. Triste Entrópico é portanto um trabalho que estabelece um diálogo profícuo com a alteridade, lançando mão e propondo simultaneamente uma visão antropológica do mundo. A proposta é uma imersão no pensamento selvagem que aqui se confrontou com a razão iluminista do europeu e com o código tribal africano.

Mistura que se apresenta de forma criteriosa na arquitetura das canções, num amálgama de tradições populares e experimentações contemporâneas, artesania e invenção numa sobreposição orgânica de camadas de som e sentido. Canções como “Regresso ao Agreste”, “Extintos”, “Cheiro da Peste” e “Triste Entropia” tratam de temas urgentes e atuais de forma incisiva mas com a delicadeza e inteligência características do trabalho desenvolvido pelo artista durante sua carreira.

A partir da ideia de Antropoceno – a teoria que defende a precipitação de uma nova era a partir da intervenção (nociva) do homem no planeta – as canções desse novo trabalho falam de crise, catástrofes, preconceito, intolerância, mas também apontam perspectivas e possibilidades para superar esse momento conturbado que vivemos nesse início de século. Por isso essas canções carregam em si uma disposição aguerrida para a luta, para o protesto, uma vocação para o embate, tratando de temas polêmicos como a construção de hidrelétricas, a expansão das fronteiras agrícolas, a mineração e o consumo desenfreado.

As canções apontam também às injustiças, os desmandos, o genocídio brutal dos povos indígenas, dos esquecidos e apagados da história oficial com suas línguas, seus costumes e suas práticas culturais.

Triste Entrópico, por fim, é um trocadilho que remete diretamente ao clássico livro “Tristes Trópicos” do antropólogo francês Claude Lévy-Strauss, onde relata suas impressões sobre o Brasil, mas também ao princípio físico da entropia, conceito termodinâmico que determina o grau de irreversibilidade de um sistema e seu estado de “desordem”.

É um trabalho em progresso, uma obra aberta que vai incorporando elementos. Assim é um trabalho de apropriação cultural no sentido antropofágico do termo, incorporando elementos das culturas indígenas, africanas e europeia de forma crítica e reflexiva, buscando uma síntese desse caldo de influências que se retroalimentam continuamente.

Dados Biográficos

Makely Ka é hoje um dos mais requisitados compositores de sua geração e pode ser ouvido em dezenas de discos gravados por diversos intérpretes no Brasil e no exterior. Suas composições se destacam sempre por uma verve crítica e ousada.

Lançou os discos “A Outra Cidade” em 2003, ao lado dos parceiros Kristoff Silva e Pablo Castro, e “Danaide” em 2006 com a cantora Maísa Moura. O primeiro trabalho solo veio em 2008 com “Autófago”. Em 2014, lançou o álbum “Cavalo Motor”.

Letrista inspirado e versátil, acumula parcerias com diversos compositores em todo o país. Como intérprete de suas próprias canções destaca-se pela sua voz grave e um pegada peculiar no violão, além da auto-ironia e sarcasmo sempre presentes nas apresentações ao vivo.

Já tocou nos principais palcos do Brasil e excursionou por Portugal, Espanha, Dinamarca, Lituânia, Grécia, Turquia e México.

Um dos principais interlocutores da cena musical em Minas, organizou mostras e festivais, participou de curadorias, produziu discos de outros artistas, fez direção artística de shows, criou trilhas para cinema, dança e teatro, realizou documentários, compôs textos para peças sinfônicas e camerísticas, participou de conselhos estaduais e federais de cultura, fundou cooperativas e fóruns de música, realizou palestras e oficinas e publicou diversos textos sobre política cultural, música, literatura e cinema.

Sérgio Vilar

Sérgio Vilar

Jornalista com alma de boteco ao som de Belchior

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