Esse texto é dedicado a minha irmã, Cristiane Gonzaga.
Desde que me entendo por gente gosto de ouvir as canções do cantor e compositor inglês Elton John, que é conhecido, no Brasil, sobretudo por suas baladas românticas, embora tenha produzido ao longo de mais de cinquenta anos de carreira, músicas nos mais diversos gêneros.
Desde tenra infância, lá por volta de sete, oito anos de idade, nos anos 80 – uma década em que a pop music dominava as Rádios FM do Brasil, com uma geração de artistas novos surgindo, como Michael Jackson, Madonna, George Michael e Prince – eu me sentia muito bem, ouvindo as já consideradas antigas músicas de Elton John, aquelas produzidas em sua fase mais brilhante, nos anos 70.
Lembro muito bem, eu menino, arriscando cantar Skyline Pigeon, que fez estrondoso sucesso no Brasil em meados dos anos 70. Nessa época, Elton John era uma espécie de Rei Midas da música, tudo que ele tocava virava ouro; essa canção é um bom exemplo, ela não foi lançada como single, ou seja não era pra ter apelo comercial nas rádios, mas, como tudo que Elton fazia naquela fase era sinônimo de sucesso, aconteceram muitos fenômenos isolados com suas canções, e muitas delas alcançavam êxito em vários lugares do planeta, ao lado , claro, dos seus hits mais populares.
Eu, até hoje lembro meus gritos cantarolando Fly away, skyline pigeon fly… Enfim, eu não entendia nada da letra, mas, sentia profundamente aquela melodia dentro do meu peito, como se a canção fosse uma verdade em minha vida. Foi justamente nesse período, com menos de dez anos de idade, que comecei a prestar atenção em outras canções de Elton e colava o ouvido no pequeno aparelho 2X1, rádio e toca discos, que tínhamos lá em casa, já velhinho, surrado, mas suficiente para que eu descobrisse a voz do Elton em outras de suas maravilhosas músicas, como Your Song, Goodbye Yellow Brick Road , Don’t Go Breaking My Heart , Daniel, Tiny Dancer, Sorry Seems To Be The Hardest Word, Don’t let the sun go down on me, Crocodile Rock e muitas outras.
Rocket Man
Porém, uma música de Elton, lançada orginalmente em 1972, Rocket Man, me levava para um lugar desconhecido, dentro de mim mesmo. Rocket Man já era na minha época, uma espécie de arco da velha, canção que se ouvia apenas em horários destinados às músicas do passado; eu ficava sempre atento a ela, que me fazia navegar por mares distantes da mente, me transportava para outro universo; mesmo sem nunca ter viajado para lugar algum, eu viajava nas canções de Elton. Rocket Man bradava : And I think it’s gonna be a long long time, ‘Till touch down brings me round again to find, I’m not the man they think I am at home, Oh no, no, no, I’m a rocket man…
Essa canção me deixava literalmente no espaço, e me fazia ter esperança em algo; ela possui uma força melódica, uma espécie de momento crescente em suas cordas, harmonia pulsante, como foi gravada, que me fazia respirar fundo e compreender que eu tinha capacidade para me realizar em qualquer coisa que tentasse fazer. E embora eu fosse apenas um menino com menos de dez anos, eu queria ser um Rocket Man, embora as probabilidades à minha frente, fossem remotas. Talvez, pela primeira vez na minha vida, eu tivesse vontade de voar, voar longe, ser um homem do foguete, um astronauta, alguém em busca de um sonho, um objetivo na vida…
Lembro que por volta dos meus onze anos, foi lançada uma coletânea de sucessos de Elton John no Brasil, The Very Best Of Elton John. De frente para a TV, vendo o comercial do disco com imagens dos clips, eu já conhecia boa parte das músicas, de tanto ouvir nas rádios, mas queria muito ter aquele LP; foi um dos meus primeiros sonhos na vida. Não queria brinquedo, não queria bicicleta, nem bola, eu queria o disco do Elton, com algumas das suas melhores canções. E pedi a minha mãe que comprasse esse disco pra mim, mas, infelizmente, ela não podia comprá-lo, não tínhamos dinheiro para nos dar ao luxo de adquirir um disco, objeto raro em nossa casa.
Num dos meus primeiros empregos, ainda criança, por volta dos doze anos, lembro que a primeira coisa que fiz quando recebi pagamento foi ir ao centro da cidade, no sebo Cata Livros, de Jácio, comprar, claro, um disco de Elton John; chamava-se Blue Moves, tinha sido lançado em 1976, era duplo, tinha muitas faixas que me tocavam, embora boa parte delas fossem, ao menos para mim, desconhecidas. Passei horas e horas ouvindo Tonight, clássico cult de Elton, uma verdadeira obra-prima, com quase oito minutos de duração, sendo boa parte dela instrumental, com orquestra sinfônica. Ouvir aquela orquestra e o jovem Elton em plena forma, interpretar Tonight, Just let the curtains close in silence, Tonight, Why not approach with less defiance… ia no fundo do meu ser, acho que, pela primeira vez em minha vida, senti o poder da arte fluindo, era poesia feito música.
Your song
Os dias passaram, até que, finalmente, eu consegui comprar um outro disco do Elton, e que tinha seu primeiro hit, Your Song. Quem não ouviu ao menos uma vez na vida. It’s a little bit funny, this feeling inside, I’m not one of those who can easily hide, I don’t have much money, but boy if I did, I’d buy a big house where we both could live?. Infelizmente, o LP estava completamente arranhado, e eu na minha inocência e ansiedade de criança não consegui enxergar isso, e fiquei com ele apenas guardado como lembrança. Tempos depois, conseguiria ouvir esse disco, que é uma verdadeira usina de hits.
