Desde meu tempo de menino, em Nova Cruz, sempre gostei de futebol. Lá, joguei muitas peladas, apesar das feridas nos dedos dos pés gerados por frequentes topadas. Assisti a muitos jogos no campo da cidade, principalmente os confrontos entre o São Sebastião e o União, os melhores times locais. No âmbito nacional, torcia pelo Vasco da Gama, e ouvia os seus jogos no rádio plugado em uma bateria de carro.
Em 1958, já residindo em Natal, acompanhei alguns jogos da Copa do Mundo também pelo rádio, mas plugado na tomada da luz. Foi quando conheci Pelé, na voz vibrante do locutor a exaltar os feitos brilhantes do Rei, então com 16/17 anos. Nascia o futebol-arte, ou a arte no futebol. Dois anos mais velho do que o famoso mineiro de Três Corações, tudo fazia para seguir seus passos e passes, no rádio, na TV preta e branca ou colorida, nos palcos de onde ele encantava as plateias, ou seja, nos campos de futebol, a maior parte do tempo vestindo a camisa do Santos F. Clube, onde surgiu e prosperou seu destino de Rei.
Em matéria da Folha, o repórter Naief Haddad relata uma visita de Pelé ao próprio Jornal, em 06 de abril de 2016, ou seja, 26 anos após se despedir dos gramados. Diz o repórter: “A porta de trás do carro se abriu e ele, lentamente, pôs os pés na Barão de Limeira. Neste instante, ao olhar para os lados, percebi que uma roda rapidamente tinha se formado: amigas e amigos da Redação, colegas de outros departamentos do Jornal, balconistas da padaria vizinha, curiosos que passavam pela rua. Para a surpresa de todos ali, Pelé tinha uma bengala à mão esquerda”.
Ninguém pensava em presenciar o declínio físico do maior futebolista do planeta, a ponto de precisar de apoio para os menores movimentos de locomoção. A alegria do Rei foi total quando encontrou o amigo Juca Kfouri. Durante toda a visita, Pelé muito se esforçou para que seus movimentos parecessem muito naturais. E conclui o repórter: “Aquele era o seu drible derradeiro”.
Em 2007, escrevi e publiquei crônica na Tribuna do Norte sobre um texto do escritor, poeta e cineasta italiano Pier Paolo Pasolini (1922-1975), no qual o autor diz existir o futebol prosa e o futebol poesia. O texto foi publicado em jornal italiano, ainda sob o impacto da grande vitória do time do Brasil sobre o time da Itália, em 21 de julho de 1970. O grande escritor e cineasta Pier P. Pasolini, de vida controversa, apaixonado por futebol, registrou duas linguagens neste tipo de esporte, a prosaica e a poética, e dá exemplos entre alguns craques italianos. E diz que as linguagens dos países têm um terreno comum, que é a cultura e a atualidade histórica de cada nação. Ressalta que o momento do gol, em qualquer linguagem, é sempre um momento poético do futebol. Ao final, Pasolini presta honras ao Rei Pelé, sem citar o nome: “Se o drible e o gol são o momento individualista-poético do futebol, o futebol brasileiro é, portanto, o futebol de poesia. Sem fazer distinção de valor, mas em sentido puramente técnico, no México, em 1970, a prosa estatizante italiana foi batida pela poesia brasileira”.
Bendito seja o nosso Rei Pelé, nome que mais divulgou o Brasil mundo afora. Para mostrar, em poucas palavras, perfil mais completo do Rei, disse o cronista João Saldanha (1917-1990): “Dentro do campo, Pelé foi o maior gênio que conheci. Fora do campo, é um homem comum”.
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