Caíram as máscaras

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Desde que teve início a pandemia da Covid 19, muitos poderiam ser os símbolos destes tempos, mas certamente não há nada que represente mais toda a histeria justificada que vivemos do que as máscaras.

Nós, que sempre fomos sorridentes e falastrões, vimos nossos sorrisos serem escondidos por esses pequenos tapumes de rosto que nos prometiam salvar a vida. E, de fato, salvaram muitas.

Também assistimos ao terrível espetáculo negacionista que encontrou nelas, nas máscaras, e em medicamentos inúteis como a cloroquina, um bastião para tentar minimizar o que não poderia ser minimizado.

Perdemos as contas das vezes em que testemunhamos pessoas se negando a usar máscaras e pondo a vida de outros em risco por birra, pela picuinha direitista excessiva que fazia pouco da morte de tanta gente.

Os cartazes afixados nas portas de lojas e escritórios exigindo o uso de máscaras nos deram a noção de quanto essa imagem simboliza estes tempos. A máscara cirúrgica descartável é um ícone da Covid 19 assim como a máscara com bico de pássaro é da Peste Negra.

E no meio de tanta discórdia, de tantas idas e vindas, avanços e retrocessos, polêmicas, medo e desrespeito, o dia 6 de abril foi o escolhido pelo governo do Rio Grande do Norte como a data para “flexibilização” do uso das famigeradas máscaras.

Devo antes dizer que não gosto nem um pouco da palavra “flexibilização”, afinal ela tem sido usada essencialmente como um termo negativo que aponta para perdas, desrespeitos e acintes em todos os campos nos quais tem sido usada. Basta ver o que foi a flexibilização proposta pela reforma trabalhista, que foiceou direitos e empurrou contra a parede os trabalhadores brasileiros sob a desculpa ridícula de que ela permitiria gerar mais empregos. Ao fim, tudo o que aconteceu foi que novos empregos não foram gerados e classes operárias foram trituradas na lâmina fina.

Mas, voltando às máscaras, embora o decreto governamental não acabe definitivamente com os usos obrigatórios, essa flexibilização já aponta para o que vemos nas ruas todos os dias: pessoas andando sem máscaras, esquecendo-as nos carros, em casa, entrando em estabelecimentos que exigem o uso no discurso, mas o dispensam na prática.

A verdade é que as máscaras continuam sendo um ícone da Covid 19, embora muitas pessoas não se sintam mais obrigadas a usá-las.

Outra verdade é que só pudemos chegar a este momento devido ao sucesso da vacinação contra o vírus. Sucesso, é importante que se diga, a despeito de tudo o que tentou o governo federal, que passa do cretinismo no processo de aquisição dos imunizantes até as campanhas deliberadas para o descrédito das vacinas.

Parece-me claro que, mesmo com decretos que desobriguem o uso, ainda veremos pessoas de máscaras pelas ruas. Certamente haverá quem não se sinta seguro em tirá-las agora e até quem se sinta nu sem elas.

Confio no governo estadual, nos cientistas e médicos que apoiam a decisão de suspender a obrigatoriedade, embora compreenda quem prefira manter o hábito adquirido nestes últimos dois anos de muito sofrimento.

A máscara enquanto ícone permanecerá e a encontraremos como representação deste episódio assustador de nossa história em todos os lugares. O que lamento é que não será mais tão fácil identificar pela máscara no queixo a postura e o posicionamento de quem esteve sempre do lado errado do ícone que agora abandonamos de vez.


CRÉDITO DA FOTO: Fabiana Reinholz

Theo Alves

Theo Alves

Theo G. Alves nasceu em dezembro de 1980, em Natal, mas cresceu em Currais Novos e é radicado em Santa Cruz, cidades do interior potiguar. Escritor e fotógrafo, publicou os livros artesanais Loa de Pedra (poesia) e A Casa Miúda (contos), além de ter participado das coletâneas Tamborete (poesia) e Triacanto: Trilogia da Dor e Outras Mazelas. Em 2009 lançou seu Pequeno Manual Prático de Coisas Inúteis (poesia e contos); em 2015, A Máquina de Avessar os Dias (poesia), ambos pela Editora Flor do Sal. Em 2018, através da Editora Moinhos, publicou Doce Azedo Amaro (poesia).

Como fotógrafo, dedica-se em especial à fotografia documental e de rua, tendo participado de exposições que discutiam relações de trabalho e a vida em comunidades das regiões Trairi e Seridó. Também ministra aulas de fotografia digital com aparelhos celulares em projetos de extensão do IFRN, onde é servidor.

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