Professor, escritor, pesquisador e advogado, Carlos Roberto de Miranda Gomes é membro de diversas instituições culturais, dentre elas, a Academia Norte-Rio-grandense de Letras; Academia de Letras Jurídicas e o Instituto Histórico e Geográfico do RN. Autor de Traços e Perfis da OAB-RN; O Velho Imigrante; Testemunhos, além de outros livros, inclusive numerosos trabalhos jurídicos, Carlos Gomes está comemorando 85 anos de vida.
A seguir sintetizamos um pouco de sua carreira, em uma entrevista que ele deu em setembro de 2014, para o livro de nossa autoria, Impressões Digitais – Escritores Potiguares Contemporâneos, V.2.
1. Carlos de Miranda Gomes, conte-nos um pouco da sua infância e juventude. Quais foram as suas primeiras leituras literárias?
Nasci no clamor da 2ª guerra mundial (setembro de 1939), sob as apreensões dos meus pais pela situação em que Natal se encontrava, com ameaças de ser invadida. Mesmo assim, tive uma infância feliz com meus irmãos. Quando papai foi ser Juiz do interior tive a oportunidade de conviver com a paisagem bucólica das regiões onde morei, em particular, Angicos, Penha Canguaretama e Macaíba. Nesta última vivi os melhores momentos da infância. No interior tive contato com a natureza, montando cavalo, freqüentando Circo, assistindo os festejos populares – Pastoril, Boi de Reis, vendo a condução do gado de máscara pelas ruas para ser abatido, freqüentei as festas dos padroeiros (as) de cada lugar, eventualmente vendo filmes onde só tinha uma máquina de projeção que parava para trocar a fita de cada parte, sob os protestos da platéia e comecei a ser alfabetizado com professoras particulares e em grupos. Dali, vim para Natal em 1948 e não mais saí daqui, passando a ter uma vida mais amena, pois terminara a guerra e o desenvolvimento começava a existir na cidade. Estudei no Instituto Batista do Natal, no Barro Vermelho, depois no Ginásio Natal (onde hoje estão as Lojas Americanas) e depois no Atheneu. Fiz o Curso de Direito na velha Faculdade da Ribeira entre 1964 a 1968, quando recebi o diploma e daí em diante empregos, concursos, advocacia. Quanto as primeiras leituras aconteceram em Macaíba, conhecendo alguma coisa dos irmãos Souza – Auta, Henrique e Eloi. Também em Macaíba eu esperava o gazeteiro que vinha de Natal e comprova revistas em quadrinhos, entre as quais a Edição Maravilhosa, que trazia a literatura brasileira (O Moço Loiro, O Seminarista, O rio do quarto, a Pata da Gazela, O Guarani e muitos outros (ainda guardo essas revistas). Nessa época eu recebi o meu primeiro livro – “Anos de Ternura”, de A.J.Cronin e nunca mais parei de ler. Tenho uma boa biblioteca de autores nacionais, internacionais e, com carinho e orgulho, de autores potiguares.
2. E seu contato com a literatura potiguar, como aconteceu?
Como disse antes, comecei conhecendo as poesias de Auta de Souza e algo mais dos seus irmãos. Já em Natal, fui orientado pelo meu inesquecível professor Raimundo Nonato da Silva, conhecido escritor oestano e passei a freqüentar livrarias e adquirir os trabalhos que, precariamente, então eram publicados pela Gráfica Oficial, pela Clima e então não parei mais – Walfran, Zila, Cascudo, Raimundo Nonato, Manoel Onofre Jr., Ney, Sanderson e ….. “se mais mundo houvera, lá chegara….”
3. E o período como estudante do Atheneu? Boas lembranças?
Sim. Foi o contato com a maturidade, as questões políticas e ideológicas e da própria vida neste mundo. Fiz grandes e eternos amigos, num aprendizado fundamental.
4. Você também atuou como cantor quando jovem? Foi no período que você trabalhou no Rádio?
Descobri algum pendor para o canto nas festinhas do Instituto Batista em 1948 e então fui estudar na Escola de Música de Natal, de Waldermar de Almeida. Estudei alguma coisa e iniciei no aprendizado de violino (mas não deu). Fiquei mesmo no canto. Passei a atuar no Programa Domingo Alegre de Genar Wanderley e em 1950 ganhei o Concurso “Campeão Vic-Maltema”. Em seguida fiz uma temporada na PRE-9 Rádio Clube de Fortaleza, onde gravei um disco com a orquestra do Maestro Mozart Brandão. O violonista que fazia parte do conjunto e da orquestra era Evaldo Gouveia. Fiz shows em Mossoró e Caraúbas e fiz muitos programas para a SAE – Sociedade Artística Estudantil, cantando com o Trio Irakitan, com quem gravei uma música em 1949; também faziam parte da ‘trupe’ Hianto e Haroldo de Almeida e vários outros. Fui então contratado para a Rádio Poti de Natal onde fiz muitos programas de estúdio e auditório. Um deles eu cantava com Selma e Agnaldo Rayol. Em 1954 o meu pai insistiu que eu me dedicasse aos estudos e então eu resolvi abandonar o rádio. Cheguei a trabalhar em pontas de Teatro e fui do Clube dos 7, de Clarice Palma.
5. Você tornou-se Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela tradicional Faculdade de Direito da Ribeira/UFRN, turma de 1968. Algum motivo especial para a escolha do curso?
Meu pai era Juiz e costumava me chamar para mostrar alguns processos interessantes e pedia a minha opinião e após o meu comentário ele dizia que eu tinha inclinação para o Direito e aí eu fui nessa e deu certo, graças a Deus.
