Francisco Sobreira: drama e humor do homem que passeava com gansos

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Um romance desmontável… Foi assim que alguns críticos literários qualificaram “Vidas Secas”, de Graciliano Ramos, quando lançado, na década de 1930. Compõem o livro treze capítulos, que podem ser lidos de modo autônomo, semelhando pequenos contos, porém interligados, formam narrativa coesa e harmoniosa, a não deixar dúvida sobre o gênero romance, em que se classifica.

Idêntica qualificação poderia ser atribuída a “O Homem que Passeava com Gansos”, novo livro de Francisco Sobreira (Natal: Sebo Vermelho Edições, 2022), romance, cujo título baseia-se em alusão contida numa crônica do jornalista e escritor Vicente Serejo.

Tal como em “Vidas Secas”, a ação romanesca divide-se em várias partes, que podem ser lidas separadamente, sem que se perca o fio da meada. Há uma espécie de intermezzo, sob o título “O Clube dos Maledicentes”, com bastante humor e ironia, enfocando algumas figuras da intelectualidade natalense em atividade. Nomes supostos, claro. Mas o ponto alto desse romance, é, sem dúvidas, a terceira e última parte, repassada de intensa dramaticidade, a que não falta uma boa dose de suspense.

Francisco Sobreira, todos sabem, tem exercido a crítica cinematográfica em jornais e blogs, e, como tal, deixa entrever, em sua narrativa, a influência, consciente ou não, de Alfred Hitchcock, o mestre do suspense.

Resta dizer, numa breve resenha, que o homem que passeava com gansos, embora apareça poucas vezes ao longo da narrativa, torna-se personagem-chave, aumentando o mistério que o cerca e faz aumentar, também, o interesse pela leitura.

“O Homem que Passeava com Gansos” vem juntar-se a outras boas obras de ficção, lançadas por último, em nosso Estado, como, por exemplo, “Pelo Cabo da Boa Esperança”, de Demétrio Diniz, e “O Caderno de Deuzivaldo”, de Tácito Costa – atestados da fase alvissareira por que passa a nossa Prosa de Ficção, em seguida a um longo predomínio da Poesia.

Uma curiosidade:

Alguns dos sócios do Clube dos Maledicentes chamam-se Rodolfo Teófilo, Antônio Sales e Adolfo Caminha, escritores cearenses integrantes da famosa “Padaria Espiritual”, confraria que agitou a vida literária de Fortaleza no final do século XIX.

Vejamos os “estatutos” do Clube dos Maledicentes:

DA FINALIDADE

O Clube dos Maledicentes foi criado com o propósito de fazer oposição crítica a personalidade da sociedade natalense, dos mais diversos segmentos, sempre que elas, por comportamento, atitudes e opiniões, façam por se tornar alvos de destaque.

DOS SÓCIOS

São em número de 14, sendo 7 titulares e 7 suplentes.

DAS REUNIÕES

  • As reuniões serão realizadas no quintal da residência do sócio ORLANDO PEDROSA, localizada no bairro do Tirol, nesta Cidade do Natal.
  • As reuniões transcorrerão aos sábados, no horário das 12 horas às 17 horas, com um intervalo que terá a duração de 30 (trinta) minutos, com uma tolerância de, NO MÁXIMO, 10 (dez) minutos, para que seja servido o almoço.
  • As despesas do almoço serão custeadas por um determinado sócio a cada vez que o mesmo se realizar. Fica ainda estabelecido que, durante o almoço, as conversas não obedecerão ao tema prioritário e razão de ser da fundação deste Clube, podendo cada sócio tratar do assunto que julgar necessário.
  • As reuniões sempre ocorrerão com o número de 7 sócios. O sócio que não puder comparecer, será substituído pelo respectivo suplente.
  • Exige-se rigorosa pontualidade dos participantes da reunião, que só poderá iniciar-se com a presença dos 7 sócios. Todo aquele que chegar atrasado, estará sujeito ao pagamento de uma multa em pecúnia, a ser oportunamente estabelecida.
  • Estando os 7 sócios presentes na calçada da referida residência, no horário determinado, ingressarão na casa pelo portão dos fundos, em fila indiana, com o Presidente em exercício à frente.

DO PRESIDENTE

O Presidente terá o mandato de 2 anos.

Manoel Onofre Jr.

Manoel Onofre Jr.

Desembargador aposentado, pesquisador e escritor. Autor de “Chão dos Simples”, “Ficcionistas Potiguares”, “Contistas Potiguares” e outros livros. Ocupa a cadeira nº 5 da Academia Norte-rio-grandense de Letras.

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