De Edson Nery da Fonseca, Jarbas Martins e um atentado à memória de Natal

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Nascido em Catolé do Rocha e criado em Lucrécia, quando Lucrécia ainda era vila, pertencente ao município de Martins, Dom Policarpo Ribeiro de Menezes é monge do Mosteiro São Bento, de Olinda. Grande figura humana. Conheci-o em Martins, há algum tempo, e desde então temos mantido correspondência epistolar à moda antiga, já que não utilizamos a internet.

De uma das cartas que lhe enviei, em 25-11-2009, encontrada em meio a alguns papéis amarelecidos, numa gaveta com cheiro de naftalina, transcrevo o seguinte trecho:

“Li de um fôlego o novo livro do Prof. Edson Nery da Fonseca, Vão-se os Dias e eu Fico, gentilmente enviado. Parece-me ser um dos melhores livros de memórias surgidos nas últimas décadas. Quantas revelações interessantes! E tudo numa prosa ágil e leve, que dá gosto.

As confissões contidas nos dois últimos capítulos (páginas 147/163) somente o engrandecem, até porque deixam entrever um homem de coragem. Pedro Vicente, um dos seus amigos natalenses, é da mesma opinião”.

De outra carta, datada de 26-04-2012:

“Recebi o livro que o Sr. teve a gentileza de me enviar – Estão Todos Dormindo, de Edson Nery da Fonseca –, e fiquei no maior alvoroço, prelibando (o termo é bem este), prelibando a boa leitura que logo iria ter. O estilo do Prof. Edson é aliciante, prende o leitor e não o solta até a última linha. Disto eu tinha certeza desde que li O Recife Revisitado e Vão-se os Dias e Eu Fico.

Já ‘devorei’ vários capítulos, salteados, deste novo livro, precisamente aqueles que enfocam personalidades do meu conhecimento – direto ou indireto: Zila Mamede, Ascenso Ferreira, Carlos Drummond de Andrade, Otto Maria Carpeaux, Mauro Mota, Darcy Ribeiro. São perfis admiráveis, que enriquecem a obra do escritor Edson Nery da Fonseca, de modo especial no campo da memorialística e da biografia”.

Visita a Edson Nery da Fonseca

Notável escritor e biblioteconomista, o pernambucano Edson Nery da Fonseca (1921-2014) publicou vários livros, tendo alcançado renome nacional, especialmente, por seus ensaios e artigos sobre a vida e a obra de Gilberto Freyre. Morava em Olinda, num casarão cheio de livros e gatos, vizinho ao Mosteiro São Bento. Visitei-o, certa vez, em companhia de Dom Policarpo – que era seu amigo e confessor – e Inácio Magalhães, já se vão alguns anos. Guardei dele a melhor impressão. Um gentleman.

LIVROS NA MESA

Há bastante tempo, não lia um livro de contos tão bom quanto esse Fuzuê em Entrepelado, de Antônio Melo (Natal: Z. Editora, 2023).

Linguagem e estilo se harmonizam, com simplicidade e clareza, em histórias curtas, que encantam pelo seu teor, profundamente humano, e deixam o leitor preso à leitura.

– & & & –

No livro O Sol dá têmpera à espada-de-são-jorge (Natal: Offset Editora, 2023), Elilson José Batista reuniu haicais, de sua lavra, e outros poemas minimalistas, apresentados como haicais, que, no entanto, parecem-me ser aforismos.

Exemplo de haicai:

A canoa flui,

Na noite, a dividir

A lua refletida.

 

Exemplo de aforismo:

Quem é insensível

Ao pernilongo

No próprio braço?

 

Leitura breve e leve. Vale a pena conferir.

 

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Qualquer observador da cena literária sabe que Jarbas Martins é um dos nossos melhores poetas. Autor de Contracanto, 44 Haicais e 14 versus 14, Jarbas lançou, há pouco tempo, a coletânea Terceiro canto, contendo seus poemas publicados na Revista da Academia Norte-rio-grandense de Letras, no período entre julho de 2005 e junho de 2023.

A organização do livro coube a mim e ao escritor Thiago Gonzaga, autor também do prefácio.

A seguir, transcrevo um dos poemas contidos na obra. Vejam que beleza:

SONETO

A Maria Emília Wanderley, musa do Sertão do Cabugi

O amor é bem mais que uma casa,

e mais universal do que a dor.

É ave que ao ninho estende a asa

e se fez o arcanjo protetor.

 

Meu amor vive à sombra da oiticica,

aonde gorjeios de canários for.

Mora em nuvem que passa e revifica

nosso Sertão do Cabugi em flor.

 

Sendo assim, sem limites e diverso,

o amor se perde num soneto ou verso

que se encontra em meu lábio ou teu olhar.

 

Centelha ou o sol a me abarcar,

o errante navegante não sou eu.

Tu és o meu espelho, eu sou o teu.

 

ATENTADO

Dia desses, passando na avenida Hermes da Fonseca, presenciei, estarrecido, um atentado contra a memória de Natal: demolia-se a Casa dos Governadores. A linda vivenda, em estilo colonial mexicano, virava escombros, impunemente.

Ali residiram figuras memoráveis: Sylvio Pedroza (que a construiu, em 1944), Aluízio Alves, Walfredo Gurgel, Tarcísio Maia e outros governadores.

É de pasmar que aquele monumento histórico e artístico não estivesse tombado pelo competente órgão.

Agora, a Casa dos Governadores é “um retrato na parede”… E como dói, poeta!

Manoel Onofre Jr.

Manoel Onofre Jr.

Desembargador aposentado, pesquisador e escritor. Autor de “Chão dos Simples”, “Ficcionistas Potiguares”, “Contistas Potiguares” e outros livros. Ocupa a cadeira nº 5 da Academia Norte-rio-grandense de Letras.

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