Por Clowns de Shakespeare
No momento em que o incêndio de um museu há anos abandonado volta a colocar a cultura no centro da pauta do debate no país (assim como aconteceu há dois anos, quando da extinção do Ministério da Cultura), vimos a público propor uma reflexão sobre o desmonte que a arte vem sofrendo nacionalmente, convocando uma reunião pública no próximo dia 02 de outubro de 2018, às 19h, no Barracão Clowns, tendo como tema a situação do Festival O Mundo Inteiro é um Palco, que este ano não será realizado, após cinco edições consecutivas.
O Festival O Mundo Inteiro é um Palco surgiu em 2013, como forma de comemoração dos 20 anos dos Clowns de Shakespeare. Realizado nessa edição com recursos próprios (cerca de R$ 20.000,00), com apoio de permuta com hotéis, restaurantes e instituições e, principalmente, a colaboração de grupos e artistas parceiros que se dispuseram a vir a Natal comemorar este marco oferecendo suas apresentações como presente de aniversário aos Clowns, o festival gerou uma movimentação na vida teatral natalense. Assim, o que foi criado para ser uma única edição comemorativa, acabou tornando-se um evento continuado no calendário cultural da cidade, diante do desejo do público, dos artistas e do próprio grupo.
O MUNDO INTEIRO FOI PALCO POR CINCO EDIÇÕES
Desde então, realizamos cinco edições do festival, cada uma viabilizada a partir de características muito particulares, driblando as dificuldades e limitações encontradas: em 2014, mantendo o apoio dos parceiros locais, acrescido do aporte de R$ 80.000,00 do edital Oi Futuro, o festival ganhou fôlego e pôde trazer de volta a Natal aqueles artistas que vieram um ano antes em generosa parceria, desta vez oferecendo um pequeno cachê, além de novos grupos.
No ano seguinte, 2015, foi a vez do edital de apoio a festivais da Caixa Cultural viabilizar a terceira edição d’O Mundo Inteiro é um Palco com o valor de R$ 100.000,00 além de, como sempre, o suporte dos apoiadores locais. Apesar de um valor tão baixo para a realização de um festival, foi a edição que conseguimos trabalhar com as condições mais próximas do ideal, podendo pensar em uma curadoria minimamente afastada das condições financeiras, e até mesmo com uma sobra que gerou um pró-labore simbólico para a equipe de produção, situação inédita até então.
Em 2016 vem o golpe e o desmonte da cultura começa a ser colocado em prática, obviamente também atingindo o festival. Diante da impossibilidade total de se conseguir qualquer apoio financeiro, convocamos a ajuda de toda a classe teatral potiguar e propusemos que O Mundo Inteiro é um Palco passasse a ser um festival de todos os artistas. Apesar da gravidade da situação, fizemos uma edição de resistência, levantando R$ 16.585,00 via campanha de financiamento coletivo, além de um apoio de R$ 10.000,00 da empresa local Potigás, conseguido pouco tempo antes do início do festival.
É importante realçar que as empresas e instituições de todas as outras edições, como o Hotel O Tempo e o Vento, restaurantes Poti, Grãos, Mozzarella Pizzas, O Caranguejo, Fratelli Pizzaria, Churrascaria do Arnaldo, Mormaço, A Cozinharia, Pizza da Vila, Domino’s, Camarões, o supermercado RedeMais Veneza, e os parceiros SOS Segurança, Praieira Filmes, Éstudio P, RRC Advogados, Hospeed Internet, SESC, IFRN, Offset Gráfica, Universitária FM, Tribuna do Norte e LocarX, dentre outros, diante da situação tão crítica, entraram com apoios ainda mais robustos do que nas edições anteriores, como prova de apoio e parceria estabelecida.
Apesar das condições limítrofes, graças ao empenho de uma grande equipe de mais de 100 pessoas realizamos a maior edição do festival, que aconteceu em diversos espaços da cidade, rendendo, inclusive, uma sobra de dinheiro, uma vez que nenhum dos grupos que se apresentou recebeu cachê.
No ano seguinte (2017) alguns dos parceiros da edição anterior seguiram junto ao festival, mas a maioria não pôde seguir na colaboração diária ao longo do ano, devido a necessidade de tocar seus próprios projetos e atividades profissionais. Com o resíduo de 2016 e um apoio financeiro do Banco do Nordeste de R$ 25.000,00 (além, claro, dos apoiadores que seguiram fiéis ao projeto), o festival foi feito em parceria com a ABRACE – Associação Brasileira de Pesquisa e Pós-graduação em Artes Cênicas, que realizou o seu encontro científico daquele ano em Natal. Com isso, conseguimos trazer o grupo equatoriano Malayerba, um dos principais nomes do teatro Latino-americano, sendo assim a primeira atração internacional do festival.
E assim O Mundo Inteiro é um Palco se consolidou, através das cinco edições continuadas, como o principal festival de teatro da cidade de Natal, trazendo a cidade nomes como o Grupo Galpão/MG, Magiluth/PE, Ói Nóis Aqui Traveiz/RS, Bagaceira/CE, Maria Cutia/MG, Helder Vasconcelos e Boi Marinho/PE, LUME/SP, Alfenim/PB, Caixa de Elefante/RS, Janaína Leite e Alexandre dal Farra/SP, Danilo Grangheia e Dagoberto Feliz/SP, Júlio Adrião/RJ, Ser Tão Teatro/PB, dentre tantos outros, num total de 76 espetáculos, além de cenas curtas e outras atividades de 81 grupos ou artistas de todo o país.
CONVOCATÓRIA
Da mesma forma que acontece na manutenção dos grupos de teatro no país, a convivência com a precariedade sempre foi tônica do festival. E, também como os grupos costumam trabalhar, a chave da criatividade e do “fazer milagre com pouco” garantiram que o festival tenha acontecido durante essa meia década, tornando-se um momento tão especial do teatro da cidade a cada ano.
No entanto, após essas cinco edições realizadas de maneira tão precária, em que a consolidação do festival não foi acompanhada por uma consolidação financeira – seja por dificuldades conjunturais, seja por limitações da própria equipe em encontrar modos de fazê-lo –, entendemos que é o momento de interromper essa bela trajetória e convocar todos os setores da sociedade que têm interesse e envolvimento, direta ou indiretamente, com o festival – público em geral, artistas, intelectuais, empresários, gestores públicos, etc. –, para uma grande ágora sobre a situação d’O Mundo Inteiro é um Palco e seu cancelamento diante dessas condições.
Em tempos de exceção que vivemos, e da iminência de vermos emergir uma situação ainda mais tenebrosa, entendemos que é o momento de estarmos juntos, atentos e fortes. Reafirmamos assim convite para a realização de uma reunião pública no próximo dia 02 de outubro de 2018, às 19h, no Barracão Clowns para discutirmos conjuntamente a situação do O Mundo Inteiro É um Palco.