De quando a medicina se confunde com a literatura

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Há muitos pontos de confluência entre medicina e literatura, a exemplo de grandes obras que se dedicam a determinados temas médicos. Sob este enfoque, nunca é demais relembrar O Alienista, de Machado de Assis, A Montanha Mágica, de Thomas Mann, A Peste, de Albert Camus, além de muitos e muitos outros.

Voltado à Poliomielite, é oportuno citar o livro Nêmesis (2010), de Philip Roth (1933-2018), um dos mais premiados e reconhecidos escritores norte-americanos e um expoente da literatura contemporânea mundial. Indicado muitos anos para o Nobel de Literatura, seu nome terminou como mais um equívoco do Comitê Sueco.

Nêmesis compõe um quarteto de romances curtos, que convergem para desfechos trágicos. Em entrevista à repórter brasileira Lúcia Guimarães, na sua casa de campo em Connecticut, Roth fez um resumo dos seus romances curtos: “Homem Comum, em que a nêmese é a doença e a morte. Indignação, a Nêmese é a própria indignação e a guerra. No terceiro, A Humilhação, é a circunstância fora do controle que atingiu o protagonista. No romance final, Nêmesis, é a epidemia de Pólio de 1944, que atingiu grandes áreas dos Estados Unidos”.

Philip Roth nasceu em 19 de março de 1933, em Newark, Nova Jersey, e faleceu em 22 de maio de 2018, na cidade de Nova York. Na primeira metade do século XX, Newark era uma próspera cidade com cerca de 420 mil habitantes, entre os quais havia descendentes de alemães, italianos e eslavos. O pai de Philip Roth descende de imigrantes judeus ucranianos, e a mãe, de imigrantes judeus da Polônia.

A família de Roth morava em um bairro de classe média, Weequahic, cuja maioria da população era formada de judeus. Após cursar o primário e o secundário em sua terra natal, passou a estudar Direito e, em seguida, Literatura Inglesa, sua principal opção, na qual, a partir de 1955, já começou a se destacar na escrita e no ensino acadêmico, nos Estados Unidos e na Europa.

Foi professor de Literatura Comparada nas Universidades da Pensilvânia, de Iowa e Princeton. Publicou 31 obras, a maioria romances. O primeiro, “Adeus, Columbus”, em 1959, e, dez anos depois, a obra O Complexo de Portnoy, o livro de ficção mais vendido nos Estados Unidos, fenômeno cultural difícil de ocorrer. Nessa fase da vida, Roth foi hóspede na Yaddo – espaço que hospeda e apoia escritores e artistas –, por vários meses, onde ficou meio recluso, e teve de suportar notícias falsas de que estava internado em um hospício. Também amargou críticas injustas de que era misógino e antissemita.

São assuntos recorrentes, nos textos de Philip Roth, a identidade dos judeus dos E. Unidos, as circunstâncias do sexo, os vínculos com sua origem e as cidades onde nasceu ou estudou, além de um traço constante de tragédia.  Seus personagens têm sempre boa formação cultural, e até se aventa a possível condição de “alter ego”, pois muitas figuras humanas dos seus romances se confundem com o próprio autor.

Nêmesis é a obra com a qual encerrou sua escrita de ficção. Na página 171 desse livro, que se reporta à década de 1940, encontrei essa referência que pode se adequar aos tempos atuais, no tocante às ameaças aos seres humanos: a guerra, as armas nucleares e a poliomielite.


CRÉDITO DA FOTO: Joe Tabbacca/AP

Daladier Pessoa Cunha Lima

Daladier Pessoa Cunha Lima

Primeiro reitor eleito da UFRN. Exerceu o cargo de 1987 a 1991. Graduado em Medicina pela UFRN (1965), tem especialização em Medicina do Trabalho e Administração Universitária, com vivência em instituições universitárias no exterior. Ao se aposentar, abdicou da Medicina e optou pela Educação, tendo se dedicado à instalação da FARN, atual UNI-RN, no ano de 1999. É, ainda, membro da Academia de Medicina do RN e do Instituto Histórico e Geográfico do RN. É autor dos livros Noilde Ramalho – uma história de amor à educação e Retratos da Vida, além de outras publicações. E em abril/2017 foi eleito para a cadeira nº 3, da Academia Norte-rio-grandense de Letras.

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1 Comment

  • Lemos o Nêmesis de Phillp Roth há alguns meses no meu Clube de Leitura. Ficamos muito impressionados com a força do romance a a construção da narrativa, e também pudemos ver vários paralelos entre a epidemia de pólio relatada no livro e a de Covid, que todos estávamos vivendo. A pólio no Brasil ainda não havia atingido o nível de hoje.
    O Clube de Leitura Clotilde Tavares se reune mensalmente desde março de 2018. No próximo mês de março completará 5 anos de atividades, já tendo sido realizadas quase 60 reuniões e lidos outros tantos livros. A adesão é livre. Reuniámos presencialmente, mas depois que começou a pandemia passamos para um formato virtual e agora começamos a experimentar um formato híbrido. Tem um plantel de cerca de 20 participantes ativos, Para saber com participar, faça contato no WhatsApp 84 8723 1518.

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