6. Você conheceu Câmara Cascudo? E Newton Navarro?
Fui algumas vezes à casa de Cascudo com papai e freqüentei festas e assisti palestras na Faculdade e no Clube dos 7 e em outras ocasiões. Newton eu conheci na vida boêmia, pois cantava nas festas e ele sempre estava lá poetando.
7. Relate-nos um pouco da sua brilhante carreira jurídica?
O “brilhante” fica por sua conta. Comecei minha labuta como comerciário do SENAL; depois funcionário do Tribunal de Justiça. Pedi demissão e fui estudar em Recife (Escola Politécnica), pois terminei o científico quando servia o Exército e não tive tempo de freqüentar regularmente as aulas e então fui fazer um curso intensivo e recuperei os meus conhecimentos. No retorno tornei-me comerciante de 1960 e 1961, sócio da firma Gomes & Cia.; quando deixei para ser funcionário do TRE/RN, Chefe da 3ª Zona Eleitoral de 1962 até 1971. Provisionado da OAB/RN em 1965, Solicitador acadêmico de 1966 a 1968 e Advogado a partir de 1969. Nomeado Promotor de Justiça Substituto, após aprovação em concurso, declinei de sua aceitação, preferindo o cargo de Auditor do TCE/RN, aprovado em 1º lugar, onde tive a oportunidade de várias vezes ser convocado como Conselheiro Substituto, depois passando a integrar a Procuradoria do mesmo Tribunal, que se transformou no Ministério Público Especial, de onde requeri aposentadoria. Docente do Curso de Direito desde 1976 da UFRN, da UNIPEC, hoje UnP, FARN(Uni-RN) e da especialização da UFRN, UnP, FAL, ESMARN e FESMP, colaborador na FACEX e ESA. Ex-Conselheiro do Conselho de Recursos Fiscais do Estado do Rio Grande do Norte. Ex-Conselheiro-substituto do Conselho de Contribuintes do Município de Natal. Ex-Chefe do DPU da UFRN. Primeiro Coordenador do Curso de Direito da UNIPEC, hoje UnP. Patrono do Instituto de Estudos Jurídicos do Rio Grande do Norte – IEJ. Ex-Presidente da OAB/RN. Ex-Juiz do TRE/RN. Ex-Adesguiano – III Ciclo de Estudos. Primeiro Controlador Geral, da Controladoria Geral do Estado do Rio Grande do Norte, e Estado. Presidente da Comissão de Juristas da UFRN. Fundador e o primeiro Presidente do Nejur – Núcleo de Estudos Jurídicos e do Instituto Brasileiro de Tecnologia Jurídica-IBTJ. Integrei a composição do Primeiro Tribunal de Ética da OAB/RN. Ex-Diretor da Diretoria da Administração Indireta-DAI (TCE/RN). Primeiro Diretor-Geral da Escola de Contas “Prof. Severino Lopes de Oliveira” do TCE/RN até 2004. Professor aposentado da UFRN, na cátedra de Direito Financeiro e Tributário. Professor credenciado para cursos de pós-graduação e/ou orientação de monografias e participação em bancas em diversas Faculdades e Escolas Jurídicas.
8. Que outro tipo de arte lhe desperta atenção além da literatura?
Sempre tive habilidades para a pintura e tenho alguns quadros (simples amador). Sou amante da música e das artes plásticas em geral.
9. O que você acha do incentivo à cultura-literatura no RN?
Ainda de pouca intensidade face à burocracia. É preciso melhorar esse campo, pois quem não tiver dinheiro ou patrocínio fica no sacrifício. Aqui a cultura ainda é considerada secundária.
10. Em sua opinião o que falta para o escritor potiguar romper com os muros provincianos?
Primeiro é acabar com a “igrejinha” de grupos; segundo investir com afinco na UBE que está fazendo excelente trabalho, sem discriminações; lutar por uma política séria de Cultura e um Programa de publicações selecionadas por comissão idônea; criar uma linha de financiamento para os jovens escritores e os antigos também, por exemplo, estipular mais prêmios literários.
11, Você atualmente é Membro Honorário Vitalício da OAB/RN, sócio efetivo do IHGRN e membro da Academia de Letras Jurídicas do Rio Grande do Norte, cadeira 14, além de outras instituições, qual a importância desses órgãos para a cultura potiguar?
Com muita honra ocupo a Cadeira nº 2 da Academia Macaibense de Letras (Patrono Alberto Maranhão), sou do Instituto Norte-Rio-grandense de Genealogia (fundador) e da UBE/RN. Para o intelectual o seu reconhecimento se concretiza nas suas publicações e nas participações em órgãos culturais como os citados. Esse é o principal alimento e incentivo para a sua continuidade, haja vista a falta de apoio oficial regular. Precisamos revigorar a atividade cultural do nosso Estado e louvo a atitude de Diógenes quando criou a FINSC – Federação das Instituições Culturais do Rio Grande do Norte, ainda em fase de registro e que pretende fortalecer as entidades interioranas sem recursos para a sobrevivência. Esses órgãos são os verdadeiros “guardiães” da cultura.
12. Quem é o escritor Carlos Gomes?
Uma pessoa inteiramente tranquila, sem inveja e pronto para colaborar com todos os que queiram trabalhar pela cultura, pelo próximo e, sobretudo, pela qualidade de vida da coletividade. Sou combatente no meu Blog e no do IHGRN contra as mazelas sociais, culturais e políticas e nunca nego ajuda aos que me procuram e merecem ser ajudados.