Croniketa da Burakera #34, por Ruben G Nunes
Campanhas-de-copo-y-pasión! Brau! Algumas pessoas habitam minha praia interior. Aquela prainha que temos no coração.
A Prainha do Coração… de brancareia, de brisasuave, de sol lua mar murmurejando saudades.
Prainha do Coração onde Tempo e Vida sem pressa, nem pressão, nem pressinhas, se-escarrancham pelos horizontes… onde céu nuvens mar se–espreguiçam em espamos de cores… onde xuá-correndo, como crianças alegres, as espumas se espicham n’areia…
… a prainha do coração sempre nos abraça com bolhas de sonhos, com abraços d’amizades, com risos multicores d’alegrias. Como pipas coloridas do kitesurf.
Praia onde, no espelho d’areia molhada, nossos passos pisam reflexos das nuvens no céu… pachorrentas nuvens lentipassando, lentimudando, lentisorrindo…
Praia onde gaivotas riscam o tempo em lânguidos voos de cumplicidade a dois. E coqueiros acenam como velhos amigos.
Prainha de nudismo d’alma.
Na linha do horizonte navios, longepartindo, carregando nossas todas saudades. Navios talvez piratas, caturrando-religando, céu e mar, sonhos e emoções, destinos e redestinos.
Ao longo da praia, espreguiçadeiras, guardas-sol, mesinhas com kit completo d’água de coco, bebidas diversas, frutas, tira-gosto, néctar e ambrosía, uisquinho na faixa, carrinhos da Kibon. Tudo servido por ninfas, naiádes, iaras, sereias… filhas das águas.
Essa é a praia de todos nós. E de cada um. Lá pros lados das lonjuras do coração. Lá onde alma, espírito, corpo, pensares-e-sentires, loucuras-e-solidãos se conjuntam no amálgama d’amores e amizades pra valer. Sem impostos a pagar.
Praia longa e curva, num sem-fim d’areias brancas e marazul-esverdeando.
Em vago avanço, a tardemansa se esparrama no céu-laranja-vermelhando.
Toda palavra cala no olhar de espanto e êxtase. O gozo do indescritível sacode a alma. A prainha do Coração.
Lá adiante, já longe, na curva do promontório, fica o cais dos amores-perdidos-e-achados. Lá também, o eterno cabaré das mulhas do porto. Onde piratas e marujos, encharcados de rum preto caribeño, descarregam sua plena-profunda-solidão-dos-mares-e-amores.
Falam, jogam, brigam. A marujada canta em volta de uma barrica imaginária de rum preto. Marujos na farra. Tomam o penúltimo trago. Amam o penúltimo amor. E a banda da buate tocando todos os sons de gamações, dores de cotovelo e xifrações. Cantam ébrios de Vida. E dançam lascivamente. Mãos nas ancas, nas bundaças sensuais da parceirinha de fé. Dois pra lá, dois pra cá… e chamam na chincha a xereca inchada. Coisa-na-coisa. Esfreganças em frenesi. Beijam de língua molhada a parceirinha. Sussurram coisas. Esguicham. Gemem. Lentigozos-quase. Depois se arrancam pelas quebradas cósmicas, como poetiza Neruda em seu Crepusculário…
“… los marineros besan y se van/
Dejan una promesa/
No vuelven nunca más/
En cada puerto una mujer espera:/los marineros besan y se van/
Una noche se acuestan con la muerte/
en el lecho del mar”.
Todas essas cenas ralam-e-rolam dentrofora de nós. Algo além. Algo que falta. Algo que foi. Algo que engancha. Talvez sonhos. Talvez mistérios. Que nos movem-comovem… nas praias das cidades, nas esquinas, botecos, relações sociais, motéis, pela vidaviva fora de nós. E nas nossas prainhas dentro de nós.
Seja lá que sonhos e mistérios habitam dentrofora de nós sinto que algumas pessoas de carneossoalma habitam minha prainha. Seja lá pros lados da prainha mansa. Seja lá pros lados da prainha dos cabarés da pesada. Seja lá…
Umas pessoas aparecem e se vão. Outras são cativas. Se cativaram e me cativaram… reciprocidade explícita… sintonia natural. São amigos, manos, amantes… possíveis e impossíveis, desta e d’outros tempos e estrelas… seja ao vivo e a cores… seja nas distâncias ligadas pela afinidade espiritual…
Por isso é preciso, absolutamente preciso, que o velho navio, lá ao longe, carregado de sonhos e saudades, não se perca nas tempestades d’alma. E ainda navegue. Desde as marés perigosas do amorpaixão até as marés de remanso das amizades.
Que navegue firme… e retorne… para o abraço e o brinde.
Que mesmo nos bordejos de sua própria solidão, nosso navio e seus marujos atraquem e lancem âncora, no cais dos amores-perdidos-e-achados. E que busquem, mesmo nos cabarés da pesada, a sintonia de todas as marés….
Porquanto é preciso, absolutamente preciso, que na prainha do Coração, o encantamento nunca morra. E que amores e amizades se movam nas boas-marés-da-paixão, dos sonhos, xavecos, enganchos, crushes, and shallow now…
Pois que, como assevera voinho-Hegel, o desfilósofo das contradições, das diferenças, da história, da dialética e do infinito:
“Nada de grande se fez no mundo sem paixão”.
Dentro de mim, agora, lá na Prainha do Coração, o velho Nelson Rodrigues, com camisa tricolor, tomando limonada, bate papo macio com Vinicius, o poetinha de todos nós e de todos os “nós-de-nós”… o velho-Vina sorri.
Nelson dizia: “Todos nós precisamos de um abraço de meia em meia hora. Não abraço burocrático, formalzinho. Mas abraço como um sorriso do corpo inteiro, de orelha a orelha, na alegria de viver e amar!”.
“Nelson-velho – me intrometi – então, o abraço de amizade é também uma forma de amor – é isso?!”.
Senti que ele deu um sorriso misterioso, falou do Fluminense campeão de 2012, de Fred, Diego Cavalieri, Deco, Nem, Wagner, e me segredou que a multidão foi inventada pelo Fla-Flu.
Daí rematou: “Amor e Amizade são momentos da eternidade!”.
A tardemansa avançou e nos abraçou dentrofora de nós.
Duas gaivotas riscando saudades mergulharam no horizonte.
A eternidade se remexeu no infinito ponto oco de cada um.
Vinicius e Toquinho, bicando uma cachaça-de-rolha, começam a cantar “Tarde em Itapoã”…
… por entre espumas nuvens e estrias de sonhos a Vida se espreguiça toma um trago e pisca pra mim… a eternidade se coça com olhos arregalados… violinos ao fundo e cuícas gemendo… a galera vem que vem tudo nú… xibius, mangaios, peitarias, bundas, bundaças, desfilam leves livres, soltos e cochicham e cantam e riem e dançam… q-diabo-é, véi?… é passeata de nudismo na prainha do coração, m’érmão… Xanavá-que-Xanavem!
FOTO: Blog ViajeCasal
2 Comments
Belíssimas palavras que faz o pensamento viajar em acordo com as cores da imaginação.
Um prazer suave. Grata pelo compartilhar.
Forte abraço na alma.
Rubão tem esse poder de provocar reflexão em texto leve.
Abraço, Sandra!