Rondônia: uma gente em busca de sua identidade

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Se a primeira impressão é a que fica, certamente não vou morrer de amores pela capital de Rondônia. Ainda há pouco, dei um giro no centro da cidade e nada encontrei que me despertasse interesse. Surpreendido pela chuva, demorei-me sob uma marquise a remoer minha decepção.

É claro que eu não alimentava grande expectativa, mas nunca pensei que essa cidade fosse tão sem graça.

Que me perdoem os porto-velhenses. Com certeza, eles têm motivos para amar sua terra. Talvez até vejam beleza nela. “Quem ama o feio, bonito lhe parece” – diz a sabedoria popular. Mas devo convir que estou sendo um tanto ranzinza. Afinal, beleza é fundamental – concordo, Vinícius de Morais –, mas não é tudo.

UM PARALELO INEVITÁVEL

Comparo Porto Velho com Rio Branco, onde estive no mês passado. A comparação tem razão de ser. Trata-se de cidades de porte médio, situadas na Amazônia, e capitais de Estados vizinhos, antigos territórios federais.

Do ponto de vista cultural e turístico, Rio Branco leva a melhor, sem dúvida alguma. Cabe a Porto Velho a supremacia econômico-financeira, a qual evidencia-se no seu comércio, por exemplo, bem mais movimentado e com melhores opções de consumo.

Falta dizer que ambas as cidades são banhadas por um rio, que em Rio Branco é o rio Acre, e em Porto Velho, o Madeira.

O rio Acre, não tão grande e belo quanto o Madeira, exibe-se em plena Rio Branco, mas o Madeira se esconde de Porto Velho, embora passe a pequena distância do centro da cidade.

MEMÓRIA DA MADEIRA-MAMORÉ

O Museu Ferroviário, abrangendo a estação da célebre Estrada de Ferro Madeira-Mamoré, se bem explorado, poderia tornar-se o carro-chefe do turismo regional. Lamentavelmente, é a própria imagem do abandono. Grandes placas oficiais indicam obras de restauro, que se arrastam há bastante tempo. Junto ao museu, na margem do rio Madeira, sob árvores frondosas, uma espécie de plataforma de madeira abriga numerosos bares e restaurantes populares improvisados. Vale a visita para se curtir a vista do rio.

UMA QUESTÃO DE IDENTIDADE

Com grande potencial econômico, dada a exuberância de suas riquezas naturais, Rondônia atraiu e ainda atrai gente dos mais variados recantos do país “em busca do ouro” (ouro em sentido figurado, é óbvio). Até há algumas décadas, Porto Velho era uma cidade do far-west, como atesta o escritor Inácio Magalhães, que então a visitou. Hoje, ainda se percebe um tanto desse aspecto de terra bruta em transformação. A população, como não podia deixar de ser, é extremamente heterogênea. Forasteiros, na maioria. Talvez por esta razão, falta autoestima, e daí, em boa parte, a atitude descuidada com relação ao que é da terra.

SUGESTÃO DE LEITURA

“Bom dia para os defuntos”, do peruano Manuel Scorza.

Este romance vale como enérgica denúncia contra os industriais da miséria e os poderosos prostituídos, flagelos do terceiro mundo. Comove. Incomoda.

Do ponto de vista da forma, algo novo revela-se tanto na arquitetura romanesca quanto na, digamos, decoração.

Da primeira à última página, viaja uma ironia tranquila. Nenhum tom inflamado de panfleto.

Os personagens não têm grande vigor psicológico. Não ficam vivendo em nossa memória depois da leitura. Servem para encarnar símbolos. Num romance social, como este, não é necessário mais que isto. A vida, a personalidade e o caráter não estão na análise de algumas figuras, mas na síntese da alma de um povo humilhado e ofendido.

O QUE VOCÊ ESTÁ LENDO?

Responde Joventina Simões Oliveira, advogada, escritora, atual presidente do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte.

– Releio “Agora lábios meus, dizei e anunciai”, de Inácio Magalhães de Sena.

 

Manoel Onofre Jr.

Manoel Onofre Jr.

Desembargador aposentado, pesquisador e escritor. Autor de “Chão dos Simples”, “Ficcionistas Potiguares”, “Contistas Potiguares” e outros livros. Ocupa a cadeira nº 5 da Academia Norte-rio-grandense de Letras.

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