Durante 12 minutos, eu fiquei imerso de um jeito muito raro. Talvez eu possa dizer que a técnica utilizada na construção de Se Algo Acontecer… Te Amo tenha causado essa captura da minha atenção. A forma com a qual o filme tem suas cenas movimentadas ininterruptamente é hipnotizante. Mas não é só.
Também posso chegar à afirmação de que essa animação não conseguiu somente a minha concentração — o que já é difícil para alguém com o Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) —; ela fez com que eu me perdesse completamente. E eu não consegui me achar depois. Pelo menos ainda não.
Atenção! Esta crítica contém spoilers sobre o filme!
Acontece que eu me perdi dentro de um universo que me pareceu muito próximo e, ao mesmo tempo, distante. O silêncio da distância, a corrupção da dor — que gera uma solidão acompanhada. É provável que a maioria de nós já tenha sentido algo muito próximo a isso. Parece que não há para onde fugir.
E, realmente, não há. A questão não é a fuga, mas o reencontro. O duelo entre as boas lembranças e a despedida parece pôr em xeque justamente o que fez ser possível toda uma saudade imortal: o amor. Pode ser uma constatação clichê, mas é através dele (do amor) que Se Algo Acontecer… Te Amo tem suas bases solidificadas. Porque não é o amor que afasta, é a ausência — ou a hibernação dele.
Tudo isso é pensado para esse curta-metragem por meio de símbolos. As sombras, nesse caso, podem tanto erguer quanto derrubar muros. E são projeções do mesmo sentimento. Apenas quando as melhores memórias retornam, parece ser possível seguir em frente.
Isso tudo é tão complexo que fica bem difícil entender como tanto coube em tão pouco tempo. Sombras que afastam; sombra que aproxima; a memória que procura salvar em um retorno para tentar — em vão — reconstruir o passado.
No final das contas, tudo o que sentirmos ao assistir a esse filme deve ser abrangente e, simultaneamente, particular. É a combinação mais que perfeita entre conceito e propósito, significado e missão — esta que diz respeito a cada um, com a maneira que Se Algo Acontecer… Te Amo conseguirá atingir.
Por essa perspectiva, essa missão foi completada com sucesso em mim. Assim como a maioria de nós, tenho meus demônios interiores, minhas sombras que, vez ou outra, insistem em domar a realidade. Cada lágrima que segurei ou deixei escapar durante os 12 minutos fazem parte de quem eu sou e de quem quero e tenho tentado ser.
Eu, perdido completamente, hipnotizado, fico, aqui, do lugar de fala de quem nunca perdeu um filho, mas já perdeu amores para a morte e para a vida, imaginando um mundo tão empático quanto o que assisti; um mundo no qual, por mais que nos distanciemos, possamos lembrar com carinho dos melhores momentos que vivemos; um mundo no qual o acaso e uma música possam se unir para despertar o que há de melhor em cada um de nós.
A dor, assim, poderá se transformar em esperança. Esta, claro, que não pode ser conduzida por uma solidão acompanhada, mas pela sensação de que a vida só seguirá seu curso se houver, nada mais e nada menos, do que o amor.
Se Algo Acontecer… Te Amo é uma obra-prima.
Texto originalmente publicado no Canaltech