Mais de 18,5 milhões de mulheres sofreram violência no Brasil em 2022. As vítimas relataram ter sofrido, em média, quatro agressões no ano, mas o número mais que dobra entre as divorciadas, chegando à média de nove vezes. Entre elas, a psicopedagoga Patrícia Almeida, autora do livro que ensina mulheres a se libertarem de violência psicológica. “Mulheres correm perigo! Gaslighting: o que você tem de saber sobre esse tipo de manipulação psicológica na relação afetiva” (Praia, 2023, R$ 20) está à venda no link da editora no Hotmart https://pay.hotmart.com/T83023281A?bid=1685033835772).
Os números são da pesquisa “Visível e Invisível: a Vitimização de Mulheres no Brasil”, realizada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública e que revela o crescimento da tragédia em curso. Entre as formas de violência citadas, as mais frequentes foram as ofensas verbais (23,1%), perseguição (13,5%), ameaças de violências físicas (12,4%), ofensas sexuais (9%), espancamento ou tentativa de estrangulamento (5,4%), ameaça com faca ou arma de fogo (5,1%), lesão provocada por algum objeto que foi atirado nelas (4,2%) e esfaqueamento ou tiro (1,6%).
Para se reencontrar, resistir e recomeçar, Patrícia Almeida adotou procedimentos que agora compilou em seu livro e que podem ajudar mulheres que sofrem esse tipo de situação. Ela conta em seus escritos que, antes de chegar à violência física, em geral, os abusadores começam com as diversas formas de violência psicológica – desde os xingamentos e o desmerecimento até o que talvez seja a forma mais sórdida: o gaslighting.
“O livro é um treinamento para que as vítimas se libertem das relações abusivas”, resumiu Patrícia. Confira na entrevista a seguir mais informações sobre o que é gaslighting, os três ciclos da violência contra a mulher, como identificar essa situação, formas de prevenção e um pouco da história vivida pela autora.
Entrevista com Patrícia Almeida
O que é gaslighting?
Um tipo de violência psicológica muito comum, que os abusadores utilizam para manipular a realidade, confundindo sua vítima para convencê-la a fazer o que eles querem e acreditar nas mentiras que contam.
Um exemplo: a esposa encontra uma mensagem comprometedora no celular do marido e, decepcionada, o questiona por estar sendo traída. Ele, por sua vez, diz que ela não viu nada de mais, que é paranoica e ciumenta. Que vai falar para a família e amigos que ela é desequilibrada, bisbilhoteira e dará sermões sobre confiança no relacionamento.
Como surgiu a ideia de escrever um livro sobre gaslighting?
A partir da minha vivência como vítima de violência doméstica.
Depois que consegui me afastar do abusador, senti como se tivesse sido atropelada emocionalmente e espiritualmente. Para entender o que havia acontecido comigo, fiz diversas leituras e me deparei com o termo gaslighting e me reconheci dentro desse tipo de abuso.
Durante as leituras, percebi que esses conteúdos são densos e, às vezes, com uma linguagem muito acadêmica.
Tive então o desejo de escrever um livro “traduzindo” as informações numa linguagem clara e objetiva, com o intuito de ajudar outras vítimas a se reconhecer no ciclo dos abusos, pois acredito que somente aprendendo como os abusadores agem é possível evitar o risco de cair em novas situações abusivas.
As mulheres são as maiores vítimas?
Sim! Dados oficiais mostram que as mulheres são as maiores vítimas de violência doméstica.
A violência passa por três ciclos: lua de mel, tensão e explosão. A fase da explosão é a última, é quando surge a agressão física, ou seja, quando a violência física chega ao contexto do relacionamento. A psicológica existe há muito tempo, porém é difícil de ser descoberta, pois não deixa marcas nos corpos femininos, mas feridas emocionais profundas na alma das mulheres.
O resultado de tudo isso está nos casos de depressão e suicídio entre mulheres que só tem crescido.
Existem também pesquisas sérias, ao redor do mundo, revelando a predisposição de psicopatia para pessoas do gênero masculino: 4% da população mundial masculina é psicopata, contra 1% da população mundial feminina.
Há como se prevenir?
Sim! O melhor método de prevenção é aprender sobre as táticas de controle e persuasão que os manipuladores utilizam para controlar, confundir e induzir o seu comportamento, mas sobretudo, compreender o perfil emocional das vítimas, o porquê de terem sido escolhidas.
Elas se culpam muito quando descobrem que foram enganadas.
O que a vítima deve fazer em caso de perceber que se encontra em uma situação de gaslighting?
A orientação é de que a vítima se afaste dessa pessoa. Caso não seja possível realizar esse afastamento rapidamente, existem algumas atitudes que ela pode utilizar para, dentro do que for possível, se “blindar” ao máximo e resistir às provocações.
Porém, enquanto se “blinda” e se planeja para sair da relação abusiva, pode, discretamente, reunir o máximo de provas que conseguir, para tentar provar judicialmente os abusivos, caso decida denunciar: unir prints, áudios, fazer acompanhamento psicológico e solicitar laudo, etc. Não deve guardar as provas em casa, para o abusador não destruí-las.
Porque o livro tem atividades de aprendizagem?
O livro é um treinamento para que as vítimas se libertem das relações abusivas.
Sou pedagoga e sei que o processo de aprendizagem pode acontecer de forma mais eficaz quando unimos conceitos e procedimentos. Eles podem gerar atitudes!
Como sobrevivente de violência psicológica, o que você diz para as mulheres?
Eu as encorajo a não desistir de si!
Foi por elas que escrevi o livro. Por aquelas que não conseguem romper a relação, porque estão no fundo do poço emocional, por aquelas que não tem condições financeiras para custear um apoio psicológico, por aquelas que não tem família ou que a família não pode ajudar.
É possível sobreviver, mas o caminho da sobrevivência requer perseverança, deve ser trilhado todos os dias, mas aprendi e ainda estou aprendendo, por isso, estou contando para elas, que não importa onde estejamos ou a idade que temos. O que realmente importa é confiar que a vida sempre estará de portas abertas, abrindo caminhos para nossa felicidade!