Na foto acima, Ayrton Alves, poeta, em estado de contínua travessia para o outro. E basta!
————
bataille
o tempo passa
e eu me masturbo além do mar
————
,o que você sussurra ao meu ouvido
eu guardo dentro de conchas
de guelras nascidas no pescoço
teu nome é uma cidade submersa
e eu sou uma praia de vertigens
a estocar a dor de um continente se desfazendo
ana acredita que as dúvidas são anzóis
eu creio que são âncoras
anêmonas me vestindo de fogo
Queimado, me encanto
acredito em atlântidas
em pasárgadas em ítacas
eu sou uma ilha que te aprisiona
a partir do fundo de uma xícara
de um poeta em lisboa
mexendo o café como se abrisse
algum oceano no vidro da minha janela
como se esperasse minha travessia
sobre meus pés gastos
mas agora eu só quero ficar aqui
deitado com você ondeando meus ouvidos
nessa madrugada típica
em que trens carregados de pedras
partem do meu peito
e eu me enforco com meu nome
————
pássaros a desvoar a noite
é o que somos
especialistas em construir
um vulcão orvalhado
ao redor da nossa caixa toráxica
tudo isso como uma nova roupagem
para a metralhadora em estado de graça
que sublima nosso estado de sítio
sim é por você é por nós é por mim
sobretudo por mim
que rastejo entre os escombros
com a última palavra bem presa
aos dentes
e talvez quando tudo acabar
possam com ela
reconstruir uma ponte
ou os meus ossos
sim é por você é por nós
é por mim
sobretudo por mim
que recebo os cortes da pressa
com notas de masoquismo
nasci para passar adiante
o último segundo da bomba
————
, D. eu acho sexy seu olhar de lâmina
sobre minha pele aninhada
e é nesse momento que eclodo do teu cabelo
como um pássaro a se remendar em pleno voo
D. tua língua sempre congestionada me comove
me faz pensar que minhas
palavras não precisam de muletas
para andar sobre seus dentes
D. se escrevo
é porque tenho a boca a lhe dissolver
e você mais do que ninguém sabe disso
D. não há fiança para nossos corpos
possuidores da selvageria
de todos os homens que já amaram
e revivem e se alimentam
à sombra do nosso caos
D. seus beijos me inflam
suas mãos me explodem
roubo o ventre da poeta
para a vibrar virarmos víboras
mucósmicas antiantídicas
atadas ao que nos move
D. seu cuspe me delira
(…)
————
, amo demais o meu inferno
para querer que o visitem
quando você está comigo
sempre diz que é dia
e o sol de metal nas nossas costas
queima como gelo
mas é sempre noite, amigo
é sempre à noite que os mistérios
usam escudos
goze com as curiosidades que não se desfizeram
não quero que o meu vir a ser
se crave nas suas mãos e nos seus pés
e se construa lhe envolvendo
numa estrutura tão exposta
me perdoe
se a crosta que o cobre
se rompe com a minha respiração
se me imponho como um colar de bocas mudas
me perdoe por não poder me refazer em dúbios
e me perdoe mais ainda
por fazer com que tudo
aumente a musculatura desse incêndio
————
duas pedras caindo num poço
(o nosso amor tem o som do irreversível)
FOTO: Tayse Casado
1 Comment
Ayrton Alves não te conheço. Mas gostei muito do teu poema. E assim te conheço como poeta que canta a liberdade de imagens idéias ritmos sonhos sentires. Parabéns pelo seu Bataille!!!
Ruben G Nunes
traficante de sonhos