A crítica musical está sempre certa?

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Mário de Andrade, um dos expoentes do modernismo brasileiro, era escritor, poeta, crítico literário, musicólogo, folclorista e ativista cultural. É considerado por muitos como o primeiro grande crítico da música brasileira, além de ter sido professor e pianista. No campo da música, foi o primeiro grande pesquisador das inúmeras vertentes da música tradicional do Brasil.  Depois dele, com o passar dos anos, surgiram outros nomes que se notabilizaram como críticos musicais.

No final dos anos 60 e por toda a década de 1970, as TV’s passaram a exibir programas onde se destacavam as presenças de críticos musicais que analisavam os lançamentos de discos de artistas conhecidos e iniciantes e dentre estes críticos, dois se projetaram nacionalmente: Alfredo Borba e Carlos Renato.

Alfredo Borba era um crítico musical feroz. Também era músico, jornalista esportivo e compositor. Duas músicas de sua autoria chamaram a atenção de Paulo Machado de Carvalho, dono da TV e da rádio Record na década de 60 (e chefe da Delegação da seleção brasileira campeã na Copa do Mundo de 1958): “Marcha da Vitória” e “Marcha dos Campeões do Mundo”. O sucesso da “Marcha dos Campeões do Mundo” lhe rendeu um convite do empresário paulista para apresentar um programa na rádio de sua propriedade. O programa se chamava “Discos em Raio-X”, onde Borba quebrava discos no ar. Também trabalhou nas rádios Excelsior, Tupi e na rádio Globo, onde apresentou, em 1969, os programas “A Gaiola de Ouro” e “As Duas Faces do Disco”. Passou pela TV Bandeirantes, onde teve sérios problemas ao criticar a capa do LP Jóia de Caetano Veloso, onde o artista aparece nu com a mulher e o filho pequeno. No final dos anos 70 apresentou um programa na TVS (futuro SBT), onde quebrou no ar o primeiro LP de uma cantora nordestina, afirmando que ela era gasguita e tinha uma voz de “taboca rachada”.

Outro crítico musical muito famoso foi Carlos Renato. Atuou em rádio, jornais e TV e durante muitos anos participou do corpo de jurados dos programas de Flávio Cavalcanti ao lado de José Messias, Léa Penteado e Wilton Franco, entre outros. Carlos Renato alcançou o auge da sua popularidade quando fez parte do júri dos programas “A Grande Chance” e “Um Instante, Maestro”, de Flávio CavalcantiComo Alfredo Borba, Carlos Renato fazia o gênero polêmico e severo e nos programas costumava fazer comentários sobre a cena musical da época, geralmente analisando (e criticando) lançamentos de novos nomes que surgiam no cenário musical brasileiro.

Em meado dos anos 70, morando no Rio de Janeiro eu assistia e lia tudo o que a TV e a Imprensa divulgavam sobre o movimento musical no Brasil. Em 1978 assisti pela TV Tupi Carlos Renato, ao participar como jurado de um dos programas de Flávio Cavalcanti, fazer um comentário sobre uma cantora novata que tinha gravado seu primeiro compacto simples, cujo lado A era uma música que estava na trilha sonora da novela Pecado Rasgado, da TV Globo. A cantora cantava magistralmente (na época foi elogiada até por Caetano Veloso); a música se chamava “Fique Um Pouco Mais” e bateu recorde de execução em todas as emissoras de rádio do país. Ao comentar sobre as qualidades vocais da novata, Carlos Renato foi taxativo: “A partir de hoje, a maior cantora do Brasil não é mais Elis Regina…”

No ano seguinte, assisti pela TV quando Alfredo Borba, no seu programa que ia ao ar pela TVS, mostrou o primeiro LP de uma cantora nordestina. Depois de ouvir algumas faixas, quebrou o disco no ar, dizendo que aquela “cantora gasguita com a voz de taboca rachada não chegaria a lugar nenhum.”

A cantora que Alfredo Borba achara “gasguita e com voz de taboca rachada” chama-se Elba Ramalho. E a que Carlos Renato afirmou que que tomaria o lugar de Elis Regina, é Rosana.

Isto prova que nem sempre a crítica musical está certa em suas avaliações.

Fernando Luiz

Fernando Luiz

Cantor, compositor, produtor cultural e apresentador do programa Talento Potiguar, que é exibido aos sábados, às 8 horas pela TV Ponta Negra, afiliada do SBT no RN.

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