Das belezas, tradições e desigualdades do México

Teotihuacan

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Minha primeira impressão da Cidade do México nada tem a ver com a aparência urbana, mas, sim com a das pessoas que aqui vivem. É que estas, logo percebo pelos seus traços fisionômicos, descendem de índios, em grande maioria – com certeza, aqueles bravos índios que Hernán Cortés não conseguiu dizimar, totalmente, quando veio a essas terras, novembro de 1519, a mando de Sua Majestade Carlos V, de Espanha, para conquistá-las e integrá-las aos domínios do seu rei. É por isto, talvez, que não há, em toda a Cidade do México, nem um monumento a Cortés, mas Cuauhtémoc, o último imperador asteca, ali está, em bronze, magnífico, no meio do Paseo de la Reforma, principal avenida, por onde eu agora vou caminhando, enquanto imagino estas anotações.

Teotihuacan

Excursão a Teotihuacan, a cidade sagrada dos toltecas, milagrosamente preservada, a cerca de 50 kms da Cidade do México. No caminho, o guia, falante que só, vai entremeando anedotas picantes às informações de praxe. Com cara de Pedro Armendariz (quem se lembra do astro de tantos melodramas?), só lhe falta um sombrero, para compor a imagem do mexicano típico.

Extrovertido, bem-humorado, soltando, de vez em quando, gargalhadas estrondosas, trata-nos como velhos amigos. As respeitáveis senhoras integrantes da excursão, duas venezuelanas e uma chilena, riem, batem palmas, encantadas com as piadas do guia.

Quando avistamos as pirâmides de Teotihuacan, somos levados a uma loja de artesanato, a certa distância, onde demoramos quase uma hora. Eu, impaciente, ansioso para conhecer aqueles legendários monumentos, e elas, as alegres senhoras, maravilhadas com toda sorte de bugigangas, na maior parte, produtos industrializados que passam por artesanato. Haja saco! Infelizmente, por comodidade, a gente não tem outra alternativa senão embarcar na canoa furada dessas excursões turísticas.

Mais tarde, eu teria de me conter diante de outras manifestações de cretinice, quando quase todos da excursão posaram para fotografias ao lado de “guerreiros astecas”, vestidos a caráter, envergando vistosos trajes em plástico e acrílico. Lá como cá, todo mundo quer ganhar dinheiro com a exploração do turista prototípico, esse bobalhão.

Sobre os templos e pirâmides de Teotihuacan, nada ouso dizer. Pois, quem sou eu para expressar a grandiosidade, o mistério, a beleza daquilo tudo? Não tenho palavras. Perdoe, leitor. Leia Érico Veríssimo, que este, sim, é escritor de verdade, conhece os segredos da palavra. No livro “México”, veja o que ele diz. (12ª. edição, pág. 235).

 Desigualdades

Tal como São Paulo, Rio e outras grandes cidades brasileiras, México é uma metrópole de contrastes. Vá lá o chavão. Bairros pobres e bairros elegantes, como Polanco e Las Lomas. (Neste último vi as mansões em que viveram Cantinflas, Maria Félix e Dolores Del Rio). Reluzentes torres de vidro fumê, shopping-centers, barracas; mal comparando com Natal: o Alto da Candelária & o centro do Alecrim.

Nos arredores da suntuosa basílica de Guadalupe, a profusão de camelôs dá ao local aquela característica de terceiro mundo. A desigualdade social não é tanta como no Brasil, mas bastante para gerar males tão nossos conhecidos, como a violência urbana, que deve ser grande, a julgar pelas recomendações que o pessoal da agência de turismo nos faz – “Tenha cuidado, não ande com dinheiro no bolso, deixe o passaporte no cofre do hotel, não tome táxis verdes”, etc. Tais recomendações, por um lado, são boas, pois nos deixam precavido, mas, de tão insistentes, levam-nos à beira da paranoia.

Pimenta no dos outros

Creio que se pode conhecer um tanto do caráter desse povo pela quantidade de pimenta que consome. Todas as comidas típicas tão picantes quanto as anedotas do guia da excursão a Teotihuacan. Não há gastrite que aguente. Quando consigo chegar, heroicamente, à última colherada de um caldo templado, quase grito: – Fuego! Mas, fora de brincadeira, além de apimentados, os principais pratos da cozinha mexicana, em boa parte, são feitos à base de massa de milho. A famosa tortilla, por exemplo, espécie de panqueca, a qual está para o México assim como o espaguete para a Itália. Nessa preferência alimentar, os mexicanos parecem manter-se fiéis aos antepassados astecas, grandes apreciadores do maiz (milho), o “pão” deles. Mas, aqui pra nós, bem que é enjoativo esse gosto de milho. Nada bom para um sertanejo que nem eu, acostumado a outros modos de preparo desse cereal. Questão de gosto não se discute…

Metáforas mexicanas

Metáfora sugestiva: a Cidade do México nasceu sobre as ruínas de Tenochtitlán, a capital asteca. Na Plaza de la Constitución, apelidada Zócalo, teimam em viver os restos do Templo Maior, um pedaço de Tenochtitlán surgido das entranhas da terra.

Outra metáfora no mesmo sentido: diante da Catedral, um cruzeiro eleva-se sobre serpente de pedra que representa o deus Quetzalcoatl. Maior templo católico das Américas, e um dos mais belos, a Catedral foi construída em terreno primitivamente pantanoso, daí porque está afundando, pouco a pouco. Bem ao lado da Catedral, o Palácio Nacional, sede da Presidência da República, decorado com os famosos murais de Rivera, uma síntese da História mexicana, desde a época pré-hispânica até o ano de 1929.

Museu Nacional de Antropologia

O México tem muitos e bons museus, mas nenhum se compara ao Museu Nacional de Antropologia. Não se pode deixar de visitá-lo. Ponto alto, a sala dedicada à Cultura asteca ou mexícana. Aí, dezenas de esculturas e talhas, algumas monumentais, atestam a grandeza da arte pré-hispânica. É um espanto a contemporaneidade dessa arte. Não poucas peças, aliás, poderiam ser consideradas obras de vanguarda.

Manoel Onofre Jr.

Manoel Onofre Jr.

Desembargador aposentado, pesquisador e escritor. Autor de “Chão dos Simples”, “Ficcionistas Potiguares”, “Contistas Potiguares” e outros livros. Ocupa a cadeira nº 5 da Academia Norte-rio-grandense de Letras.

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