Foi com o disco homônimo que, em 1970, Elton conquistou o mercado e o público americano, e consequentemente outros mercados consumidores de música pop, até os meados da década de 1970, quando Elton já exausto das turnês e dos discos, num show declarou que ia se aposentar. Claro, que poucos anos depois, voltaria e continuaria com seu apelo musical, basta lembrar que em 1980, ele fez um show no Central Park, em Nova York, para 500 mil pessoas.
O melhor pós-Beatles
Elton John foi um fenômeno admirável nos anos 70, considerado pelo próprio John Lennon como “a melhor coisa que tinha surgido pós Beatles”. Elton vencera unicamente pelo talento, pois não tinha beleza física alguma, era baixinho, gordinho e quase careca (fora dos padrões de beleza midiáticos), mas sentado ao piano, virava um monstro nos shows ao vivo.
Criou uma sequência de hits nos anos 70 que se tornaram febre em todo o mundo, especialmente nos Estados Unidos, que praticamente se apossou dele em sua fase mais intensa, entre os anos de 1970 e 1976, quando produziu seus melhores discos e conseguia chegar, facilmente, ao topo das paradas americanas. Foram 17 discos em 6 anos, uma loucura, algo impossível para os dias atuais.
O sucesso era tão gigantesco, que, em 1975, apenas cinco anos após sua estreia na América, ele já inaugurava uma placa na famosa Calçada da Fama em Los Angeles, e seus discos eram responsáveis por três por cento das vendas de disco no mundo todo. O LP Captain Fantastic, lançado em 1975, vendeu um milhão de cópias por encomenda, ou seja, antes mesmo de ser lançado. O LP trazia hits emblemáticos, como Philadelphia Freedom, e a regravação dos Beatlles, Lucy In The Sky With Diamonds, com direito a John Lennon na guitarra. Evidentemente todas foram primeiro lugar em vendas nos EUA.
Baladas românticas
Mas, voltando ao menino de Cidade Nova, periferia de Natal, cada vez mais eu me encantava com as composições do cantor britânico; o tempo passava, contudo as melodias de Elton me acompanhavam. O mais novo single do cantor na época da minha infância, Sacrifice, foi uma explosão no mundo todo. Por sinal, uma das especialidades de Elton, era fazer baladas românticas; desconheço, até hoje, alguém com o dom, a capacidade de criar músicas nessa vertente, como Elton; basta citar grandes hits dele durante a década de 80, como Little Jeannie, Blue Eyes, Empty Garden (homenagem ao amigo John Lennon), I Guess That’s Why They Call It The Blues, Nikita, Whispers, Sacrifice, You Gotta Love Someone…
Todas as suas músicas levam qualquer ouvinte, que tenha sensibilidade, a apreciar esse grande artista, que continua vivo e ativo. Seu apelo musical atravessa gerações. Vale relembrar que, nos anos 90, com o lançamento do desenho da Disney, O Rei Leão (1994), Elton compôs e gravou as canções em parceira com Tim Rice e ganhou além do Globo de Ouro, o Oscar de melhor canção original, com a música Can you feel the love tonigt .O disco repleto de outras canções conhecidas entre crianças, adolescentes e adultos é o álbum de trilha sonora de um filme de animação mais vendido do mundo, com mais de dez milhões de cópias.
Candle in the wind
Recordo ainda os meus 13 anos de idade, quando comprei Goodbye Yellow Brick Road, LP originalmente lançado em 1973; esplêndido, era Elton na sua melhor fase, o disco inteiro de hits, Funeral for a Friend/Love Lies Bleeding, Candle in the Wind, Bennie and the Jets, Goodbye Yellow Brick Road, Sweet Painted Lady, All the Girls Love Alice, Saturday Night’s Alright for Fighting.
Candle in the Wind, desconhecida até então para mim, soava como uma espécie de calmante, um remédio para minhas angústias juvenis, e eu sequer sabia ainda que ela tinha sido composta em homenagem à musa Marilyn Monroe. Minha irmã, Cristiane, coitada, era quem tinha que aguentar, eu, o dia todo ouvindo as canções de Elton, muitas vezes a mesma música, repetidas vezes, uma tortura para ela, eu acho, que aprendeu forçadamente todas.
Em 1997, Elton John regravou Candle in the Wind em uma homenagem à sua amiga pessoal Diana, Princesa de Gales – que faleceu em um acidente de carro em Paris – com o titulo Goodbye England’s Rose. Esta versão foi lançada como single, e chegou a número um nas paradas em muitos países, fazendo um sucesso muito maior do que a versão original e tornando-se o single mais vendido de todos os tempos.
Entre o sonho e o som
Ainda menino, até a pré-adolescência, trabalhando, com muito suor, consegui a proeza de comprar vinte discos de Elton John em Sebos da cidade. Eram meu maior orgulho, eu fazia questão de mostrá-los a todos que iam lá em casa. Porém, lamentavelmente, a vida é cheia de lances, muitas vezes como uma montanha russa, e, numa fase em que passei muito tempo desempregado, tive que vendê-los para poder ajudar em casa. Meu sonho de ser um homem, menino-foguete, um astronauta, voava de minhas mãos, pelo menos naquele momento, como uma fumaça entre os dedos.
Porém, nunca deixei de ouvir as canções de Elton, e tenho plena certeza de que elas foram decisivas e contribuíram na formação que tenho hoje, inclusive na escolha do próprio curso em que me formei (Letras- Português- Inglês) e na carreira que segui.